Eu não toco nenhum instrumento!
Mas bati “lata, tonel, garrafa d’água”.
Um simples brasileiro, como narra uma das minhas bandas preferidas, Os Paralamas do Sucesso e seu clássico “Vamo Batê Lata”.
Por ocasião, ontem assisti ao filme “Os Quatro Paralamas”.
Conheci o quarto elemento, José Fortes, amigo universitário de Herbert Viana, primeiro entusiasta e empresário da banda até hoje.
Personagem fundamental para o surgimento, manutenção e dimensão da “Comunidade Paralâmica”, termo tantas vezes usados pelo frontman Viana.
Motorista, carregador, produtor, motivador etc.
Nisso. de cara me identifiquei com o “Zé” (sim, há intimidades subjetivas que suplantam conhecimento físico). Já me afeiçoei rápido.
Uma perspectiva básica nos une. Logo no começo do filme ele afirma, que “a amizade com os Paralamas, o fez ver que era possível estar emaranhado à música sem ser músico”.
Também fui sugado por esta turbina sonora. Apenas meus amigos são um pouco menos famosos que Os Paralamas do Sucesso, mas isso é mero detalhe no processo.
Fato é que a partir de um tempo já não me bastou a catarse solitária da música. Queria produzir shows, apresentar artistas, preencher espaços com a arte dos outros, sejam amigos, ídolos, anônimos…
Aqui estou, ainda hoje, me divertindo e, melhor, com variações de intensidade por época, sempre trabalhando também com esse entorno artístico: já foi no Galpão, hoje seja no AUMENTA, seja na inesgotável fonte de escoamento da Rádio Tabajara em produtos como Palco, Festival de Música etc.
Aliás, é sobre esse poder de atração, aglutinação, força primária da música que trata “Os Quatro Paralamas”.
Da irmandade inabalável entre o quarteto sempre reafirmada através da música, ao momento mais dramático da história deles, o acidente aéreo com Herbert, que vitimou a esposa dele e ressignificou a trajetória de todos unicamente pelo poder da música.
Diferente de um documentário convencional, “Os Quatro Paralamas” é mais uma colagem de vídeos, fotos de produção, caseiros.
Momentos despretensiosos, sem cronologia amarrada da sequência dos fatos, narrativa amadora mesmo, paralela a registros oficiais e raridades únicas de intimidade da banda na estrada, produzindo, ensaiando.
Mais da metade do material, vale frisar, com qualidade pior que VHS da nossa infância. O anúncio de efeito estreboscópico fulgura na tela durante boa parte do documentário. Recursos acentuados para dar um ar de normalidade ao “castigado” material original, que sustenta a película.
Não há grande valor documental, estético. Longe disso, é um filme para fãs. E me sinto confortável nesta posição.
Se existe uma banda para estar além das fronteiras do BROCK (aquele “movimento” que eclodiu nos anos 80 nas rádios brasileiras), é os Paralamas.
Mais do que a potência do Power Trio, o legado deles está na diversidade, em trazer elementos periféricos ao mainstream, aquela voraz selva de gravadoras, indústria de discos.
Não estou falando dos flertes explícitos com ska, reggae, nem das baladas de amor certeiras no mais alto nível da MPB, tal qual “Lanterna dos Afogados”, nem da imensa capacidade de tocar em feridas sociais “Selvagem” etc. Tudo isso revela a versatilidade da banda, mas vamos além, bem além…
Que grupo de rock brasileiro gravou Jackson do Pandeiro em um registro ao vivo e transformou o “produto” em sucesso nacional nos anos 90??
Poderia falar também da enorme representatividade que ofertaram à música brasileira no mercado portenho, onde são reverenciados por público, crítica e firmaram parcerias eternas com figuras como Fito Paez, Charly Garcia etc.
Mas há algo mais relevante…
Se nos anos 2000 virou símbolo cult no Brasil bandas alternativas sacudirem as festas de inferninhos com batidas afrobeat, os Paralamas, à sua maneira, já faziam isso há mais de década, trazendo elementos da música africana para dentro da indústria fonográfica, se arriscando, experimentando, saindo da “caixinha” em pleno sucesso. Que o diga o clássico “Alagados” e “a arte de viver da fé”.
Fonte: Marcos Thomaz
Créditos: Marcos Thomaz