Fui aos dicionários à procura do significado do termo “terrível”. Eis o que encontrei: ” o que infunde ou causa terror; assustador, temível”. Daí, fiquei sem entender como alguém pode ser classificado de “terrivelmente evangélico”. Pior, isso colocado como se fosse algo que merecesse ser considerado como virtude, comportamento a ser apoiado e aplaudido. Uma expressão de cunho negativo que não se ajusta ao que conhecemos como postura evangélica.
Alguém que causa terror pode ser admirado, reverenciado, aceito como uma pessoa de convivência saudável? Na minha humilde compreensão, terrível seria uma condição mais apropriada para o estado anti-evangélico. O Evangelho, na sua essência, nunca será uma mensagem que assuste, cause temor, e sim de prática da justiça, da ética, do amor.
Surpreende ver a indicação de um ministro para o Supremo Tribunal Federal tendo como principal referência a identificação como “terrivelmente evangélico”. A interpretação e aplicação do direito constitucional não podem ser orientadas conforme regras estabelecidas por grupos sociais específicos. Mais grave ainda quando se formula uma característica ameaçadora. Porque terrivelmente? Não poderia ser apenas convictamente evangélico?
Não há dúvidas de que se espera de um julgador o comportamento de isenção, imparcialidade, justiça, lisura, honestidade, tão intensamente recomendado no Evangelho. Então, bastaria que fosse apresentado como um jurista que conhece o Evangelho, o que já nos daria a tranquilidade de que a legalidade será sempre a linha maior dos seus julgamentos. Sem proselitismo religioso ilimitado que inspire posicionamentos de intolerâncias inadmissíveis numa sociedade democrática.
A opção religiosa não pode ser o primeiro critério de escolha para o exercício das elevadas funções de ministro da mais alta Corte da justiça brasileira. Não se ignora que a palavra “evangélico” tem uma história rica de significado. Tem a ver com “a boa notícia” de Deus em Cristo Jesus. Portanto, incompatível com o termo “terrível”. O sentido bíblico do que seja “evangélico”, não se harmoniza com a interpretação semântica da palavra “terrível”.
A nossa expectativa é de que o novo ministro seja alguém que conheça bem e respeite a Constituição. O fato de tratar-se de um pastor presbiteriano, não o distingue para que possa atuar com mais competência na atividade judicante que exercerá a partir de agora. Sua atuação tem que se ater a uma racionalidade estritamente constitucional, colocando suas convicções e crenças pessoais de lado, na hora do julgamento.
Se ele for, efetivamente, um bom cristão, não se revelará “terrível”. Na sabatina a que se submeteu no Senado, ele próprio já destacou como inapropriada essa afirmação do “terrivelmente evangélico” quando falou: “Aqui, a Constituição é a minha Bíblia, o Brasil, a minha única religião. Juiz, no foro, cultua o direito”. Ufa!!! O STF, enquanto guardião maior da Constituição, é uma instituição necessariamente afeta às limitações da laicidade. É aceitável o seu compromisso com determinada fé religiosa, mas nunca que isso seja condição preponderante nas suas ações decisórias. Que Deus o abençoe.
Fonte: Rui Leitão
Créditos: Rui Leitão