Não tenho informações suficientes para comentar especificamente nenhum dos dois casos, mas queria falar de algumas reações a eles. De como ainda precisamos galgar um Everest para que a mulher seja tratada como merece —e não estou me referindo a flores idiotas.
Segundo as informações que vieram a público até agora, o funkeiro bolsonarista MC Reaça se matou após espancar a amante, que está grávida e precisará de cirurgia.
Tivesse ele uma, duas, 95 amantes, isso só diz respeito às pessoas envolvidas. E o seu crime, seja ele reaça, esquerdopata, lulista ou bolsonarista, deveria ser pago na cadeia, com todo o rigor da lei, jamais com a vida. Dito isso, é chocante a reação de Jair Bolsonaro.
“Tinha o sonho de mudar o país e apostou em meu nome por meio de seu grande talento. Será lembrado pelo dom, pela humildade e por seu amor pelo Brasil”, disse o presidente do país em que se agride e mata mulheres como um esporte nacional.
Se estava mal informado sobre as circunstâncias, essa é mais uma prova ululante da impressionante incompetência que o cerca.
No caso do atacante cai-cai da seleção brasileira, também não há ainda elementos para dizer se houve estupro ou se ele foi vítima de um ardil.
O que há são elementos da total falta de noção de pessoas, incluindo mulheres, que acham que a denunciante, tipo, pediu algo assim. Aceitou passagem, hospedagem em Paris, trocou mensagens picantes. Estava indo pra que, comer croissant?
É a velha opinião do tiozismo de churrasco, de que mulher de pernas de fora e decotão está é pedindo. Pesquisa do Datafolha de 2016 mostrava que um terço das pessoas concordava com a frase de que “a mulher que usa roupas provocativas não pode reclamar se for estuprada.”
Não importa se a convidada de Neymar aceitou passagens, carro do ano, enviou nudes. Se na hora, seja por qual motivo for, mudou de ideia e disse não, não é não.
E não há pessoa no mundo com o direito de obrigá-la a dizer sim.
Fonte: Folha de S. Paulo
Créditos: Ranier Bragon