Imagino que assim como eu, uma mulher considerada de meia idade (como se a vida pudesse ser dividida por essas frações de tempo), o que você provavelmente aprendeu sobre sexo foi fora dos ambientes tidos como convencionais: o familiar, o escolar e até mesmo o religioso.
Lembro até hoje do “curso de casais” que fiz com meu até então futuro marido. Foi ministrado por uma freira que nos ensinava coisas como métodos de contracepção natural. Este era o nome que ela dava para um já velho conhecido meu: o coito interrompido.
Obviamente que não manifestei tamanha intimidade com o assunto para não desapontar a simpática freira nas suas explicações técnicas. E eu, que naquela época era uma recém-formada jornalista, fui ouvindo atentamente a senhora me ensinar sobre algo que ela nunca viveu (nem tampouco viverá, amém!).
Olhando um pouco mais para trás, voltando aos meus tempos de colégio, não me recordo de ter sido preparada para entender o sexo em todas as suas esferas e nuances que ao longo dos anos fui aprendendo na prática literal, na pele e no suor nosso de cada coito (nunca interrompido!).
Tudo isso me faz pensar que para a minha geração, tida como X (dos nascidos entre meados da década de 60 e final da década de 70), o sexo ensinado de forma convencional serviu pouco ou quase nada para que vivêssemos e entendêssemos no tempo presente o que podemos chamar de relações menos rotuladas ou atreladas a padrões geracionais.
Estamos preparados para entender?
E se o nosso olhar no passado não nos trouxe para o presente, como poderemos nos preparar para compreender, experimentar e viver num mundo onde não somente as relações sexuais, mas toda e qualquer conexão com o outro, nos exige uma capacidade de compreensão que não fomos preparados para ter?
Sou uma pessoa de meia idade, mas arrisco a dizer que fujo dos padrões mentais da minha geração, cujos valores morais muitas vezes não aceitam a subversão da ordem, a disrupção e a quebra do paradigma de que não existe certo e errado quando se trata de relações que envolvem pessoas e suas pluralidades.
Certa vez eu estava numa lanchonete (nessas de ambiente bem “familiar”) quando entrou um casal acompanhado de um filho pré-adolescente. Numa das mesas havia um grupo misto de meninas e meninos, um pouco mais adolescentes do que aquele garoto que entrava acompanhado dos pais.
Mas eis que, de repente, dois garotos desse grupo (menino e menino) começam a fazer carinho um no outro e tascam-se um beijo, ignorando todo e qualquer pudor que (talvez) fosse esperado para o local. Numa demonstração explícita de que pouco se importavam com o que os presentes no recinto fossem pensar a respeito.
Mas não pude deixar de perceber o constrangimento daquele casal, que até então apenas esperava por uma mesa para se sentar. Foi como se eu pudesse ler na cara deles a pergunta: “E agora, será que teremos que falar sobre isso com nosso filho?”
Mas ao contrário do que era esperado (por mim, é claro!), eles preferiram sair dali para que o filho saboreasse seu sanduíche de forma mais palatável, numa outra lanchonete ao lado. Melhor deixar o engodo para os demais presentes no recinto a permitir que o filho engolisse aquela “cena forte”.
Lamento informar que o mundo mudou
A meu ver essa foi uma maneira, nada indigesta, que o mundo escolheu para nos mostrar que a nossa sociedade não engole, nem tampouco digere, as mudanças que lhe fogem aos padrões morais que nos foram impostos (impostos por quem mesmo?).
Mas lamento informar, seja você de qualquer geração, que o mundo mudou, ainda que isso seja um chavão. Aqui nesse ambiente, cujo olhar nos projeta para o futuro, desprovido de valores arraigados e julgamentos ultrapassados, pretendo fazer com que você reflita sobre isso.
Não somente para entender o que o futuro do sexo nos reserva, mas como podemos, por meio do passado e do presente, desenvolver um olhar mais empático para o outro quando se trata de relações de amor, cumplicidade e sexo.
É preciso desbravar e explorar o universo de histórias de pessoas que buscam, no tempo presente, relações mais livres, mais fluidas e desprovidas de preconceitos que, infelizmente, ainda são passados de geração para geração.
O futuro do sexo é algo que já está aí, acontecendo lá fora enquanto vivemos no presente aprisionando nossas mentes ou protegendo nossos olhares do que pode nos parecer ser o fim dos tempos. Mas isso não quer dizer que pretendo antecipar o futuro, apenas peço que se libertem no agora e no presente, e verão que o mundo não está por acabar simplesmente porque jovens do mesmo sexo resolveram saborear um sanduíche enquanto demonstravam através de seus beijos (nada obscenos, diga-se) que os tempos mudaram.
Se eu tivesse a chance de encontrar novamente aquele casal, que supostamente escolheu proteger o filho, apenas diria: simplesmente aceitem, dói menos.
Mas será que estamos preparados para absorver as mudanças que estão em curso? E ainda pensar nas que estão por vir? Sim, meu caro leitor: afinal, o que muitos pensam ser o futuro é, na verdade, o presente. Assim como era naquele exato dia em que a freira tentava me ensinar a transar.
Fonte: Revista hysteria
Créditos: Delza Carvalho