É caso de Paulo, engenheiro, de 51 anos, que pediu para ter seu nome alterado. Ele conta que percebeu ainda na puberdade que era mais acelerado que os demais. Nessa época, descobriu a pornografia e o vício em masturbação. “Comprava compulsivamente revistas e, quando não tinha dinheiro, roubava. Sentia-me sujo e pecador após o orgasmo. Jogava fora as revistas por alguns minutos e logo as pegava no lixo. Tudo por mais uma dose de prazer”, ela conta.
A situação ficava mais grave no transporte público, quando procurava, segundo ele “desesperadamente” chances para encostar braços e mãos nos glúteos femininos. Essa atitude hoje em dia é crime de importunação sexual. “Uma vez fui perseguido, tentaram me agredir, mas consegui escapar”, ele diz.
Como tinha a autoestima muito baixa e nenhum êxito nos flertes, ele buscava oportunidades no voyeurismo. Os primeiros beijos foram na empregada doméstica de casa. “Ia aos cinemas pornôs duas vezes por semana e ficava lá por horas. Usei banheiro de colégio, faculdade e avião para me masturbar com ou sem pornografia”, ele diz.
Já adulto, percebeu que sofria muito quando não tinha um orgasmo. Começou a circular em pontos de prostituição. “Saía com travesti, ia para o motel e tinha orgasmo. Repetia isso três vezes na mesma noite. Ao chegar em casa, buscava pornografia e me masturbava. Obviamente, no dia seguinte não conseguia trabalhar”. As consequências iam ficam drásticas.
Paulo frequentou o swing dos 30 aos 43 anos, indo a uma média de dois eventos por semana. Foi casado cinco vezes e pelo menos nos quatro casamentos praticou assiduamente sexo grupal com esposas, namoradas e amantes. Teve dois filhos não programados.
“Minha vida durante o tempo de swing era trabalhar, ganhar dinheiro e vivenciar as fantasias. Viajei para todos os lugares do Brasil e do mundo. Perdi vários momentos importantes da primeira infância dos meus filhos e até hoje minha relação com eles sofre sequelas por causa desse abandono”, ele diz.
Ainda no swing, se não rolasse sexo com algum casal ou uma parceira, ficava irritado com a esposa. Seguiam então para um prostíbulo. Quando chegavam em casa, faziam sexo novamente e ele ainda se masturbava depois.
“Esse tipo de comportamento me fazia mal. Poderia ter a mulher mais bonita do grupo, mas quando ela se apaixonava por mim, eu já estava interessado em outra. Assim foi na maioria dos meus relacionamentos. Fui infiel, traí esposas, parceiras. Era incontrolável. Tinha sentimentos de dor e baixa tolerância às frustrações. São diversas coisas que engatilhavam esse comportamento, por isso preciso ter uma vida de vigília e evitar pessoas e hábitos que gerem as compulsões”, ele diz.
Como saber que está doente
Por ser uma atitude praticada e inerente a todos os seres humanos, muitas vezes é difícil saber quando se perdeu a medida de um sexo saudável. O psiquiatra Aderbal Vieira Junior, responsável pelo ambulatório de tratamento de dependências de comportamentos do PROAD (Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes) da UNIFESP (Universidade Federal de São Paulo), explica que existem alguns sinais, que juntos, podem se caracterizar pela compulsão sexual. O primeiro deles é a perda de liberdade e controle, como aconteceu com Paulo desde muito cedo.
É como se a pessoa fosse escolhida pelo ato sexual, masturbação, voyeurismo, etc. “Se fôssemos comparar, é quando alguém vai ao bar e pensa em tomar uma cerveja, mas no fim bebe oito, perde o controle e a sua liberdade de escolher”, afirma o especialista.
Outro ponto que acende o alerta ocorre quando certas atitudes trazem prejuízos à vida profissional, pessoal e também à saúde e a segurança. “Um exemplo é quando a pessoa sofre um processo de abuso sexual por encoxar mulheres no metrô”, ressalta o psiquiatra.
Paulo já foi internado três vezes por conta da dependência de sexo e diversas vezes tentou se tratar, como conta, “fazendo jejum e orando”. “Encontrei ajuda há 20 anos por meio da psicoterapia e tratamento com psiquiatra. Há dez anos, encontrei o DASA (Dependentes de Amor e Sexo Anônimos) e tento aplicar os passos em todas as áreas da minha vida, que vêm melhorando bastante. A compulsão não tem controle, mas o tratamento se chama recuperação. O primeiro passo foi aceitar que tinha uma doença incurável. O ideal é não fazer sozinho, mas buscar ajuda de grupos de apoio, padrinhos e evitar comportamentos que podem remeter à doença”, ele descreve. Vem dando certo — ele está “limpo” do swing, drogas e álcool há oito anos. “Eventualmente, cometo um deslize na pornografia ou no voyeurismo, mas logo busco apoio para voltar aos trilhos. Não fico na sarjeta. Em recuperação tudo fica muito melhor. Há vida com minha família, namorada e trabalho. A base é estar limpo.”
Mulheres podem ser compulsivas?
Vieira Júnior afirma que a compulsão sexual atinge mais os homens. No caso das mulheres, o mais comum é a dependência afetiva sexual, ou seja, quando ela quer ficar com um homem de qualquer maneira, sem medir as consequências e se colocando em situações perigosas.
A funcionária pública Andréia*, 45 anos, de Minas Gerais, está entre as que sofrem com o problema, que ela só se deu conta após começar a frequentar o DASA (Dependentes de Amor e Sexo Anônimos). “Sou uma dependente de amor e sexo. E falar isso agora é tranquilo. Eu tenho uma carência muito grande, e transformo todos os namorados no ‘príncipe’, que vai me fazer feliz para sempre. Entro de cabeça, sufoco, mas ao mesmo tempo tem uma parte de mim que não quer se envolver. E vivo uma relação onde eu mando. Sempre atraí homens problemáticos, aqueles que precisam de alguém para colocá-los para frente. Tenho as duas faces da doença: compulsão por sexo (aquela coisa de pele, da atração física falar mais alto e me colocar em situações insanas) e anorexia. E quando termino um relacionamento me fecho totalmente — às vezes por anos — a qualquer aproximação”
O tratamento da compulsão sexual varia de acordo com cada paciente, mas há um ponto em comum: é preciso fundamentar o processo em psicoterapia e intervenções comportamentais. A prescrição de medicamentos só acontece quando há comorbidades associadas, como ocorrência de depressão, síndrome do pânico, entre outras, causadas pela compulsão.
Você tem tendência à dependência de sexo? Faça o teste
Esse teste é uma escala de rastreamento, não diagnóstico. Se você marcar seis respostas ou mais como SIM, talvez seja interessante procurar ajuda profissional. O agendamento de triagens do PROAD (Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes) é o (11) 99645-8038. Fonte: Unifesp (Universidade Federal de São Paulo)
1. Você sofreu abuso sexual quando criança ou na adolescência?
( ) Sim ( ) Não
2. Você visto muita pornografia?
( ) Sim ( ) Não
3. Seus pais tiveram problemas de ordem sexual?
( ) Sim ( ) Não
4. Você frequentemente se percebe preocupado com questões sexuais?
( ) Sim ( ) Não
5. Você acha que seu comportamento sexual não é normal?
( ) Sim ( ) Não
6. Sua(eu) esposa(o) ou companheira(o) se preocupa ou reclama de seu comportamento sexual?
( ) Sim ( ) Não
7. Para você é difícil interromper seu comportamento sexual mesmo sabendo que é inadequado?
( ) Sim ( ) Não
8. Você chega a se sentir mal por causa de sua conduta sexual?
( ) Sim ( ) Não
9. Sua conduta sexual já causou problemas a você ou à sua família?
( ) Sim ( ) Não
10. Você alguma vez buscou ajuda para lidar com comportamentos sexuais de que não gostava?
( ) Sim ( ) Não
11. Você já chegou a se preocupar com o fato de as pessoas descobrirem a respeito de suas atividades sexuais?
( ) Sim ( ) Não
12. Alguém já se feriu emocionalmente devido à sua conduta sexual?
( ) Sim ( ) Não
13. Alguma de suas atividades sexuais é ilegal?
( ) Sim ( ) Não
14. Você já prometeu deixar de fazer alguma coisa relacionada ao seu comportamento sexual?
( ) Sim ( ) Não
15. Você já fez alguma tentativa de interromper algum aspecto de sua conduta sexual e acabou não conseguindo?
( ) Sim ( ) Não
16. Você tem que esconder dos outros algum aspecto de seu comportamento sexual?
( ) Sim ( ) Não
17. Você já tentou parar de fazer alguma coisa relacionada a sua atividade sexual?
( ) Sim ( ) Não
18. Você já achou que o seu comportamento sexual era degradante?
( ) Sim ( ) Não
19. Para você, sexo é uma forma de escapar de seus problemas?
( ) Sim ( ) Não
20. Você se sente deprimido após fazer sexo?
( ) Sim ( ) Não
21. Você já sentiu necessidade de deixar de praticar alguma forma de comportamento sexual?
( ) Sim ( ) Não
22. Sua atividade sexual interfere em sua vida familiar?
( ) Sim ( ) Não
23. Você já manteve práticas sexuais com menores de idade?
( ) Sim ( ) Não
24. Você sente que é controlado por seu desejo sexual?
( ) Sim ( ) Não
25. Você sente que seu desejo sexual é mais forte do que você?
( ) Sim ( ) Não
Onde buscar ajuda:
Fonte: UOL
Créditos: UOL