Médicos abandonam Samu

Rubens Nóbrega

Plagiando manchete do Correio Braziliense na virada do milênio, pergunto a vocês: “Acabou? Não? Então, leia”.

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Por volta das duas da madrugada de ontem baixou no meu i-meio um apelo do Doutor Eurípedes Mendonça, Diretor de Fiscalização do Conselho Regional de Medicina da Paraíba (CRM-PB). Veio acompanhado do artigo que transcrevo abaixo, obra de quem é referência como profissional e exemplo de cidadão.

O que fez o Doutor Eurípedes perder o sono: incontáveis ligações de funcionários de Samu’s, principalmente de Cajazeiras, no Alto Sertão da Paraíba, todos bastante temerosos diante da possibilidade de um Natal e um Réveillon sem médicos para socorrer quem mais precisa.

“Sabe aquela angústia da sensação de impotência, de não saber ou poder colaborar para mitigar o sofrimento das pessoas que me ligaram?”, comentou o Doutor Eurípedes em mensagem ao colunista e a outros colegas jornalistas com os quais decidiu partilhar o escrito e a sua sincera aflição.

“Como a solução é difícil a essa altura do campeonato, resolvi escrever o artigo ‘O Samu 192 está agonizando?’, com o objetivo de compartilhar com a sociedade a apreensão dos samuseiros e agora também minha e espero que vocês também se contaminem”, disse o médico, fechando sua mensagem com votos de que “Deus nos ajude para que não precisemos de Samu’s, que estão desfalcados”.
Deixo vocês com o Doutor Eurípedes Mendonça. É com ele, a partir deste ponto.

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O título em epígrafe espera sintetizar mais um pedido de socorro ou um SOS – como querem os adeptos da simbologia universal – do que uma sinalização para uma iminente morte/desmonte de um dos mais importantes e essenciais serviços de saúde implantados nas últimas décadas.

Antes da criação do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU 192), a assistência aos acidentados, às vítimas de violência urbana e às intercorrências clínicas, como infarto agudo do miocárdio, era feita de forma desordenada, atabalhoada e com grande potencial de causar mais danos do que benefícios. O Samu 192 é um divisor de águas na assistência às urgências e emergências.

O Samu 192 é composto por dois eixos articulados e integrados: a Base Descentralizada e a Central de Regulação Médica de Urgência. O primeiro requer uma estrutura predial e de recursos humanos mais simples e representa a maioria dos Samu’s 192. Já a Central de Regulação Médica de Urgências coordena as ações das bases descentralizadas do Samu.

Explicando melhor: quando uma pessoa aciona o telefone 192, a ligação é recebida em uma Central de Regulação Médica, que então passa instruções para a Base Descentralizada do Samu mais próxima do local da ocorrência que motivou a chamada.


Há 14 anos, o CRM-PB, por meio do seu Departamento de Fiscalização, vem realizando vistorias regulares em estabelecimentos de saúde de toda a Paraíba. Sem exceção, todos os 223 municípios já foram visitados. Para o CRM-PB, o Samu sempre foi considerado uma “ilha de excelência”, uma instituição exemplar e modelar. Salvo melhor juízo, até o ano de 2011, nenhuma denúncia de não conformidades no âmbito de infraestrutura, modus operandi ou contra os seus qualificados e abnegados recursos humanos foi protocolizada no CRM-PB.

 

Até então as denúncias/problemas eram incipientes e não tinham relação direta com a sua gestão/funcionamento do Samu 192. Foram os casos de “ambulâncias superfaturadas”, “sequestradas” ou os criminosos trotes ainda em voga, notadamente entre crianças.

Neste ano de 2012, notadamente após o período eleitoral, surgiu uma epidemia de denúncias envolvendo o Samu 192. A transição política (data da divulgação dos resultados das eleições para prefeitos e vereadores e a posse dos mesmos) implicou um denominador comum: a precarização da assistência à saúde em todos os municípios visitados pelo CRM-PB a partir de outubro de 2012, com o clímax em dezembro. Neste contexto o Samu 192 também foi a reboque.

Provocado em sua maioria por demandas do Ministério Público Estadual, o CRM-PB fiscalizou, entre outros, os Samu’s dos municípios de Piancó, Sapé, Brejo do Cruz, Belém do Brejo do Cruz, Pitimbu, Soledade, São João do Rio do Peixe, Esperança e Cajazeiras.

Mas, o que é que está matando por ‘asfixia’ o Samu 192? Mata o Samu, entre outras causas, o não pagamento aos seus profissionais, fato que motivou a debandada dos médicos do Samu (Base Descentralizada) da cidade de Esperança. Mas fica a esperança, ainda que só no jogo de palavras!

Em pior situação, sem nenhuma esperança, estão os oito municípios (São João do Rio do Peixe, Cachoeira dos Índios etc.) “assistidos” pela Central de Regulação Médica de Urgência da cidade de Cajazeiras.

Como o nome indica, só um médico treinado pode assumir esta complexa, arriscada e estressante missão de fazer medicina a distância (telemedicina), sem examinar o paciente e baseando-se apenas em informações passadas por telefone, ter que tomar decisões imediatas cuja correção ou não pode ser a diferença entre a vida e a morte. Pois bem, em Cajazeiras não há médico regulador em alguns dias da semana, com tendência de essa ausência se agravar nos feriados de Natal e final de ano.

SOS Cajazeiras! SOS esperança! SOS Samu.