Rubens Nóbrega
Confessei ontem ao meu consultor financeiro a firme disposição de construir uma fortuna pessoal que assegure vida mansa e futuro tranqüilo a minha descendência. E se der tempo de desfrutar um pouquinho, beleza!
Que tal, então, abrir um restaurante bacana, um café chique, uma boutique de alta classe ou uma loja de roupinha pra bebê, como quer a patroa? Ou não seria melhor um colégio, quem sabe uma fábrica de cachaça ou uma importadora de lig-lig?
O consultor deu aquele risinho irônico, de quem pensa, mas nada diz pra não ofender o cliente: “Esse cara só pode ser um imbecil!”. Depois, na maior sinceridade, apontou-me caminhos e alternativas de ficar rico na Paraíba de hoje.
Primeiro, começou, o caminho mais fácil seria arranjar um dinheirinho, fazer algum barulho, chamar a atenção, candidatar-se e investir num mandato eletivo, preferencialmente executivo.
Expus minha absoluta falta de jeito pro troço. Aí ele me perguntou se eu não teria algum parente próximo, irmão de preferência, com carisma suficiente para seguir por aquela via. “Talvez Buscapé, que é muito popular. Vou falar com ele”, disse-lhe.
“Bem, se ele topar, invista na carreira dele. Com um irmão prefeito ou governador, chegará a sua vez de ir mais longe. Basta ficar na retaguarda, armando e fechando os negócios, cobrando os pedágios… É mão na roda”, garantiu-me.
Sei não… Acho grande o risco e o resultado, duvidoso. Ideal mesmo seria partir pra iniciativa privada. “O que achas?”, perguntei. Algumas ponderações que me fez:
– Se for pra ser fornecedor de governo, fica mais fácil. Abra uma construtora, locadora de carros ou de ambulâncias, firma de eventos, de consultoria, uma agência de publicidade, de viagens… Se conseguir se ajeitar com as pessoas certas do círculo íntimo do poder, pode apostar como em dois anos estará podre de rico.
Antes que eu comentasse tais sugestões, danou-se a falar que outro negócio bastante lucrativo, atualmente, seria organizar concurso público. “As inscrições rendem milhões, Rubens. Melhor que isso, meu, só organização social de saúde com um contrato gordo pra tomar conta de hospital público. É mina de ouro”, sugeriu.
Reagi expondo minha dificuldade em participar de negócios do gênero. Meu consultor argumentou, contudo, que tudo isso pode ser feito sob uma capa de legalidade que nem as auditorias mais espertas conseguem levantar e glosar.
“Uma licitação bem montada, bem combinada, por exemplo, não tem quem pegue. Sei de muitas. Podem até desconfiar, mas duvido que provem qualquer safadeza”, afirmou.
Igrejas, shoppings, mega…
Indaguei se a gente não deveria sair desse circuito e se aplicar, por exemplo, na fundação de uma igreja neo-pentecostal. “É ramo mais do que saturado, meu caro. Depois do Edir, R.R. Soares e do Waldomiro, não tem mais pra ninguém”, avaliou.
Contou-me ainda que até as franquias dessas igrejas não mais renderiam o esperado e já começam a fechar. Além disso, os investimentos derivados estariam indo pelo mesmo caminho. “Não andam bem das pernas. Pra você ter uma ideia, estão dizendo por aí que a tevê do bispo está quebrando na emenda e já acumularia um rombo perto de meio bi de reais”, acrescentou.
Mudando o segmento, especulei se não seria uma boa tentar construir um novo shopping na cidade, inclusive porque outro dia tive a ideia de levar um papo com o Doutor João Carlos, lá de Pernambuco.
“Soube que ele estaria interessado em voltar a investir em João Pessoa. Iria até Recife para um encontro com o cara, me oferecer como testa-de-ferro, laranja, o que for”, revelei. Mais uma vez, desvaneceu-me o especialistra.
“Pode ser até que ele tope, Rubens, mas o projeto não deve prosperar porque nem a Prefeitura vai lhe dar uma licença para construir nem você tem terreno pra fazer permuta com o Estado”, observou.
É, pelo visto, vou morrer vivendo da aposentadoria, de algum apurado com os meus escritos e da esperança de um dia ganhar, sozinho, uma mega acumulada.
Quanto a isso, alertou-me o consultor, são nulas as chances de quem não faz uma fezinha vez em quando. Eita! É mesmo…
Por uma transição aberta
A transição entre a gestão que finda e a outra que está pra começar não pode se resumir à troca de segredos entre iluminados designados pelo atual e futuro gestor. O distinto público que paga a conta de agora e as que vêm por aí merece explicações e atualizações sobre o que aconteceu, acontece e pode vir a acontecer com a coisa pública.
Não faz sentido transição em circuito fechado. Defendo e sugiro, portanto, que as comissões encarregadas façam audiências públicas para expor urbi et orbi o que encontraram de positivo, de negativo e o que é possível fazer para melhorar. Mas, para tanto, é preciso que o eleito seja acometido de súbito republicanismo e providencie o quanto antes o compartilhamento de dados e expectativas com os eleitores interessados.
Até para mostrar que (ainda) não esqueceu, antes mesmo da diplomação, quem o colocou lá e a quem deve prestar contas.