O presidente Jair Bolsonaro decidiu enviar seu vice, o general Hamilton Mourão, para a posse do presidente eleito da Argentina, Alberto Fernández.
A informação foi confirmada à Folha pelo porta-voz da Presidência, general Otávio Rêgo Barros.
A decisão foi tomada nesta segunda-feira (9) depois de Bolsonaro ter desistido de enviar um representante brasileiro.
“Eu vejo como gesto político de boa vontade com o novo governo argentino”, disse Mourão à Folha.
Segundo o vice-presidente, ele foi chamado ao gabinete do presidente na tarde desta segunda, enquanto Bolsonaro estava reunido com uma equipe de ministos: Paulo Guedes (Economia), Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo), Jorge Oliveira (Secretaria-Geral) e Augusto Heleno (GSI).
Mourão disse não ter sido informado sobre os motivos que fizeram o presidente mudar de ideia, mas afirmou que ouviu de Bolsonaro se ele se importava de representá-lo na posse de Fernández.
O vice disse ainda que o presidente pediu que ele levasse os cumprimentos e desejo de boa sorte ao novo líder argentino, mas não soube dizer se o presidente brasileiro telefonará para seu contraparte.
Mourão deve embarcar às 20h desta segunda para Buenos Aires para o evento que será realizado na terça (10).
Bolsonaro é crítico de Fernández por seu posicionamento político de esquerda e de proximidade com Cristina Kirchner, sua vice, aliada a ex-presidentes brasileiros como Dilma Rousseff e Lula.
Após o resultado das urnas, no fim de outubro, o presidente brasileiro decidiu não ligar para o argentino para cumprimentá-lo pela vitória. Ele dirigiu uma série de críticas ao candidato eleito por ele ter declarado apoio à liberdade do ex-presidente Lula.
Bolsonaro havia desistido de enviar um representante após a ida do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), ao país vizinho na semana passada.
Segundo assessores presidenciais, Bolsonaro foi convencido por Maia a mudar de decisão e fazer um gesto diplomático em direção à Argentina. Ele telefonou na tarde desta segunda para avisar o presidente da Câmara sobre a mudança de planos.
Pela manhã, questionado sobre o assunto, Bolsonaro disse que ainda estava analisando a lista de convidados de Fernández para a posse e negou que a relação comercial entre Brasil e Argentina fosse sofrer qualquer alteração com a mudança de governo no país vizinho.
“Estou analisando a lista de convidados. Quando eu assumi aqui, eu não convidei algumas autoridades também. E o nosso comércio com a Argentina continua sendo da mesma forma. Sem problema nenhum, não vai interferir em nada”, disse ao sair do Palácio da Alvorada.
Irritado com o tema da pergunta, ele encerrou a entrevista.
Nos últimos dias, o presidente foi informado por diplomatas brasileiros que a ausência de um representante brasileiro na cerimônia de posse teve uma repercussão negativa no país vizinho, o que poderia afetar negociações futuras.
No final de semana, Bolsonaro havia informado ao ministro da Cidadania, Osmar Terra, que ele não representaria mais o país na solenidade.
Como Maia já havia se reunido com Fernández na semana passada e transmitido mensagem endereçada ao presidente argentino, Bolsonaro avaliou que o encontro já fora um gesto diplomático suficiente.
Na reunião com Fernández, Maia disse ao argentino que Bolsonaro pediu para informá-lo que defende a cooperação entre os dois países e a preservação dos acordos comerciais.
Antes de viajar para a Argentina, na quinta-feira (5), Maia se encontrou com Bolsonaro e o comunicou que faria a visita. No sábado (7), ambos voltaram a se reunir no Palácio da Alvorada e, segundo assessores presidenciais, trataram do assunto.
Ausente na solenidade de posse, Bolsonaro romperá uma tradição. Será a primeira vez em 17 anos que um presidente brasileiro não participará da cerimônia no país vizinho, principal parceiro comercial do Brasil na América do Sul.
Em 2002, o então presidente Fernando Henrique Cardoso não compareceu à posse de Eduardo Duhalde, nomeado pelo Congresso Nacional após a renúncia de Adolfo Rodríguez Saá. Nos anos anteriores, no entanto, o tucano marcou presença nas cerimônias de Fernando de la Rúa, em 1999, e de Carlos Menem, em 1995.
Duhalde assumiu na esteira da renúncia de de la Rúa, sucedido durante oito dias por Saá, após uma das maiores crises econômicas e sociais da Argentina.
Ele deixou a Casa Rosada, na época, de helicóptero, em meio a um aumento da dívida externa argentina e pressionado por um movimento social que causou 39 mortes e deixou mais de 400 feridos.
O ministro de Relações Exteriores, Ernesto Araújo, chegou a ser cogitado para representar Bolsonaro, mas o presidente desistiu porque o chanceler comparou, em entrevista à mídia local, Fernández a uma matrioska, com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva dentro.
Após a vitória do argentino, Bolsonaro afirmou que não iria a Buenos Aires para a cerimônia e também não cumprimentou Fernández, diferentemente dos presidentes dos Estados Unidos, Donald Trump, e do Chile, Sebastián Piñera, aliados do brasileiro e identificados com a direita.
Fernández é aliado do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e, ainda candidato, o visitou na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba. O petista cogitou comparecer à cerimônia de posse, mas acabou desistindo.
Durante a campanha eleitoral, Bolsonaro defendeu publicamente a reeleição de Maurício Macri, o que foi avaliado como um erro estratégico pelo núcleo moderado do Palácio do Planalto, para o qual o mandatário deveria ter se mantido distante da disputa para não afetar a relação comercial entre os países.
Recentemente, Bolsonaro moderou o tom. Ele disse, na semana passada, que, apesar de não ter uma afinidade ideológica com o governo eleito no país vizinho, não rasgará contratos e manterá uma relação pragmática com a Argentina.
“Nós temos de honrar contratos. Não podemos rasgar acordos, porque perdemos credibilidade”, disse.
Fonte: Folha de S.Paulo
Créditos: Folha de S.Paulo