O Supremo Tribunal Federal ( STF ) decidiu, nesta quinta-feira, que processos daLava-Jato sobre corrupção ligados à prática de caixa dois devem ser enviados para a Justiça Eleitoral. Para procuradores de Curitiba, a decisão enfraquece a Lava-Jato. Eles preferiam que esses casos ficassem na Justiça Federal, por ser um ramo do Judiciário com mais estrutura para conduzir investigações complexas.
A decisão não é automática: será analisado caso a caso, para saber qual o foro adequado do processo específico. A partir do entendimento do STF, advogados poderão pedir a nulidade de decisões tomadas em processos que estão na Justiça Federal, alegando que houve caixa dois. Os juízes responsáveis pelas causas decidirão se o processo será transferido ou não para a Justiça Eleitoral.
O placar da votação foi de seis votos a cinco. A maioria afirmou que, por lei, crimes eleitorais só podem ser julgados pelo ramo especializado do Judiciário, mesmo quando a prática tiver ligação com outros delitos. Por exemplo: um agente público que recebe propina e usa o dinheiro em campanha, sem declarar os valores, pode ser enquadrado em caixa dois, mas também em corrupção. O caso, portanto, deve ser conduzido pela Justiça Eleitoral.
O ministro Gilmar Mendes fez duras críticas a procuradores da República. Para ele, há polêmica em torno da questão por conta da ambição dos investigadores.
— O que se trava aqui é uma disputa de poder. Se quer ganhar a fórceps, constranger, amedrontar as pessoas. Mas fantasmas e assombração aparecem para quem neles acredita. São métodos que não honram as instituições — declarou o ministro.
Mendes partiu para ataques mais agressivos ao falar da conduta profissional dos procuradores:
— Isso é um modelo ditatorial. Se eles estudaram em Harvard, não entenderam nada. Gentalha, são uns cretinos, não sabem o que é processo, não sabem o que é processo civilizatório. É preciso combater a corrupção dentro do Estado de Direito, e não cometendo crime, ameaçando. Assim se instalam as milícias. O esquadrão da morte é fruto disso.
O ministro Edson Fachin, relator da Lava-Jato, está entre os que defenderam a divisão desse tipo de processo – ou seja: a prática de caixa dois seria apurada pela Justiça Eleitoral e os demais crimes, pela Federal. Luís Roberto Barroso está entre os que concordaram com Fachin.
— O Brasil vive uma epidemia em matéria de criminalidade. Faz pouca diferença distinguir se o dinheiro vai para o bolso ou para a campanha. O problema não é para onde o dinheiro vai, é de onde o dinheiro vem. E o dinheiro vem da cultura de achaque e corrupção que se disseminou pelo país — disse Barroso.
O ministro disse que a Lava-Jato foi um “divisor de águas no enfrentamento da corrupção institucionalizada no Brasil”. Ele lamentou, ainda, as reações ao julgamento do STF.
— Fico mais triste ainda ao constatar que esta é a opinião de uma parte relevante da sociedade brasileira, que acha que o Supremo embaraça as investigações contra a corrupção — declarou Barroso, completando: — Não será bom, após anos de combate à corrupção, mexer em uma estrutura que está dando certo, funcionando, e passar para uma estrutura que absolutamente não está preparada para isso.
A decisão foi tomada no processo aberto contra o ex-prefeito do Rio Eduardo Paes e seu braço direito, o deputado federal Pedro Paulo (DEM-RJ). Os dois são investigados por corrupção, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e recebimento de recursos de caixa dois da Odebrecht.
O grupo de Fachin votou pela divisão das investigações, com a remessa do crime de caixa dois para a Justiça Eleitoral do Rio. Os demais crimes seriam apurados pela Justiça Federal. Mas a maioria do tribunal votou para que toda a investigação ficasse a cargo da Justiça Eleitoral do Rio, pela conexão dos crimes.
Recentemente, a Segunda Turma do STF, formada por cinco ministros, enviou para a Justiça Eleitoral inquéritos da Lava-Jato, como o do senador José Serra (PSDB-SP) e do ex-presidente Michel Temer (MDB). A Primeira Turma, por outro lado, costuma enviar esse tipo de processo para a Justiça Federal. O julgamento do plenário uniformiza o entendimento na Corte.
Fonte: O Globo
Créditos: O Globo