Numa demonstração patente de que o PSDB está em frangalhos e não tem perspectiva maior a oferecer aos filiados e eleitores na corrida presidencial de 2022, foram interrompidas por problemas técnicos as prévias convocadas para ontem a pretexto de escolher o candidato da legenda à sucessão de Jair Bolsonaro, opondo, diretamente, os governadores de São Paulo, João Doria, e do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, mas ainda com a participação do ex-prefeito de Manaus, Arthur Virgílio Neto. A votação foi paralisada devido a problemas no aplicativo utilizado pelos filiados, e uma definição sobre retomada das prévias foi anunciada para hoje, mas o clima é de desânimo entre os próprios tucanos. Fora do ninho do PSDB, o consenso é de que o fiasco dificulta mais ainda as definições sobre uma candidatura de terceira via para tentar quebrar a polarização entre Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O próprio presidente nacional do partido, Bruno Araújo, em entrevista à CNN Brasil, deixou claro que a demora na conclusão das prévias afeta o andamento da construção de uma candidatura presidencial de centro para as eleições de 2022. A possibilidade de problemas técnicos no aplicativo não era descartada – pelo contrário, o grupo do governador gaúcho Eduardo Leite alertou quanto a isso, e o impasse desagrada em especial o diretório de São Paulo que representa 62% dos cadastrados, sendo o grupo de filiados sem mandato o principal trunfo de João Doria no pleito. Desde o início da votação, pela manhã, tucanos de todo o país relataram dificuldade para acessar a ferramenta via reconhecimento facial e registrar seus votos. O “app” chegou a ficar quatro horas fora do ar durante a manhã. Estima-se que menos de 10% dos quase 45 mil votantes inscritos conseguiram efetuar o voto ontem.
A campanha de Eduardo Leite divulgou nota em que diz que “aceita mais 48 horas de votação, desde que garantida a capacidade técnica para votação de todos os cadastrados que assim desejarem”. O comunicado adiantou: “Com mais do que isso as prévias perderiam sua integralidade, seja pelo prazo, seja pelo número de votantes, seja pela incapacidade técnica do aplicativo, seja pela agressão ao ato normativo eleitoral ou seja pelas denúncias de irregularidades de todo o tipo, que se avolumaram no dia de hoje (ontem) e que poderiam ensejar judicializações e sindicâncias indesejadas”. O aplicativo havia sido desenvolvido exclusivamente para a votação das prévias à presidência da República, a fim de que filiados de todo o país pudessem votar, mas os problemas na ferramenta empanaram a “festa da democracia” que o PSDB vinha alardeando.
Aliás, a democracia interna no processo de prévias dentro do PSDB para escolha do candidato da legenda à presidência da República já vinha colecionando arranhões, tanto nos questionamentos sobre o aplicativo quanto na troca de acusações entre os dois principais oponentes – os governadores João Doria e Eduardo Leite, a respeito de filiações irregulares e de uso de máquina para cooptação de votos no processo eleitoral. Originalmente, o PSDB concebeu as prévias inspirando-se no modelo adotado nos Estados Unidos pelo Partido Democrata. Era uma proposta que há alguns anos vinha amadurecendo nas hostes tucanas, até para fixar o diferencial do partido em relação a legendas tradicionais enraizadas no sistema institucional brasileiro. A cúpula do partido, ao que tudo indica, porém, não tomou as medidas necessárias para que o experimento funcionasse a contento. Fala-se em “primarismo” dos tucanos no teste do aplicativo. E o desgaste aumentou devido à temperatura elevada nas discussões travadas entre candidatos como João Doria e Eduardo Leite.
Por meio de nota, a Fundação de Apoio da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Faurgs), desenvolvedora do aplicativo, negou que a razão para o problema no reconhecimento facial tenha sido por falta de compra de licenças, como chegou a ser especulado, e disse que está investigando todas as possíveis causas da instabilidade, prometendo levar ao público o detalhamento do ocorrido assim que houver total e exata comprovação. O estrago maior parece ter sido feito. O impasse na votação ameaça o sucesso o objetivo de revitalização do PSDB, que estava na lógica da realização das prévias. Depois de seis eleições presidenciais em que, ou havia saído vitorioso (com Fernando Henrique Cardoso em 1994 e 1998), ou havia ido para o segundo turno (em 2002, 2006, 2010 e 2014), o partido experimentou seu pior resultado em 2018. E na última pesquisa do PoderData para a disputa de 2022, João Doria teve apenas 4% das intenções de voto, enquanto Eduardo Leite apareceu com 3%. O PSDB vive cenário de fastígio na conjuntura de poder no Brasil.
Fonte: Os guedes
Créditos: Polêmica Paraíba