Incapaz de conseguir seringas e agulhas para a vacinação contra a Covid-19 até agora, o Ministério da Saúde decidiu ampliar em 50% a quantidade de insumos que requisitou de empresas no Brasil. A requisição é uma medida extrema, segundo a qual o ministério se apropria dos produtos para pagamento posterior. Antes, a pasta havia pedido 30 milhões de insumos. Agora, quer 45 milhões.
A medida mostra a dependência do ministério comandado pelo general Eduardo Pazuello a esse instrumento de apropriação de estoques, quando o país parece perto do início da imunização. A pasta requisitou 15 milhões a mais de seringas e agulhas mesmo após ter recuado na orientação para que as indústrias entregassem os estoques adquiridos pelos governos estaduais.
A ofensiva sobre os estados foi revelada pelo jornal Folha de S.Paulo no último dia 6. Logo depois, o governo de São Paulo ingressou com uma ação no STF (Supremo Tribunal Federal) para garantir as seringas e agulhas que comprou da principal fabricante no Brasil, a Becton Dickinson (BD) Indústrias Cirúrgicas.
Na ação, o governo de João Doria (PSDB) informa que já havia sido avisado pela BD sobre a impossibilidade de entrega de todos os lotes dos produtos, diante da requisição administrativa feita pelo Ministério da Saúde. No dia 8, o ministro Ricardo Lewandowski decidiu a favor de São Paulo e proibiu que o governo de Jair Bolsonaro requisitasse insumos contratados pelo estado.
No mesmo dia 8, o Ministério da Saúde expediu novos ofícios às empresas, ampliando de 30 milhões para 45 milhões as quantidades que quer ver entregues à União. O ministério faz uma ressalva nos documentos: não deve haver prejuízo aos “compromissos previamente firmados com estados e municípios”.
As primeiras requisições administrativas foram feitas no último dia de 2020, depois do fracasso do pregão do ministério para selecionar fornecedoras. O secretário de Atenção à Saúde, Luiz Otavio Duarte, enviou ofícios às três empresas que fabricam seringas e agulhas no Brasil e a mais duas companhias que comercializam os insumos no país.
Nos documentos, o secretário cita o inciso e o artigo da Constituição Federal em que diz ter se baseado para fazer as requisições administrativas. O artigo trata do direito à vida, e o inciso prevê que “a autoridade competente poderá usar de propriedade particular”, em casos de “iminente perigo público”.
Da BD, o ministério requereu 9 milhões de seringas e agulhas. Da SR Saldanha Rodrigues, mais 10,5 milhões. E, da Injex Indústrias Cirúrgicas, mais 4,5 milhões. São essas as três fabricantes dos insumos no Brasil, segundo a Abimo, a associação que representa as empresas.
As requisições se estenderam a outras duas empresas: Descarpack Descartáveis do Brasil e Medlevensohn Comércio e Representação de Produtos Hospitalares. Cada uma deveria fornecer 3 milhões cada. O total requisitado somava 30 milhões, e deveria ser entregue até o meio-dia do dia 8.
O ministério de Pazuello se reuniu com representantes das indústrias e foi avisado da incapacidade de fornecimento dos produtos no prazo determinado. Ficou acertado, então, que o prazo se estenderia até o dia 30 e que as empresas deveriam repassar os estoques assegurados a estados e municípios que fizeram compras anteriores. No meio do caminho, houve a decisão do STF.
Novos ofícios, então, foram enviados às cinco empresas. A cada uma delas, foi apresentada a proposta de entrega de 9 milhões de seringas e agulhas. O total chega a 45 milhões de itens, caso elas cumpram as requisições.
A medida extrema de apropriação dos insumos foi adotada depois do fracasso do governo federal em tentar comprar os produtos. O Ministério da Saúde deixou para o antepenúltimo dia do ano um pregão para a seleção de fornecedoras. Queria comprar 331,2 milhões de itens, mas conseguiu apenas 7,9 milhões, ou 2,3% do total.
Naquele momento, o governo de São Paulo já havia concluído 27 pregões e obtido quase a metade do total pretendido. As licitações buscavam empresas para entregar 100 milhões de seringas e agulhas. Fracassaram para 50 milhões de seringas e para 51,2 milhões de agulhas.
Enquanto partia para as requisições administrativas, o Ministério da Saúde informava as empresas que realizaria novos pregões. Bolsonaro, então, declarou em sua conta no Twitter que as compras estavam suspensas, diante de preços exacerbados cobrados pelas indústrias.
A aposta segue sendo nas requisições administrativas. A posição da Abimo, que representa as fabricantes, é que 30 milhões de itens serão entregues até o fim do mês. O Ministério da Saúde diz que estados e municípios têm estoques para dar início à vacinação contra a Covid-19.
As empresas já deram diversos sinais de que não têm seringas e agulhas suficientes nem um ritmo de produção que assegure o fornecimento a todos. A BD, por exemplo, ingressou com um recurso no STF, chamado embargo de declaração, pedindo um esclarecimento sobre a decisão de Lewandowski.
Segundo a empresa, é preciso que a decisão deixe claro que os prazos de entrega a São Paulo, a ser feita de forma escalonada, sejam respeitados. Os representantes da BD alegam que não podem reservar os lotes cujas entregas ocorrerão nos meses seguintes. Isto comprometeria o atendimento à requisição do Ministério da Saúde, conforme a empresa.
Fonte: Folhapress
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