Shopping: O muro da vergonha caiu

Gilvan Freire

Não faz tempo, um matuto bem sucedido do cariri paraibano, depois de amealhar certa fortuna para os padrões locais, comprou uma casa de veraneio à beira mar de Lucena. Certo dia, alguém passou a armar uma barraca na frente. Mal começou a cavar os buracos na areia e fincar a primeira estaca, o veranista apareceu furioso. Sentia-se tão afrontado como um latifundiário rural interiorano diante de alguém que ameaçou derrubar as cercas de sua propriedade justo em frente a casa sede da fazenda. Avançou na direção do invasor e, antes que o pobre barraqueiro pudesse achar que as praias não têm dono, esticou o braço e apontou com a mão: – Sabe de quem é esta casa? E girou 180 graus, demarcando território no vento com uma cerca imaginária até as águas, agora com o outro braço, expondo o dedo indicador: – Do muro de minha casa ao final da praia, tudo é meu! E foi se retirando esbaforido, enquanto o pequeno comerciante nômade recolhia seus troços. Mas deu meia volta, próximo ao portão, e esbravejou no mais alto dos decibéis: – nos meus confrontamentos, se você que saber, do lado da frente, indo da praia até a África, tudo também é meu!

Roberto Santiago, faz tempo, passou uma cerca imaginária e quilométrica em volta do Shopping Manaíra. Em sentido transversal ao antigo Império Britânico, que se vangloriava de o sol nascer e se pôr dentro de seus domínios no planeta Terra, nenhum outro Shopping poderia ser edificado de norte a sul de seu império comercial. – Da entrada oeste de João Pessoa até Cabedelo, o porto e o mar; pelo lado direito até o Colinas e Gramame; e pela frente até as praias mais orientais das Américas, seguindo até a África, tudo é meu! Poderia dizer Roberto. Era como se tivesse de lembrar ele aos incautos, todos os dias, até que aparecesse alguém ou surgisse uma oportunidade para algum intruso atrevido derrubasse esse muro da vergonha, essa muralha chinesa de indecência e pecamidade política afrontosas a um povo honesto mas escravo de sua própria incapacidade de reagir, e covarde mesmo. Não se pode dizer coisa diferente.

PREÇO E SOBREPREÇOS

Veremos que, depois das eleições, essa Câmara de Vereadores de Cabedelo, se não for devastada pela revolta social, ainda vai tentar espernear e cobrar o preço de sua aparente capitulação diante dos eleitores envergonhados e desmoralizados por conta dela. Mas vamos aguardar os desdobramentos.

Interessa agora saber como Roberto Santiago e seu exército de mercenários políticos vão reagir diante do muro derrubado pela fúria coletiva em Cabedelo, uma sociedade que sabia o preço de sua dignidade usurpada, ultrajada e vendida nas tarimbas da corrupção mercantil, mas não imaginava que tinha força para por a pique essa legião de vendilhões da honra do povo.

Quando os alemãs começaram a derrubar o Muro de Berlim, no final dos anos 80, não ficou em pé um só metro daquele concreto que feria as liberdades dos povos e a dignidade do homem no mundo civilizado. Na Paraíba, se espera que a população de João Pessoa derrube o que resta dessa muralha, precisamente na parte em que a cidade e seu povo estão sitiados pela delinqüência política, não menos inquietante do que o banditismo fermentado pelas drogas e pela violência urbana, sem combates eficientes.

Mas, sabem como e quanto Roberto Santiago ainda ganhará com isso? Bem, depois eu conto.