A posse de José Genoíno

Rubens Nóbrega

A posse, como suplente, do Deputado Federal José Genoíno (PT-SP), ex-presidente do Partido dos Trabalhadores, indiciado como um dos principais articuladores do chamado “mensalão” e condenado no pelo Supremo Tribunal Federal (STF) como um dos partícipes e articuladores do que se chamou de “maior esquema de corrupção” da história republicana, pode detonar, em um futuro próximo, uma das maiores crises institucionais no Brasil desde o fim do Regime Militar de 1964.

Isso porque o presidente da Câmara dos Deputados, Marco Maia (PT-RS), já declarou que a decisão de cassar pertence exclusivamente ao poder legislativo federal, postura que confronta com a interpretação de que o STF, nesse caso, se constitui como a última instância do país. Interpretação corroborada pela própria Constituição do país.
Encenação ou confronto?

Tenho conversado com muita gente sobre essa questão, mas, ao que parece, não há um consenso formado. Para muitos, a postura do Presidente da Câmara, Marco Maia, pode ser entendida de duas formas: ou como uma atitude política, uma mise-en-scène para respaldar o Congresso diante de uma desmoralização perpetrada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), ou, então, como um ato de confronto do Congresso contra a mais alta Corte de Justiça do país, afinal, tendo definido que o STF pode cassar mandatos conferidos pelo povo, através do voto, em qualquer circunstância, a decisão não pertence ao STF, e, sim, ao Congresso, como um dos três poderes autônomos da República. No que isso pode dar?

Para Marco Maia,não é da competência do STF decidir a respeito de quem pode ou não definir sobre a representação popular no Congresso, que decide quem pode representa-la no congresso. A questão, então, se configuraria de uma maneira muita precisa: quem melhor representa a vontade popular? Quem pode melhor expressar o que pensar o povo a respeito de determinadas questões.

O Supremo Tribunal Federal? O Congresso Nacional? Quem tem mais representatividade política? Alguns argumentam que o STF é mais independente por ser constituído por não-políticos, ou seja, todos os seus membros são Juízes, Promotores ou Advogados de Ofício, enfim, um órgão constituído por Ministros do Supremo Tribunal Federal.

Outros, por outro lado, chamam a atenção para o fato de que, ao serem todos nomeados pelo/a Presidente/a da República, e sem ter nenhuma representatividade política, os Ministros do Supremo Tribunal Federal não são os nomes mais indicados para cassar o mandato de quem quer que seja. Eles existem, única e exclusivamente, para dirimir as dúvidas constitucionais, para encerrar questões que, do ponto de vista jurídico, não são consensuais na sociedade brasileira.

Trata-se, portanto, de uma polêmica cujo fundo não é apenas jurídico, como pretendem alguns, que desejam isolar as decisões de alguns membros do judiciário de suas relações com o mundo da política, e dos interesses nela envolvidos, estejamos delas conscientes ou não. Mas, político, no sentido mais amplo do que é melhor para as nossas instituições e para o futuro das gerações que haverão de nos suceder. Nós olhamos mesmo para o tipo de Estado e de sociedade que desejamos construir no futuro? Ou para nossos desejos de vingança ou para projetos políticos mais imediatos?

Tenho insistido que o afã judicialista, de encontrar um culpado para todos os males da sociedade brasileira a qualquer custo, especialmente para a corrupção, já definida como endêmica, é um equívoco e trata-se de mais uma maneira de reafirmá-la como algo inerente a nossa formação social. Isso é um equívoco que pouco haverá de contribuir para o aperfeiçoamento de nossa democracia, que é o resultado da luta de muitas gerações para construi-la e aperfeiçoá-la.

O desafio não é pensar o Brasil no curto prazo. Para os mais abastados, cujo imediatismo é, muitas vezes, o que move suas vidas econômicas, não há com o que preocupar-se. O Brasil cresce e se desenvolve, sem ser uma Venezuela, seja ló que isso significa. Para aqueles que veem nessa conjuntura única, aberta por uma oportunidade histórica incomum, que nega ou questiona séculos de desigualdade, é bom esperar, porque, se estiverem certos, nada disso seria possível sem democracia, sem participação, ou seja, sem aquilo que tornou possível o experimento de novas formas de desenvolvimento econômico e social.

Portanto, a chave de todos os enigmas políticos se chama “democracia”. Não a democracia de um grupo ou de outro, mas a democracia que é resultado do que é mais legítimo em termos de sociedade.

E nisso está contida regra de quem cassa ou não os mandatos parlamentares.