Vazando por todos os lados

Rubens Nóbrega

Fica cada vez mais claro e transparente, feito água pura e cristalina, que as explicações e informações do Governo do Estado e da Cagepa para obter o aval legislativo ao empréstimo de R$ 150 milhões assemelham-se a um encanamento no qual o material é de quinta e a mão de obra, de terceira. É furo por todos os cantos.

São esses vazamentos (de)correntes que vêm irrigando por inundação as desconfianças do povo e afogando a credibilidade do Ricardus I nessa história. Ao ponto de sair da Mesa Diretora da Assembléia nota afinadíssima com a opinião pública sobre o assunto diante do qual a gestão ‘socialista’ desafina um bocado.

A nota do Legislativo começa por reduzir a pó o já lendário déficit mensal de R$ 6 milhões, que o discurso do governante garante existir porque a Cagepa arrecadaria R$ 30 milhões por mês e gastaria R$ 36 milhões. Já a Diretoria Financeira da empresa atesta uma arrecadação média mensal acima de R$ 35 milhões em 2011 e, este ano, o apurado teria aumentado até bater na casa dos R$ 41 milhões mensais.

Outra coisa. Se cobrasse pra valer o que tem a receber dos seus 100 maiores devedores, somente aí a Cagepa arrecadaria mais de R$ 126 milhões e só precisaria tomar emprestados mais R$ 24 milhões (e não R$ 150 milhões) para resolver seus problemas de caixa (se é que eles existem na ordem de grandeza propalada).

Mas nem os R$ 24 milhões seriam necessários porque a Cagepa já tomou este ano R$ 32 milhões do Banco Gerador, ao qual a empresa pagou estranhíssima comissão no valor de R$ 500 mil e ainda se comprometeu a desembolsar mais 5% do valor tomado quando for quitar o empréstimo, a título de “esforço bancário”.

A transação com o tal Gerador, que é do Recife, foi denunciada ontem pelo deputado Gervásio Maia, presidente da Comissão de Orçamento da Assembléia. A denúncia não recebera até ontem à noite quaisquer reparos ou reações oficiais. Talvez porque não tenha o que reagir nem reparar da parte do governo ou da Cagepa.


Não dá pra acreditar

O novo empréstimo e o bate-cabeça dos dirigentes da Cagepa surgem como os mais novos e nebulosos lances do intrincado enredo que o Ricardus I montou para convencer que sem o empréstimo de R$ 150 milhões a empresa não tem mais como pagar seque conta d’água com tarifa social e, se brincar, fecha ou vai a leilão.

Pelo visto, parece que o governo não consegue convencer nem a si próprio, considerando que a todo instante divulga cifra ou dado diferente sobre a situação financeira da Cagepa. E cada número ou a soma de todos eles recomenda dizer não ao aval que o monarca quer da Assembléia para pegar os R$ 150 milhões.

Aliás, nem esse valor bate com o que seria a verdadeira necessidade de reforço financeiro da Cagepa. Isso, se levarmos em conta que o empréstimo junto à Caixa Econômica Federal não passa de R$ 120 milhões, conforme documento encaminhado em 19 de junho passado pelo presidente da Cagepa, Deusdete Queiroga, ao presidente da Agência de Regulação do Estado da Paraíba (ARPB), José Otávio Maia.
Novo aumento na tarifa

No mesmo documento, Deusdete encaminhou à Agência proposta para elevar em mais 9,67% a tarifa. Se aprovado (e estaria pra ser ontem em reunião da ARPB), será o segundo aumento que o Ricardus I impõe na conta de água fornecida pela Cagepa em apenas um ano e sete meses de governo. O primeiro foi de quase 17%, em maio do ano passado. Um sobre o outro, ou seja, aquele agregado ao que está pra sair dá mais de 26%. Lembrando que no período a inflação acumulada ficou em torno de 5%.

Desse jeito, nem as vozes impostadas da tribuna da Parlamento estadual nem a voz rouca das ruas têm condições de dizer sim a esse empréstimo porque a palavra do soberano mergulhou num manancial de contradições e inconsistências que somente uma auditoria externa e independente na Cagepa conseguiria limpar.

Talvez nem isso, porque dentro da própria companhia é como se estivesse “tudo certo como dois e dois são cinco”, tamanho o desencontro com que membros de sua diretoria vêm a público apresentar informações que se antagonizam no confronto entre o déficit que um preconiza e o superávit que o outro admite.
R$ 300 milhões a receber

Agora, se cobrasse pra valer o que tem a receber de todos os devedores em atraso, a Cagepa arrecadaria mais de R$ 300 milhões, botaria todas as suas contas em dia, não precisaria mais tomar empréstimo algum e ainda ficaria com um bom troco para investir em melhoria no sistema e nos serviços prestados à população.

Mas nem isso a empresa estaria disposta a fazer, a julgar pelo fato de que há sete meses a direção da Cagepa informou à Assembléia ter os créditos da ordem de R$ 300 milhões para recuperar e garantiu que botaria os caloteiros nos SPCs, Serasas e Cadins da vida. Resultado: nada do que se comprometeu fazer a empresa fez. O que garante, então, que aplicará realmente os R$ 150 milhões na resolução de débitos com bancos pequenos que, a propósito, ninguém sabe quais são.