Nesta quarta-feira (14), o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vai deixar a Superintendência da PF (Polícia Federal) em Curitiba pela primeira vez em 222 dias. Preso desde 7 de abril, o petista será levado, em um trajeto de cerca de cinco quilômetros, até a sede da Justiça Federal na capital paranaense, onde será interrogado como réu pela juíza federal substituta Gabriela Hardt no processo do sítio de Atibaia (SP).
No processo do sítio, Lula é réu por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. O ex-presidente é acusado de ter recebido propina na forma de quase R$ 1 milhão em reformas pagas pela Odebrecht, OAS e pelo pecuarista José Carlos Bumlai na propriedade. Segundo o MPF (Ministério Público Federal), o dinheiro veio do esquema de corrupção na Petrobras. O MPF também acusa Lula de ter atuado para beneficiar a Odebrecht e a OAS em contratos com a estatal.
Ao marcar o interrogatório, o juiz federal Sergio Moro, que era o titular da ação na época, já havia solicitado à Polícia Federal “as providências necessárias para a realização de escolta” dos presos. Foi o que aconteceu na última sexta-feira (9), quando o ex-presidente da OAS Léo Pinheiro e o ex-diretor da mesma empreiteira Agenor Franklin de Magalhães Medeiros foram levados da PF, onde também estão presos, para prestar esclarecimentos à juíza.
Por razões de segurança, a PF não dá detalhes sobre como será feito o transporte de Lula, que cumpre pena de 12 anos e um mês de prisão pelo processo do tríplex de Guarujá (SP). A PM (Polícia Militar) do Paraná fará a escolta do veículo com Lula durante o trajeto, além de interditar o trânsito na região da Justiça Federal durante o interrogatório.
A primeira saída de Lula após sete meses deve voltar a movimentar o bairro de Santa Cândida, onde está localizada a Superintendência. À época da prisão, a Prefeitura de Curitiba e moradores da região chegaram a pedir formalmente a transferência do ex-presidente para outro local. A juíza federal Carolina Lebbos, responsável pela execução da pena de Lula, ainda não tomou uma decisão a respeito. Esse processo está parado desde maio.
Movimentação menor
A movimentação em torno da audiência desta quarta, porém, não chega nem perto das registradas nos dois primeiros interrogatórios de Lula, realizados em maio e setembro do ano passado. Nas duas ocasiões, o esquema de segurança para a região da Justiça Federal era conhecido com cerca de uma semana de antecedência. No primeiro depoimento, moradores chegaram a ter de se cadastrar junto à PM para acessar suas residências no entorno do prédio da Justiça.
Desta vez, poucos moradores e frequentadores da região da Justiça Federal têm demonstrado saber que o ex-presidente será interrogado mais uma vez. “Muita gente nem está sabendo dessa vez. Tem quem ache que vai ser semana que vem”, disse a vendedora de uma loja que teve de fechar as portas em setembro do ano passado. Nesta quarta, a loja funcionará normalmente, assim como outros pontos comerciais consultados pela reportagem.
O próprio esquema de segurança é menor. No interrogatório de maio de 2017, cerca de 1,7 mil agentes foram destacados pela corporação para garantir a segurança no local. Quatro meses depois, foram mobilizados cerca de 1,5 mil agentes. Para esta quarta, a PM só diz que “contará com efetivo suficiente para atender a comunidade e os órgãos constituídos durante os trabalhos”. A reportagem verificou que veículos da PM só chegaram à região da Justiça Federal no começo da tarde de terça-feira (13)
Os dias anteriores e posteriores aos primeiros interrogatórios também eram marcados por atos promovidos pelo PT e seus aliados em favor de Lula. O próprio ex-presidente chegava a discursar, após as audiências, em uma praça no centro da capital paranaense. Desta vez, nada do mesmo porte está previsto.
A previsão é de que poucas lideranças petistas estejam em Curitiba. Há certeza apenas a respeito da presença da presidente do partido, senadora Gleisi Hoffmann, e do líder do PT na Câmara, deputado federal Paulo Pimenta.
Antes de ser levado para a Justiça Federal, Lula deverá receber a visita do candidato derrotado do PT a presidente, Fernando Haddad, que também é um de seus advogados. Haddad, porém, não participará da audiência do interrogatório, onde Cristiano Zanin Martins liderará a defesa do ex-presidente. Outra diferença em relação ao ano passado é que Zanin, ao contrário dos dois primeiros depoimentos de Lula, não tem previsão de conceder uma entrevista à imprensa após a audiência.
Na última segunda-feira (12), após reuniões com o grupo do comitê “Lula Livre” em Curitiba, Gleisi convocou apoiadores do ex-presidente a fazerem concentração nesta quarta em frente à PF e ao prédio da Justiça Federal. “Nós precisamos ter muita gente aqui”, disse a senadora. “Temos que resistir, contar a verdade para o povo. Nós queremos tirar o Lula dali”.
Local e dinâmica
O interrogatório, como nas vezes anteriores, será realizado na sala de audiências 2, localizada no segundo andar do prédio da Justiça Federal, a alguns passos do gabinete da 13ª Vara Federal, onde atua a juíza Gabriela Hardt. Além de Lula, será ouvido o pecuarista José Carlos Bumlai, amigo do petista que, segundo a acusação, teria ligação com obras no sítio de Atibaia.
Na sala, cabem cerca de 30 pessoas. Além da magistrada, de um assistente de audiência e do ex-presidente, poderão participar advogados dos outros 12 réus, um representante da defesa da Petrobras e membros da força-tarefa da Operação Lava Jato. Devem estar presentes na audiência os procuradores Athayde Ribeiro Costa e Jerusa Burmann Viecilli. Desta vez, a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) não deve ter representante na audiência, já que não houve solicitação por parte de nenhum dos réus até o momento.
Nos interrogatórios dos outros processos, Moro proibiu a entrada de celulares na audiência. Não se sabe se a juíza substituta fará o mesmo nesta quarta. Nas audiências anteriores do caso do sítio, ela permitiu. “Mas o sinal lá, quando existente, é horrível”, comentou um dos advogados consultados pelo UOL.
Outra mudança é em relação à quantidade de câmeras. Nos primeiros interrogatórios de Lula, estavam instaladas duas, a pedido da defesa do petista, que se incomodava com o fato de a gravação focalizar apenas o réu. Desta vez, a câmera adicional não está prevista, segundo fontes.
A juíza será a primeira a fazer questionamentos a Lula. Depois, perguntam os procuradores da Lava Jato e os representantes da defesa da Petrobras. Na sequência, os advogados dos réus podem questionar Lula. Os advogados do petista, se quiserem, serão os últimos a perguntar. A magistrada pode voltar a questionar o ex-presidente a qualquer momento. No final do interrogatório, Hardt abrirá espaço para que Lula faça suas últimas considerações.
Não há um limite de tempo para a audiência. A primeira, de maio, durou cerca de cinco horas. Em setembro, com Lula já condenado pelo processo do tríplex, mas ainda em liberdade, o interrogatório durou cerca de duas horas.
Segunda aparição pública desde a prisão
Desde que foi preso, Lula só teve uma aparição pública, em 5 de junho, em depoimento via teleconferência como testemunha de defesa do ex-governador Sergio Cabral (MDB). A oitiva, tomada pelo juiz Marcelo Bretas, foi marcada por piadas e uma revelação do magistrado, que contou ter ido a um comício do petista em 1989.
O interrogatório desta quarta seria o primeiro encontro entre Lula e Moro desde que o petista foi preso por decisão do juiz, mas o magistrado deixou os processos da Lava Jato este mês após ter aceitado o convite do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), para ser ministro da Justiça. Assim, Lula vai depor pela primeira vez a Gabriela Hardt, substituta de Moro.
Fonte: UOL
Créditos: UOL