O poder está subindo à cabeça de Jair Bolsonaro, que foi um militar atípico, polêmico, e um político apagado, inexpressivo, mas se torna um presidente cada vez mais audacioso, capaz de demitir três importantes quadros do governo pela imprensa. Essa é uma atitude arrogante e humilhante, ou “uma covardia sem precedentes”, segundo o deputado Rodrigo Maia.
Gustavo Bebianno, da linha de frente da campanha presidencial, quase foi ministro da Justiça, ganhou cargo e sala no Planalto e acabou virtualmente demitido por um tuíte do “02”, Carlos Bolsonaro.
Juarez de Paula, general da reserva, soube da sua demissão da presidência dos Correios após um café do presidente da República com jornalistas. Foi, aliás, um dos três generais demitidos numa única semana, na qual a principal vítima foi Santos Cruz, um dos oficiais de elite do Exército.
Joaquim Levy, economista escolhido pelo superministro Paulo Guedes para a presidência do BNDES, foi demitido com requintes de crueldade: em pleno sábado, numa rápida entrevista de Bolsonaro para jornalistas, com termos indelicados e uma menção desrespeitosa ao próprio Guedes, dizendo que nem consultaria o ministro para demitir o seu subordinado.
É um jeito atrapalhado de fazer as coisas. Ninguém nega o direito ao presidente de nomear ou demitir ministros e auxiliares, mas para tudo há regras, jeito, protocolo. Tal como seu ídolo Donald Trump, Bolsonaro está exagerando ao jogar homens ao mar.
Com uma curiosidade: antes de cair, eles se tornam zumbis. A demissão de Vélez Rodríguez demorou 12 dias para ser anunciada, a de Santos Cruz, mais de um mês, a de Levy, sabe-se lá quanto tempo, e a do general dos Correios, anunciada na sexta, ainda não tem data para ser formalizada. Ontem mesmo, ele falou aos funcionários dos Correios num tom pouco usual, na base do “daqui não saio, daqui ninguém me tira”. E deitou falação sobre a privatização da empresa, justamente o foco da crise com o presidente.
Por essas e outras, setores da opinião pública, do empresariado e do meio militar estão estranhando o estilo Bolsonaro. Antes, aplaudiam a “simplicidade” e o “jeitão descontraído” do presidente. Agora, desconfiam de que a simplicidade e o jeitão escamoteavam uma personalidade que reúne mandonismo, suscetibilidade a intrigas e ojeriza ao contraditório – o oposto do que se espera de um estadista.
Enquanto Bolsonaro apronta das suas, os postulantes de 2022 começam a se mexer. À frente deles, o afoito governador João Doria, homenageado, nada mais, nada menos, pelos mesmos anfitriões e na mesma casa que acolheu a campanha de Bolsonaro não faz muito tempo. A turma tem faro…
Quanto mais Bolsonaro surpreende (ou assusta), mais Doria ganha desenvoltura (e simpatizantes bolsonaristas). Aliás, um ataque especulativo semelhante pode estar ocorrendo contra o ministro Sérgio Moro, que entrou no alvo a partir de diálogos com os procuradores da Lava Jato divulgados pelo site The Intercept Brasil. A cada vez que Bolsonaro acena com um ministro evangélico para o Supremo, mais as ações de Moro caem nas bolsas de apostas, mais as do ainda juiz Marcelo Bretas sobem. Bretas é o Doria de Moro.
Bolsonaro não pode fazer com o ministro mais conhecido, mais admirado e mais amado do governo – o seu maior troféu – o que fez com Bebianno, Santos Cruz, Levy e Juarez de Paula, entre outros menos cotados e derrubados pelos seus filhos (como os presidentes da Apex). Mas, assim como ele não pode demitir Moro, Moro não tem para onde ir. Por ora, porque, depois, ninguém descarta a futura candidatura do ícone da Lava Jato à Presidência. É muito cedo, mas 2022 está começando.
Fonte: Estadão
Créditos: Estadão