Nos cinemas, a grande atração era a estreia de “Missão Impossível 3”, com o astro Tom Cruise. No mesmo fim de semana, Alceu Valença faria show no Circo Voador, na Lapa, enquanto os irmãos Sandy e Júnior apresentariam sua turnê nacional no Citibank Hall, na Barra da Tijuca. “Os monólogos da vagina”, com direção de Miguel Falabella, estava de volta ao Rio, no Teatro Clara Nunes, no mesmo Shopping da Gávea onde Mônica Martelli bombava com a sua comédia “Os homens são de Marte… e é pra lá que eu vou”, em cartaz no Teatro Vanucci.
Em meio a tantas produções em evidência no Rio, estreava, naquela quinta-feira fria e nublada, dia 4 de maio de 2006, o espetáculo “Minha mãe é uma peça”, com o ator Paulo Gustavo dirigido por João Fonseca, no Teatro Candido Mendes, uma casa de 120 lugares em Ipanema, na Zona Sul. “O monólogo cômico é estrelado por Dona Herminia, uma mulher de meia idade aposentada e divorciada, cuja maior preocupação é justamente buscar algo com o que se preocupar”, dizia a sinopse publicada numa nota da revista “Rio Show”, do Jornal O GLOBO.
O espetáculo foi montado no sufoco. Mãe de Paulo Gustavo, Déa Lúcia Amaral, que trabalhava como animadora cultural num Ciep, obteve um empréstimo de R$ 1 mil para investir na produção. O pai e a madrasta do ator entraram com R$ 2 mil. Com muito improviso e pouca grana, ele subiu ao palco. Foi um sucesso. Já no primeiro domingo, o ator fez uma sessão extra da peça, tamanha era a fila na porta. Em janeiro de 2007, o espetáculo se mudou para o Teatro Leblon, com 480 lugares e ingressos a R$ 50. Continuou lotado. Ao longo dos quatro anos seguintes, mais de 500 mil pessoas assistiriam à peça em diferentes cidades.
A carreira do humorista nascido e criado em Niterói decolou. Em 2011, Paulo Gustavo estreou no canal Multishow com o programa “220 Volts”, em que ele apresentava diversos outros personagens em esquetes curtos. Foram cinco temporadas no ar. Também na TV, o ator integrou o elenco de humorísticos como o “Vai que cola” e “A vila”. Em 2013, “Minha mãe é uma peça” ganhou os cinemas, iniciando a uma sequência de três filmes que alcançaram milhões de espectadores, tornando-se a mais bem sucedida franquia da história do nossos cinema.
Em homenagem ao ator, morto nesta terça-feira, 4 de maio, exatamente 15 anos após a estreia no Teatro Cândido Mendes, o Blog do Acervo selecionou trechos de entrevistas concedidas pelo humorista ao GLOBO e fotos dele publicadas pelo jornal. Durante sua trajetória, Paulo Gustavo contou, por exemplo, como surgiu Dona Hermínia, refletiu sobre os limites da comédia, descreveu a alegria da recente paternidade e, em março de 2020, pouco após a determinação de quarentena no Rio, disse: “Todo mundo sairá um pouco transformado dessa história”.
O nascimento de Dona Hermínia
“Eu estava com a Samantha Schmütz no Saco de São Francisco, em Niterói, quando ela sugeriu que eu fizesse uma participação especial na peça “O Surto”, que estava no Teatro da UFF, com um personagem inspirado na minha mãe. No dia seguinte, apareci lá, caracterizado e com vassoura na mão, e o público morreu de rir. E o que era para ser apenas uma participação acabou durando oito meses”. GLOBO-Niterói, 12 de julho de 2008.
Em cartaz na sua cidade natal
“Adoro estar em cartaz em Niterói. A cidade tem uma coisa interessante, que é conhecer todo mundo mesmo sem conhecer de verdade. Quando as luzes se acendem, eu vejo um monte de rostos conhecidos, de gente que não sei quem é, mas que já cansei de ver na rua. Sem contar que aparece muito amigo e parente também”, GLOBO-Niterói, 12 de julho de 2008.
A fina arte de fazer comédia
“Sou totalmente o riso pelo riso. Não gosto de comédia escrachada demais, nem de piada. Tem gente que acha que é engraçada no bar e acha que, por isso, sabe fazer comédia. O humor vem, pra mim, nas cenas do dia a dia. E, no palco, também procuro isso: descrevo de modo sério situações do cotidiano e as pessoas riem”. Segundo Caderno, 2 de janeiro de 2010.
Medo de viajar de avião
“Só não dá tanto medo se vejo que tem artista importante, porque aí não cai. Uma vez, estava o Miguel Falabella. Deu uma garantida no voo. Numa outra, encontrei a Fernanda Montenegro, pensei: ‘Nesse posso até pular'”. Segundo Caderno, 2 de janeiro de 2010
Limites da comédia
“Tem gente reclamando da censura nas piadas, mas acho que ficamos muito à vontade, perdemos a noção. Tem que haver um limite norteado pela educação. Não sou a favor de ser invasivo, me garanto em fazer comédia sem humilhar as pessoas. Não vejo graça em zoar a vesguice de alguém ou ir para porta de festa sacanear”. Segundo Caderno, 23 de outubro de 2011
Fonte: O Globo
Créditos: Polêmica Paraíba