O Volstead Act, que proibiu o álcool nos EUA durante quase 14 anos, entrou em vigor em 1920. Um século depois, é considerado uma prova de que proibir a bebida, quando ela já é popular, não é uma boa ideia. A proibição nos EUA deu origem ao crime organizado, quando gangues mafiosas enriqueceram com o contrabando de álcool. A aplicação da proibição foi débil porque não tinha apoio popular. Segundo uma estimativa, havia pelo menos 20 mil bares ilegais na cidade de Nova York durante o período em que a lei vigorou. Quando a polícia em Denver deu uma batida em um bar, ali encontrou parlamentares locais, o prefeito e o xerife bebendo.
Mas o veto ainda anda por aí e não só no mundo muçulmano. Nos EUA existem quase 500 condados predominantemente evangélicos, incluindo o de Lynchburg, no Tennessee, cidade natal do uísque Jack Daniels (os que visitam a destilaria podem levar para casa uma garrafa “comemorativa” da bebida).
Mesmo assim, em muitos lugares os governos apenas tentam dissuadir as pessoas de beber aplicando impostos mais altos para as bebidas alcoólicas e restringindo sua venda e publicidade. Essas medidas funcionam. Mas hoje o consumo de bebida alcoólica vem caindo por uma razão distinta: uma mudança nas normas sociais entre os jovens vem delineando um novo futuro para o álcool.
Tendência à abstinência
Em quase todos os países ocidentais, os jovens começam a beber mais tarde do que estavam habituados. A razão, em parte, é que eles se socializam muito mais online do que pessoalmente. Uma família estruturada também tem um papel nessa tendência. A julgar pelos padrões históricos, o fato de começar a beber mais tarde indica que os jovens de hoje serão uma geração que vai beber menos álcool.
Para eles, a moderação faz parte de um estilo de vida mais saudável e esta parece ser uma tendência dominante, não um mero capricho.
Os principais clientes do setor de bebidas alcoólicas atualmente são os adultos de meia idade e mais velhos. Em alguns países ricos, eles bebem mais do que as gerações anteriores na sua idade. O álcool é carcinogênico mesmo em pequenas quantidades, mas muitas pessoas não sabem. Assim, o uso de advertências como as colocadas nos maços de cigarros nos rótulos das garrafas vem sendo debatido pelos especialistas em saúde pública.
No momento, apenas a Coreia do Sul tem um alerta compulsório para câncer nas garrafas de bebidas. A Irlanda aprovou uma lei em 2018 para introduzir tais avisos, mas ainda não foi aplicada.
As grandes companhias de bebidas estão expandindo suas ofertas com baixo ou nenhum teor alcoólico, e isso se aplica a cerveja, vinho e licores. A inovação nesse campo hoje está florescendo. Quase 50% das marcas da Heineken, por exemplo, têm uma versão sem álcool. Em muitos países ocidentais essas alternativas ainda são novidade, mas as vendas vêm crescendo rapidamente. Na Alemanha e na Holanda, países que adotaram logo no início a prática, as cervejas sem álcool constituem 10% das vendas da bebida.
Ao mesmo tempo, a indústria do álcool vem seguindo na esteira do setor de tabaco e buscando novos clientes em outros lugares. Os dez mercados que mais crescem para as bebidas alcoólicas são todos de economias emergentes, especialmente na África e na Ásia (a China não está entre eles e as vendas de álcool no país vêm caindo).
Em uma ou duas gerações, beber, nos países ricos, vai parecer algo fora de moda. Até então, o álcool permanecerá um dos mais dispendiosos problemas de saúde pública e de produtividade. Estimativas oficiais indicam que o álcool tira entre 1,3% e 2,7% do PIB do Reino Unido. Nos países pobres, o dano por litro causado pelo álcool é maior – como também é maior entre os pobres do que entre os ricos nos países ocidentais.
Medidas do lado da oferta para reduzir o consumo do álcool, como impostos mais salgados, enfrentam uma batalha dura nos legislativos e nos tribunais em todo o mundo, porque os grupos contrários ao álcool não são páreo para as legiões de lobistas da indústria de bebidas. O que é quase uma reviravolta: a proibição nos EUA surgiu porque a Anti-Saloon League, que a promoveu, era um dos grupos de lobby mais poderosos dos EUA, respaldada por muitos dos homens mais ricos do país, incluindo John Rockefeller, Henry Ford e Andrew Carnegie.
Hoje restringir o álcool é uma causa problemática para filantropos apoiarem porque a bebida está enraizada na vida social dos ricos. Mas seus filhos e netos poderão se mostrar mais entusiasmados com um mundo com muito menos álcool.
Fonte: Estadão
Créditos: Polêmica Paraíba