renovado

FUMAVA, CHEIRAVA E BEBIA: André Neles, ex-atacante do Palmeiras, conta como ganhou o apelido 'Balada' e superou as drogas

O depoimento acima descreve os problemas enfrentados por um ex-jogador que tinha potencial e acabou vendo o seu talento sendo desperdiçado.

“Você está num barzinho tomando cerveja e vendo o cara cheirar. Aí o cara que cheirou te oferece. Você vai e pega. Na balada, entra no banheiro e tem cara cheirando: ‘Você quer aí, negão?’ E você vai e pega.”

O depoimento acima descreve os problemas enfrentados por um ex-jogador que tinha potencial e acabou vendo o seu talento sendo desperdiçado.

Desperdiçado pela vida noturna agitada e pelo vício por drogas e bebidas. O nome era André Neles, mas a maioria dos torcedores lembra dele, mesmo, pelo apelido: André Balada. Foi um promissor atacante que apareceu no Atlético-MG no início dos anos 2000, foi vendido para o Benfica, mas entrou em decadência quando foi emprestado para o Palmeiras em 2003.

Aos 41 anos, André Neles encerrou a carreira no fim de 2017, jogando pelo Alecrim-RN. Pouca gente soube de sua aposentadoria ou dos últimos clubes pelos quais passou.

Em suas palavras, a sua maior chance foi no Palmeiras, mas não conseguiu lidar com a pressão e a sedução noturna de uma megalópole como São Paulo, além de reclamar das poucas oportunidades que recebeu do técnico Jair Picerni. Durante o período no time alviverde, o jogador rendeu-se ao álcool e às drogas e não conseguiu mais se reerguer profissionalmente.

A droga é uma loucura. Você esquece filhos, esposa… Você esquece que tem mãe, que tem amigos, que tem profissão. A cocaína te joga no mundo do abismo e você fica cego, obcecado. E não consegue enxergar mais nada além da droga. É uma coisa demoníaca, entendeu? 

Como nasceu o “Balada”

O nome é André Moreira Neles, mas o atacante se popularizou como André Balada. Segundo o ex-jogador, o apelido surgiu em um treino no Palmeiras no início dos anos 2000, quando um repórter da Record ouviu o volante Magrão o chamando de Balada. Rapidamente, a alcunha se espalhou e passou a ser usada nas transmissões.

“Ser chamado de Balada é algo que pegou. Na época do Palmeiras, eu ia muito para a noite, quase todos os dias. Só não ia em véspera de jogo porque concentrava. Aí o pessoal começou a me chamar. Pegou no Brasil todo e não teve como tirar. Fiquei conhecido até hoje. Muita gente pergunta na rua e ninguém sabe quem é o André. É André Balada”, disse.

“Até o Palmeiras, era só ascensão”

Aos 25 anos, André realizou o sonho de jogar com a camisa do Palmeiras ao ser emprestado pelo Benfica. “Fui sozinho para Portugal quando tinha 23 anos. Foi uma experiência muito boa, mas eu não joguei muito. Não consegui me adaptar ao estilo de jogo português. Fiz contrato com o Benfica de seis anos e joguei dois anos no clube. Nos outros anos, eu pedia para ser emprestado”, disse André.

A saída para o Palmeiras vinha com o sonho de jogar. Mas o objetivo não se concretizou. No Palestra Itália, amargou também a reserva e ganhou mais notoriedade pelo apelido do que pelos gols. Foram apenas sete jogos. Só balançou as redes uma vez. Na época, o time jogava a Série B do Brasileirão e ele disputava posição com Vágner Love.

“Até eu chegar ao Palmeiras, era só ascensão. Foi um divisor negativo de águas. Depois, eu comecei a cair”.

Se eu tivesse optado por outro clube, teria jogado mais e mostrado o meu futebol. Poderia ter sido diferente.”

Drogas surgiram no momento de baixa

Vulnerável com a reserva no Palmeiras, André não conseguiu suportar a pressão e acabou seduzido pelas drogas e pelas noites paulistanas. Nunca mais conseguiu recuperar o bom futebol.

“Foi o momento mais crítico da minha vida toda. Não só no profissional, mas também no lado pessoal. Porque eu bebia, eu fumava e eu cheirava pra tentar suprir aquele vazio. E o que era esse vazio? Jogar futebol. Era a única coisa que eu sabia fazer na vida. Eu não jogava futebol por dinheiro”, disse.

Venho daquela geração que jogava descalço na rua. O meu pai me deu uma bola e falou: ‘vai se divertir. Se você vier a ser jogador, tudo bem. Se não vier, também não tem problema, não’. Não tinha essa pressão, entendeu? Eu não fazia por dinheiro. Fazia porque eu gostava de jogar bola 

André Neles

André Balada elege um vilão

Embora tenha enfrentado uma série de problemas extracampo, o ex-jogador aponta mais um culpado por seu fracasso no clube do Palestra Itália: o técnico Jair Picerni. André acusa o treinador de esquecê-lo no banco de reservas e relembra que foi escalado apenas uma vez como titular. Foi diante do Vila Nova, após pressão dos líderes do grupo, como o goleiro Marcos. Ele acabou substituído no intervalo por Thiago Gentil.

Picerni se defende: “É André o quê? Balada. A resposta está aí no nome dele. André Balada… Se ele tiver que falar mal, tem que falar dele, da vida dele. Não da minha. Ele nem me conhece. Quem se atrapalhou foi ele mesmo. Se ele não jogou é porque não era qualificado para jogar no Palmeiras. Nada pessoal, é profissional. Eu vou atrapalhar? Pergunta para o resto do grupo que estava na época. Se eu vejo hoje na minha frente nem conheço o cara. Dá um toque para ele não falar mais no meu nome”.

Após a conquista da Série B pelo Palmeiras, o atacante, que pertencia ao Benfica, decidiu que não valia a pena seguir no clube do Palestra Itália e foi tentar a sorte de novo em Portugal. Em 2004, defendeu o modesto Marítimo.

“Fui para o Marítimo e tentei me adaptar a um novo clube. Achei que era como o Benfica, mas não é a mesma cultura. Eu não consegui jogar em Portugal”, lamentou. O atacante se transformou em andarilho e acertou sua volta ao Brasil.

O meu problema não foi com o Palmeiras. Quem atrapalhou a minha carreira não foi o clube, foi o treinador. Porque o presidente (Mustafá Contursi), o diretor que me contratou e a comissão técnica confiavam em mim. O problema era o Jair Picerni. E ele falou: ‘não vai jogar comigo’

André Neles, sobre Jair Picerni

Como titular eu joguei uma partida contra o Vila Nova e ele me tirou no intervalo. Fizeram uma pressão pra ele me colocar e, mesmo com a pressão do Marcão, não teve jeito. Quando o treinador não quer, não adianta. Ele te põe e te tira no primeiro tempo pra te queimar mais ainda

André Neles, sobre Jair Picerni

Arte/UOL

“Fui embora pra casa com um revólver, doidão”

Em um dos momentos em que estava mais perdido no Palmeiras, André comprou até uma arma. Para se defender do quê? Nem ele se recorda.

“Eu não sei o que deu na cabeça. Eu fui lá num lugar comprar droga e o cara falou: ‘Ó, eu tenho um revólver pra vender aqui. Quer comprar?’ Aí eu falei: ‘Me dá aí’, Eu peguei o revólver, dei 500 contos, entrei no carro e nunca mais vi o cara. Até hoje nem sei quem é o cara. Fui embora pra casa com o revólver, doidão. Eu não sabia o que eu estava fazendo. Somente no outro dia é que eu fui me ligar que eu tinha comprado um revólver. Eu nem sabia de nada. Nem mexer em revólver. Claro que eu credito isso às drogas.”

Goleiro levou André Balada “na marra” para a igreja

Depois de uma passagem rápida pelo Marítimo e um retorno relâmpago ao Atlético-MG, André foi tentar a sorte no Figueirense em 2004. O começo teve os mesmos problemas do Palmeiras. “Nessa fase, eu tinha um monte de mulheres, mas, graças a Deus, não fiz mais filhos. Essa fase do Figueirense foi a pior porque eu já estava à beira da morte, na verdade. Eu já andava armado, já andava na favela, frequentava casa de traficante, vivia só doidão. E não jogava. Foram os piores momentos da minha existência”.

A mudança pessoal começou a ocorrer após a ajuda de um colega de Figueirense. O goleiro Gustavo (na foto ao lado, com André) decidiu que era o momento de André dar um basta na “vida loka” fora dos campos. Depois de muita insistência, conseguiu convencer o centroavante a conhecer a sua igreja.

“O Gustavo falou: ‘André, vamos na igreja comigo? Aí eu falei não: ‘Não vou, eu não gosto de crente, não. Não vou mexer com isso, não. Igreja, não’. E eu corri do Gustavo umas quatro, cinco vezes. Eu não queria ir para a igreja de jeito nenhum. Até que um dia o Gustavo falou: ‘Hoje você vai para a igreja comigo’. E eu falei: ‘então, vamos para a igreja'”.

“É onde começa a minha verdadeira história. Eu fui para a igreja e, chegando lá, o pastor falou: ‘Você aí’. Ele nunca tinha me visto na vida. Eu nunca tinha ido para a igreja. Ele continuou: ‘Vem pra frente que eu quero fazer uma oração pra você’. E o pastor colocou a mão na minha cabeça e, na hora que ele botou a mão na minha cabeça, eu caí no chão. Eu não vi mais nada e comecei a chorar. Parecia que tinha um negócio entrando no meu coração, me limpando, me purificando. E eu chorando, chorando. Mas era um choro de alegria, um choro de esperança, um choro de renovação”.

André Balada ainda teve um período de transição antes de ser batizado, em 2006, na Igreja Evangélica Quadrangular, de Uberlândia. Atualmente, o ex-jogador frequenta a Igreja Advec, em Natal, ligada à Assembleia de Deus, liderada pelo pastor Silas Malafaia.

Fonte: UOL
Créditos: UOL