Em seus dois primeiros meses de mandato, o senador Alessandro Vieira (PPS-SE) comprou uma briga que nenhum outro parlamentar encarou anteriormente. Aos 44 anos ,o delegado da Polícia Civil coletou duas vezes assinaturas exigidas para a instalação de uma CPI destinada a investigar a conduta de ministros de tribunais superiores.
A CPI, apelidada de Lava Toga – em alusão à megaoperação que desbaratou o esquema de corrupção na Petrobras – parou na presidência do Senado nas duas oportunidades. O senador, porém, não desiste e ainda aposta suas fichas em um recurso que está para ser analisado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
Desde que começou a colher as assinaturas, Alessandro ganhou apoio nas redes sociais. Grande parte dessa adesão popular está relacionada àqueles que são apontados como os dois principais alvos da CPI: o presidente do Supremo, Dias Toffoli, e o ministro Gilmar Mendes. Para o senador, os dois ministros precisam, de fato, vir a público esclarecer suspeitas que recaem sobre eles.
“Precisamos discutir a relação do Toffoli com o Banco Mercantil e do Gilmar com o Bradesco. Os contatos políticos constantes deles. Por que Gilmar desembarcou na casa do Rodrigo Maia [presidente da Câmara] quando Moreira Franco [ex-ministro e sogro de Maia] foi preso? Toffoli fala de política o tempo todo. Isso não é função de um ministro”, defende. O senador se refere à participação dos ministros em processos que envolvem bancos com os quais mantêm algum tipo de contato (veja mais abaixo as suspeitas atribuídas pelo senador aos ministros).
Choque de poderes
Alessandro aponta Toffoli e Gilmar como os dois maiores obstáculos à criação da CPI. Segundo ele, os ministros têm pressionado o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e outros parlamentares a desistirem da comissão. Procurados pelo Congresso em Foco, nenhum dos três se manifestou até a publicação desta reportagem. O presidente Jair Bolsonaro também não vê com bons olhos a investigação. Acredita que, ao criar uma tensão entre o Legislativo e o Judiciário, a CPI pode imobilizar o Congresso.
De acordo com Alessandro Vieira, os colegas que resistem à CPI alegam publicamente que é preciso respeitar a independência e a autonomia entre os poderes Executivo e Legislativo. Qualquer movimento em contrário, acrescentam, poderia desencadear uma crise institucional e prejudicar o país. O argumento não se sustenta, refuta o senador sergipano.
“Muitos senadores estão com medo por causa dos processos a que respondem no Supremo. Outros alegam que isso vai desencadear uma crise que vai parar o país. Ora, o país já está paralisado pela crise de gestão do Executivo”, observa.
Gilmar Mendes é o nome mais citado no requerimento de CPI, no qual aparece em cinco das 13 possíveis irregularidades que o colegiado se propõe a apurar, conforme mostrou o Congresso em Foco. “A CPI não pode discutir o mérito das decisões dos ministros, mas as circunstâncias que os levaram a tomá-las”, explica Alessandro.
Segundo o requerimento do senador, Gilmar Mendes teve atuações com suspeita de conflito de interesses, julgou casos nos quais estaria impedido por ter relação com os investigados, abusou de pedidos de vista para retardar decisões do plenário e tomou decisões opostas com a mesma justificativa legal. Ele também é alvo de pedido de impeachment apresentado pelo jurista Modesto Carvalhosa.
Na lista da CPI, o caso do Bradesco ao qual Alessandro Vieira se refere foi relevado pelo site Buzzfeed, em setembro de 2017. De acordo com a reportagem, o Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), que tem o ministro como sócio-fundador, recebeu empréstimos de R$ 36,4 milhões do banco desde 2011. Naquele período, segundo a reportagem, o banco aceitou prorrogar cobranças, reduzir taxas e até abriu mão de ganhar R$ 2,2 milhões em juros do instituto.
No período dos empréstimos, prossegue o requerimento de CPI, atuou em 120 casos no Supremo envolvendo o Bradesco. Gilmar também é, segundo o pedido de investigação, relator de dois dos cinco recursos que resolverão a disputa dos bancos com poupadores lesados pelos planos econômicos criados no fim dos anos 1980. O litígio é de quantias que variam entre R$ 20 bilhões a R$ 100 bilhões.
Gilmar não quis se manifestar agora sobre o assunto. Mas, em 2017, disse ao Buzzfeed que não é e nunca foi administrador do IDP, mas sócio fundador da instituição de ensino. Contou que houve apenas renegociações de juros praticados pelo mercado financeiro e que “não há qualquer conflito de interesse” em sua atuação nos processos envolvendo o Bradesco.
Fonte: Congresso em Foco
Créditos: Congresso em Foco