O professor nigeriano Dammy Damilare Falade, 25, estrangeiro que aparece no vídeo institucional para o Sete de Setembro gravado pela EBC (Empresa Brasil de Comunicação), vinculada ao governo Jair Bolsonaro (PSL), acusa a equipe de filmagem de não ter informado a ele sobre o real uso de sua imagem na peça promocional.
Falade diz ter sido abordado em Brasília pela equipe da EBC, em 27 de agosto passado, sob argumento de que a gravação era para “um documentário sobre pessoas que cantam o hino de maneira engraçada”.
O professor conta que estava na capital federal para renovar o passaporte junto ao consulado nigeriano e, após resolver o compromisso, foi passear pela cidade enquanto aguardava o voo de volta para Salvador, onde vive, quando foi abordado pela equipe de TV em frente ao Museu Nacional.
“Eles falaram, em tom de brincadeira, dando risada, que estavam gravando um documentário sobre pessoas que não sabiam cantar o hino nacional, mas se arriscavam assim mesmo e o faziam de forma engraçada. ‘Vamos ver se você sabe mesmo’, disseram”, relata Falade.
Para a surpresa do professor, ele só tomou conhecimento da participação involuntária no vídeo institucional por volta das 13h do último sábado (7), depois de acordar e verificar diversas mensagens de amigos questionando sua atuação na peça publicitária.
A aparição foi curta, a partir dos 51 segundos, tempo de apenas entoar o verso “conseguimos conquistar com braço forte”, antes do próximo quadro mudar para o ministro da Educação, Abraham Weintraub, mas o suficiente para repercutir no círculo pessoal de Falade.
“Eu detesto tudo que esse governo representa. Acordei com meus amigos perguntando se, agora, eu era bolsominion, se eu tinha me vendido ao governo, quanto eu recebi pela participação”, disse ele, que pretende adotar medidas judiciais em relação ao episódio.
Indignado com a divulgação da imagem sem seu consentimento, o professor divulgou um desabafo na rede social Instagram, que conta com 117 comentários. A maioria das mensagens é de apoio a Falade, críticas ao governo e de incentivo a buscar providências no âmbito jurídico.
Morador de Salvador há cinco anos, Falade deixou pais, três irmãs e um irmão na Nigéria para fazer intercâmbio na UFBA (Universidade Federal da Bahia), onde se graduou em letras. Atualmente, leciona inglês e francês em uma escola na capital baiana.
Segundo o imigrante, a ideia inicial era ficar apenas um ano, durante o período do intercâmbio, mas ficou encantado pelo acolhimento na cidade com a maior população negra fora do continente africano. “Eu me apaixonei por Salvador. Aqui, eu me sinto em casa.”
Por meio de nota, a EBC informou que produziu o vídeo com autoridades e a população cantando o hino nacional em homenagem ao Dia da Independência do Brasil.
Segundo a nota, profissionais devidamente uniformizados e identificados com crachá estavam posicionados com equipamentos de gravação em frente ao Museu Nacional de Brasília quando convidaram Dammy Falade a participar do vídeo.
Ainda de acordo com o texto, a equipe teria informado que se tratava de um vídeo institucional, sem fins comerciais, produzido para divulgação da Presidência da República, versão novamente contestada pelo professor, que sustenta não ter sido informado sobre a intenção da gravação.
“Sim, eles [a equipe] estavam com jaquetas parecidas, mas não notei nenhum crachá”, afirmou Falade. “Em momento algum, falaram o motivo da gravação, a não ser que era para um documentário. Por achar que se tratava de um trabalho de universitários, aceitei.”
Apesar do pedido da reportagem, a EBC não apresentou um contrato de concessão, tampouco respondeu se costuma utilizá-lo nesses casos nem informou quais profissionais estiveram envolvidos na filmagem.
Rodrigo Moraes, professor de direito civil da Faculdade de Direito da UFBA e presidente da Comissão de Propriedade Intelectual da seção baiana da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), explica que, em tese, nesse caso, pode ter havido distorção de finalidade no uso de imagem.
“Se a equipe de reportagem explicar a intenção do vídeo e a pessoa autorizar, mesmo sem ser por escrito, ok. O que não pode é distorcer a finalidade, como parece que é o caso. Se houve violação, cabe recorrer à Justiça Federal contra a União, não contra os funcionários”, afirmou o professor.
Moraes ressalta que o inciso X do artigo 5º da Constituição Federal versa que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.
“O correto é a empresa provar que houve a autorização, não ele. Em tese, o ônus é dela. A autorização sempre deve ser restritiva, para uma finalidade específica. A empresa tem que provar a boa-fé objetiva, princípio que norteia todos os contratos, com base na lealdade e informação”, crava.
Procurada na tarde desta quarta-feira (11), a Secretaria de Governo da Presidência não se manifestou até a conclusão deste texto.
Fonte: Noticias ao minuto
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