Choque entre criatura e criador marca a campanha

Nonato Guedes

Um dos pontos altos da campanha que se desenrola para a sucessão municipal em João Pessoa, este ano, é sem dúvida o choque envolvendo a “criatura” e o “criador”, ou seja, entre o governador Ricardo Coutinho e o atual prefeito da capital, Luciano Agra. Arquiteto e urbanista, José Luciano Agra foi retirado das pranchetas por Ricardo para entrar na atividade política, figurando como seu candidato a vice na campanha pela reeleição municipal em 2008, na legenda do PSB. A chapa puro sangue saiu vitoriosa, derrotando o principal adversário, o deputado estadual tucano João Gonçalves. Ricardo desincompatibilizou-se da prefeitura dentro dos prazos legais para concorrer ao governo do Estado em 2010, quando derrotou o peemedebista José Maranhão nas urnas. Luciano Agra assumiu a titularidade efetiva no município, confiante numa relação harmoniosa e promissora com o chefe do executivo estadual.

As divergências, entretanto, foram aflorando gradativamente. Aliados de Agra acham que a sua decisão de tentar autonomia própria à frente da prefeitura irritou os brios do governador, que passou a manejar os cordeis para isolá-lo em termos de ocupação de maiores espaços políticos. O divisor de águas ocorreu quando Luciano Agra, sentindo-se rifado por manobras de bastidores, lançou um manifesto desistindo de concorrer à reeleição à prefeitura e alegando que não era afeito ao jogo bruto da política. O governador lançou imediatamente a ex-secretária de Planejamento municipal, Estelizabel Bezerra, para substituir Agra. O prefeito, em sinal evidente de arrependimento, ou talvez pressionado por aliados e aliadas fiéis, ensaiou uma volta ao cenário em grande estilo, mas o governador utilizou todos os meios ao seu alcance para impedir que ele lograsse êxito. No encontro municipal que definiu a candidatura oficial do PSB, Estelizabel bateu Agra com folga, o que levou o alcaide a se desligar, dias depois, do PSB, e a apoiar a candidatura do deputado estadual Luciano Cartaxo, do PT, cujo vice é o jornalista Nonato Bandeira, ex-secretário de Comunicação de Ricardo Coutinho, tanto na prefeitura como no governo do Estado.

A convivência entre o prefeito e o governador passou a ser turbulenta, ensejando deserções em massa nos quadros do PSB, estimuladas por Agra, que até o momento não definiu filiação a outro partido, embora esteja na iminência de assinar ficha no PT e postular mandato em 2014, ainda não resolvido. A troca de estocadas é frequente entre Luciano e Ricardo. O último episódio que motivou confronto entre ambos foi a denúncia de que Alexandre Urquiza, secretário da Transparência Municipal, tinha uma filha cadastrada no programa Bolsa Família e parentes empregados na prefeitura. Ricardo provocou: “Se o acusado fosse meu auxiliar, eu o teria mandado pegar a reta, diante da atitude anti-ética que cometeu”. O prefeito, porém, relutou em exonerar o secretário e alegou que não iria deixar de ser solidário com ele num momento difícil. O resultado é que, ontem, Alexandre Urquiza tornou público o seu pedido de exoneração do cargo, colocando-se como vítima do fogo cruzado do governador contra o alcaide. A troca de farpas continua, envolvendo membros da administração estadual e da administração municipal. De concreto, Ricardo sabe que terá que remontar o esquema do PSB para 2014, se quiser concorrer à reeleição. E, ainda por cima, torcer para que Estelizabel esteja no segundo turno na disputa e, finalmente, seja vitoriosa. Seria a consagração da sua ‘vingança’ contra Luciano Agra e outras lideranças que lhe fazem oposição.