Há mais de um ano, mudanças significativas na vida profissional fizeram com que os brasileiros sentissem uma piora na carreira durante a pandemia de covid-19. Os impactos em saúde mental e na renda são os principais motivos, segundo uma pesquisa da consultoria de estratégia Oliver Wyman, feita com cerca de 4 mil pessoas. Para 32% dos entrevistados, esse sentimento negativo impera e ele é uma das causas que motivaram a busca por ajuda para tratar ansiedade ou depressão nesse período de incertezas.
No levantamento da Oliver Wyman, estresse financeiro (23%) e estresse no trabalho (13%) foram os dois principais motivos para buscar ajuda no tratamento dessas condições da mente. Especialistas afirmam que a dificuldade de equilibrar vida pessoal e profissional no home office, com demandas exageradas e reuniões online intermináveis, desencadeia sintomas emocionais e insatisfações. Tudo isso coopera para que as pessoas estejam estressadas no trabalho, o que acende o alerta para a ocorrência da síndrome de burnout.
Uma pesquisa da consultoria Gallup sobre causas e curas do burnout entre colaboradores mostrou que as pessoas que dizem ter tempo suficiente, com frequência ou sempre, para realizarem seus trabalhos são 70% menos propensas a terem alto nível da síndrome de burnout. Para isso, se faz necessária uma relação saudável entre líderes e liderados, bem como uma atenção especial a sinais e sintomas de estresse e outras questões de saúde mental que, muitas vezes, passam despercebidos.
“Saúde mental não é só ausência de queixa de doenças. É um conceito mais amplo que envolve, segundo a OMS, o bem-estar físico, mental e social”, diz Daniela Laranja, neurologista do Hospital Alemão Oswaldo Cruz. Para a empresa, é evidente quando um funcionário é afastado por diagnóstico de ansiedade ou depressão, mas a médica explica que há condições que não são contempladas nos indicadores dessas doenças.
“Dores crônicas nas costas, na cervical, insônia ou má qualidade de sono, dor de cabeça. Tudo isso pode ser um sinal de que a pessoa está com quadro depressivo, demonstrado de outra maneira.” Além desses sinais, ela lista algumas pistas que podem indicar problemas de saúde mental e às quais líderes e funcionários devem ficar atentos, ainda mais em tempos de home office:
Ficar muito tempo nas reuniões com a câmera desligada;
Não interagir com a equipe como antes;
Semblante mais triste e inexpressivo;
Falta de cuidado com a aparência, quando é alguém que prezava por isso;
Discursos e fala mais tristes;
Queda na produtividade.
A fim de auxiliar as empresas, o Hospital Alemão Oswaldo Cruz lançou, no começo deste mês, um programa de saúde mental voltado a médias e grandes organizações. O projeto tem como principal iniciativa um curso de formação de socorristas em saúde mental, que vai capacitar profissionais dentro das empresas para que identifiquem pessoas em situação de risco.
Dividido em quatro módulos, o curso totalmente online tem duração de 18 semanas e início em 28 de abril. Também faz parte da ação o Guia de Saúde Mental Pós-Pandemia no Brasil, elaborado em parceria com a Pfizer, que aponta para as consequência negativas da pandemia no psicológico humano.
“Nossa ideia foi criar um programa que tivesse foco no conceito da OMS sobre o que é bem-estar. A gente fez paralelo com a ideia dos brigadistas e a pessoa vai ser capacitada para entender e identificar os principais sinais e sintomas que estão ao seu redor ou consigo. Vai aprender o que impacta a saúde mental e vai ser capacitada em terapias não medicamentosas, todas com embasamento científico: musicoterapia, espiritualidade, mindfulness. No final, tem um módulo de gestão”, explica Daniela.
Ela diz que uma das vantagens dessa formação é que o aprendiz pode se tornar uma referência dentro da empresa para alguém que ainda se sente desconfortável de ir ao médico. Isso, porém, não descarta uma consulta com o profissional para identificar sintomas de estresse e outras questões relacionadas a saúde mental; é apenas um meio de iniciar o reconhecimento do problema.
Aprimorar esse monitoramento, segundo a neurologista, requer um esforço conjunto da empresa, em especial da equipe de medicina do trabalho, para acompanhar os indicadores. “É uma situação estressante de maneira geral, mas se os números de depressão estão estáveis e se vê que a quantidade de afastamento por dor cervical, por exemplo, está aumentando, os médicos precisam estar atentos”, afirma Daniela. Ela exemplifica que uma dor no estômago nem sempre é sinal de úlcera e pode ser um sintoma de ansiedade.
7 dicas de autocuidado no home office
A partir da suspeita ou mesmo identificação de má condição mental, as organizações podem adotar medidas para evitar recorrências. “A empresa deve ter esse foco em fornecer opções de cuidado para o seu colaborador e tornar isso uma rotina.” De forma individual, algumas orientações para fortalecer o autocuidado no ambiente de trabalho no home office, principalmente durante a pandemia, são:
Planeje a rotina, com horários regulares para acordar, dormir e fazer as refeições;
Não se descuide e mantenha o uso rotineiro de medicações, se for seu caso;
Faça pausas a cada hora, levante, ande um pouco e beba água;
Tente identificar o que está sentindo, se tem pensamentos negativos com frequência;
Procure formas de distração, como leitura, atividade física, meditação. Alguns aplicativos podem ajudar como guia;
Se informe por meio de fontes seguras, não por correntes enviadas em redes sociais;
Entenda que sentir medo e tristeza é normal, mas fique atento se esse quadro se prolongar.
Para saber mais sobre o 1º Curso de Formação de Socorristas em Saúde Mental, do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, entre em contato pelos telefones (11) 3549-0673 e 3549-0688 ou pelo site www.fecs.org.br/fale-conosco.
Estratégias para reduzir o cansaço
O momento atual não é dos melhores, uma vez que o novo coronavírus segue sem dar sinais de enfraquecimento – a ausência de medidas adequadas e de compromisso com o isolamento social torna o cenário pior. A segunda onda já trouxe novas restrições, que, embora necessárias, vão comprometer novamente o trabalho e as condições de saúde da população. Como evitar todo esse estresse e pensar no futuro do trabalho?
Não existe fórmula mágica, mas o que se pode fazer é amenizar esses impactos com diferentes estratégias. Afinal, o cansaço não é só mental, é físico também, o que ainda compromete a capacidade produtiva. Dessa forma, refletir sobre si e praticar a sustentabilidade emocional é um dos caminhos para poupar energia sem interferir nas tarefas do dia a dia, sugerem especialistas. Há, ainda, dicas para diminuir o cansaço, que contemplam áreas como ergonomia, espaço físico, saúde mental, produtividade e organização.
E, se tudo parecer muito complicado, lembre-se de que um pouco é melhor do que nada. Estudos mostram que apenas 11 minutos de exercício físico já melhoram o condicionamento corporal, com atividades em que se usa o peso do próprio corpo. Além de ambiente de trabalho, a casa também se transformou em academia, mas a prática simples de exercícios e também de mindfulness (meditação) traz benefícios comprovados e é algo que se tornou ainda mais importante para compensar as longas horas em frente ao computador.
Nessa trajetória, cabe também às empresas promover um ambiente favorável aos seus funcionários, mesmo que a distância. Construir ou ampliar uma cultura organizacional acolhedora, aberta a discutir as vulnerabilidades e soluções, e que monitore o descanso e não apenas o trabalho, é imperativo.
Fonte: Estadão
Créditos: Estadão