Diante da perspectiva de recrudescimento da violência no campo e de uma repressão bem mais pesada por parte do governo de Jair Bolsonaro, movimentos sociais de luta pela reforma agrária traçaram, como estratégia de enfrentamento, o que chamam de “ações em massa”. A ideia é promover ocupações de terras públicas com um volume expressivo de pessoas.
“Não faremos mais ocupações com 20 ou 30 famílias. Teremos uma resistência ativa com 500 a 600 famílias, no mínimo”, prometeu o coordenador nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Alexandre Conceição.
A decisão foi tomada após reuniões com outros movimentos camponeses, reunidos na Via Campesina, e diálogos ocorridos na última semana com o Comitê Lula Livre e a Consulta Popular. Esses e outros grupos compõem a articulação Frente Brasil Popular, que atuará em firme oposição contra o governo de Jair Bolsonaro.
Pelas contas do MST, cerca de 120 mil famílias ainda aguardam para serem assentadas no Brasil pela reforma agrária. No entanto, na avaliação do setor, a perspectiva é que essa política permaneça “congelada” pelo governo, ou até mesmo, deixe de existir.
Concentração
Outro cálculo considerado pelos sem-terra é o volume de áreas sob domínio cartorial do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), que hoje soma mais de 88 milhões de hectares. Esse número corresponde a cerca de 10% do território nacional. A preocupação do movimento é com a intenção do próximo governo de titularizar essas terras e, com isso, favorecer a concentração.
Diferentemente da política de assentamento, titularização significa a distribuição dos títulos sem, no entanto, entrar com os benefícios do Programa de Apoio a Assentamentos (PAA). “Desta forma, o governo concede o título, e o produtor rural tem que buscar financiamentos no mercado. Isso favorece a concentração de terras porque, sem condições de pagar juros, ele acaba vendendo a área para os grandes”, observou Conceição.
Essa prática já vigorou durante o governo de Dilma Rousseff, criticada pelos movimentos por ter estancado a distribuição de áreas. Na época, o governo alegava que era necessário criar “segurança jurídica” no campo. “Dilma congelou a reforma e com Temer já tivemos o aumento da violência”, observou.
“À bala”
A campanha eleitoral deu o tom do tratamento previsto no governo Bolsonaro para os sem-terra. No primeiro turno, o então candidato do PSL, ao defender sua bandeira em favor das armas, orientou em comícios que “sem-terra que ocupar fazendas deve ser recebido à bala”.
Agora presidente eleito, Bolsonaro anunciou como futura ministra da Agricultura a deputada ruralista Teresa Cristina, que recebeu o cargo prometendo atender aos pedidos de trazer o Incra, hoje vinculado à Presidência, para a sua pasta. Da mesma forma, o Ministério da Agricultura abarcaria a Secretaria da Pesca e Aquicultura e de agricultura familiar.
Nesta semana, o pecuarista Nabhan Garcia foi escolhido para a Secretaria Especial de Assuntos Fundiários do próximo governo. Segundo ele, a estrutura terá status de ministério e trabalhará em consonância com a Presidência da República e o Ministério da Agricultura, que será chefiado pela deputada Tereza Cristina.
Ao receber o convite, ele disse que sua prioridade no órgão será fomentar a agricultura familiar e dar condições para que o assentado rural consiga produzir. Já em relação às invasões de terra, Nabhan é enfático:
“Movimento que invade é ilegal”, disse o pecuarista que garantiu diálogo com os sem-terra.
Terrorismo
Além de prever um comportamento hostil do governo, os movimentos se preocupam ainda com o avanço da pauta ruralista no próximo Congresso. Um dos pontos mais importantes refere-se à proposta que modifica a Lei Antiterrorismo, em debate na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado.
Trata-se do PLS nº 272/2016, do senador Lasier Martins (PSD-RS). Atualmente, o relator do projeto é o senador Magno Malta (PR-ES), derrotado nas últimas eleições.
Pela emenda apresentada pelo senador, o conceito de terrorismo é ampliado para considerar também a “motivação política, ideológica ou social”. Com isso, estariam enquadrados como atos de terrorismo as ocupações de terra e ações de movimentos estudantis que ocupem uma reitoria, por exemplo.
Fonte: Metropoles
Créditos: Metropoles