Às vésperas da Cúpula de Líderes sobre o Clima, onde o Brasil será procurada por resultados concretos na área ambiental, aumenta a pressão no país sobre o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. Na terça-feira, cerca de 400 servidores do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) divulgaram uma carta em que denunciam que estão com suas atividades de fiscalização totalmente paradas , desde que Salles mudou o rito para a aplicação de multas ambientais .
Na berlinda, o ministro explicou que buscou “agilizar” processos com a mudança de regras, mas admitiu que pode fazer “ajustes” no texto ‘se houver mesmo necessidade’. E chegou a ironizar, nas redes sociais, um tuitaço – publicação massiva de tuítes por uma causa – que será realiado nesta quarta-feira contra a permanência dele no cargo.
Os servidores afirmam na carta, endereçada ao presidente do Ibama, Eduardo Bim, que estão com suas atividades de fiscalização totalmente paradas. Publicada no Diário Oficial da União (DOU) no dia 14 de abril, a alteração nas regras para aplicação de multas ambientais determina, na prática, que as sanções só são autorizadas depois de passarem pela análise de um supervisor. Os fiscais afirmam que essa mudança cria uma figura semelhante a um “censor” e que isso prejudica as ações de combate a crimes ambientais.
A paralisação na fiscalização acontece em momento de pressão sobre o governo brasileiro no tema, com a cobrança de que sejam emitidos sinais de comprometimento com o combate ao desmatamento na Amazônia e ao cumprimento de suas metas para diminuir como emissão de gases do efeito estufa. Nesta semana, os dados do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) indicam que o desmatamento na Amazônia aumentou 216% em março deste ano na comparação com março de 2020.
A cúpula convocada por Biden ocorre em meio a crítica por parte de associações da sociedade civil, incluindo ONGs ambientalistas e coletivos de artistas, que convocaram manifestações nas redes sociais em defesa da saída do ministro. Também recaem sobre Salles movimentações institucionais: na semana passada, ele foi alvo de uma notícia-crime da Polícia Federal (PF) do Amazonas e passou a ser investigado no Supremo Tribunal Federal (STF) por supostamente atrapalhar uma investigação sobre madeireiras ilegais.
Ontem foi exonerado o chefe da unidade técnica do órgão no Porto de Paranaguá (PR). Antonio Fabricio Vieira, servidor do órgão há 26 anos, assinou um relatório em fevereiro em que informa a realização da fiscalização de “100% das cargas a serem exportadas pelo porto de Paranaguá, em um total de 35.822 m3 de madeira nativa” ao longo do último ano. O total da carga movimentou R $ 301,2 milhões. Segundo o jornal Folha de S. Paulo, uma fiscalização teria gerado 30 autos de infração por falta de documentos.
Na carta divulgada ontem, os servidores do Ibama dizem não haver condições de impactos ambientais exercerem as suas funções.
“Registramos que, no momento, os meios de comunicação para o estrito cumprimento do nosso trabalho não estão disponíveis e que todo o processo de fiscalização e apuração de infrações ambientais encontra-se comprometido e paralisado frente ao ato administrativo publicado”, diz um trecho da carta .
As críticas são direcionadas também à atuação do governo federal como um todo, de quem cobram “o fortalecimento das instituições e das normas ambientais, e não o contrário, como vem sendo feito”. A carta diz ainda que a mudança nas regras seria “irregular, ilegal” e representaria uma tentativa de “arrefecer uma crise administrativa sem precedentes” dentro do Ibama.
O ministro Ricardo Salles disse ao GLOBO que buscou “agilizar” processos com a mudança de regras na aplicação de multas ambientais. Afirmou que vai analisar as ponderações dos servidores para ver a necessidade de “ajustes” no texto que está sendo contestado.
– Estabelecemos prazos curtos justamente para agilizar o andamento dos processos, mas estamos analisando a manifestação e se houver necessidade de ajuste, o faremos – disse o ministro do Meio Ambiente.
Salles negou ainda que a divulgação da carta na véspera da Cúpula de Líderes para o Clima ameace a participação do presidente Jair Bolsonaro. No evento, o chefe do Executivo Brasileiro vai prometer aumentar o investimento em fiscalização.
– Lógico que não (atrapalha). O que aumenta a efetividade da fiscalização e a velocidade dos processos.
Procurado, o Ibama disse, por meio de sua assessoria de imprensa que o órgão está analisando como demandas contidas na carta e, se as primeiras consideradas relevantes, elas podem ser acolhidas. “O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) está revendo os dispositivos da IN com base no argumento levantado pela carta. Se mais procedentes as ponderações, acolhidas ”, diz a nota.
Fonte: O Globo
Créditos: O Globo