“Eu sobrevivi pra ser feliz. Se sai dessa história com vida, se Deus me deu uma segunda chance, não vou desistir de viver, ter um casamento, um marido, uma ótima família”. A frase é da cabeleireira Raquel Ninô Curi, 42 anos, ao dizer o que espera da vida, após sobreviver a dois espancamentos, cinco estupros e a seis facadas do ex-marido, com quem tem um filho de três anos.
Ela é uma das centenas de vítimas de violência doméstica e familiar que, em 2018, buscaram o auxílio da Defensoria Pública de Mato Grosso, via o Núcleo de Defesa da Mulher de Cuiabá (Nudem), para reestabelecer o mínimo de parâmetros para dar continuidade à vida e deixar para trás um passado, que ela afirma, nem em seu pior pesadelo, imaginou viver.
Raquel conta que conheceu o ex-marido, oito anos mais novo que ela, quando eram vizinhos e não queria qualquer envolvimento emocional, por estar se recuperando de um abandono.
“Fui deixada pelo meu ex-noivo, um mês antes do casamento, então, não queria nada, com ninguém. Mas ele insistiu, era carinhoso, atencioso, prestativo e nunca demonstrou qualquer indício de ser violento”.
Ela afirma que viveram bem por algum tempo, ambos trabalhando e ganhando o suficiente para as despesas e para se divertirem.
Foi nessa época, que ela conta, que as dificuldades começaram a aparecer.
“O nosso filho já tinha nascido e ele ganhava muito pouco lá, então voltei a trabalhar para ajudar, mas ele começou a ter ciúmes. Na dificuldade financeira eu conheci um homem violento, que na primeira vez que me bateu, em 16 de dezembro de 2017, me deixou com olho roxo e hematomas pelo corpo”.
É nesse ponto que a história de Raquel se assemelha a de muitas outras mulheres que também chegam à Defensoria Pública: ela não denunciou a primeira agressão, nem se separou, mesmo percebendo que havia algo de muito errado com a reação criminosa do marido.
“Acreditei que ele havia se arrependido e que iria conseguir ajudá-lo com tratamento, algo assim. Pensei no meu filho, na nossa família e como ele cuidou das feridas que provocou, acreditei que nunca mais faria algo violento”, lembrou.
“Ganhávamos bem para sustentar nossa vida, não tínhamos filho, porém um ano e meio depois de vivermos juntos ele sofreu um acidente, quebrou o joelho em três lugares e nos mudamos para Araputanga, pra viver e trabalhar com os pais dele”, continuou.
Como o tempo mostrou, Raquel estava errada. Carioca, com a família vivendo em outro Estado, ela deixou o agressor e a família dele para trás com ajuda de amigos, depois de apanhar na frente de uma vizinha, ser estuprada por cinco vezes e sofrer uma tentativa de homicídio.
“Eu já estava decidida a deixá-lo. Não sentia mais nada por ele e como me forçava a ter relação, criei repulsa. Mas tinha uma operação para fazer e minha sogra me convenceu a operar primeiro. Uns 15 dias após a operação discutimos e ele tentou me matar com as facadas”.
Providências
Em Cuiabá, Raquel buscou ajuda da Defensoria Publica, via Nudem, para entrar com ação de pedido de alimentos para o filho e para conseguir medida protetiva que impeça o ex-marido de se aproximar dela. Raquel também faz acompanhamento psicológico, via posto de saúde.
“Faço acompanhamento psicológico porque ainda tenho pesadelos, sinto pânico e ansiedade. Mas o que mais me perturba hoje não foi o que passei, pois já foi e é passado. A vida continua. O que mais me incomoda é o preconceito das pessoas, pois sobrevivi e preciso de emprego, de cuidar do meu filho e percebo que minha história assusta as pessoas. Ficam sempre se perguntando o que eu fiz de errado. Eu não fiz nada, por isso, não tenho vergonha de aparecer. O criminoso é ele”.
Fonte: Mídia News
Créditos: Mídia News