O ex-presidente dos Estados Unidos Bill Clinton (1993-2001) advertiu nesta sexta-feira (21) os brasileiros do risco de tomar decisões orientados pela raiva e pelo ódio, às vésperas de uma das eleições presidenciais mais polarizadas da história.
“Não tente tomar uma decisão quando você está nervoso, você nunca toma decisões acertadas”, disse Clinton a uma plateia de investidores em palestra no evento Expert2018 da XP Investimentos ao lado do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2002).
“Em um país como este, quando há raiva, ressentimento, não há boas decisões. Também penso isso a respeito dos Estados Unidos, mas acredito que vamos voltar a fazer as coisas todos juntos (pessoas de partidos diferentes)”, disse Clinton, cuja mulher, Hillary, foi derrotada pelo republicano Donald Trump nas eleições de 2016.
De acordo com o democrata, as pessoas deveriam se perguntar neste momento: “Como eu quero que o Brasil esteja quando meus filhos chegarem à minha idade? Que decisões devo tomar pra que isso aconteça? O presidente [russo, Vladimir] Putin diria que somos antiquados, mas nós acreditamos que a democracia é a melhor maneira de chegar lá, embora seja lenta e às vezes os fatos não nos ajudem”, afirmou.
Segundo Clinton, é preciso entender exatamente o que causou o que chama de “enigma do Brexit global” —alusão a decisão dos britânicos de deixar a União Europeia em uma votação guiada por propaganda populista— e resolver esses problemas.
“Essa sensação de parte dos americanos de que não foram tratados de forma justa, economicamente, e que se sentem socialmente deslocados” é combustível para a sensação de revolta que imperou no país e teria resultado na eleição de Trump, embora ele não tenha citado nominalmente ao atual presidente.
Clinton afirmou que o boom econômico dos EUA na última década não beneficiou a todos, quase 40% dos americanos têm dificuldades para pagar suas contas, e isso gera revolta. “Posso dizer que isso ocorreu no Brasil também.”
Fernando Henrique afirmou que, no Brasil, este mal-estar é muito sensível. “É necessário combater essa insurgência com princípios democráticos, há décadas eu não via tanto ódio no Brasil.”
O brasileiro disse que os escândalos de corrupção afetaram o conjunto do sistema político, criando uma malaise e uma crise da democracia representativa, como na Europa e em outros lugares.
Mas alertou que, para resolvê-la, é necessário achar alguém com plano de governo e ideias concretas, e não que apenas critique o passado.
Um das estratégias do PSDB é criticar a suposta falta de planos de governo concretos do líder nas pesquisas, Jair Bolsonaro (PSL).
Ele também enfatizou a necessidade de se lutar por valores democráticos. “A democracia é um valor essencial : eu vivi na ditadura (militar), quem viveu a ditadura sabe que democracia é um valor que não se pode abandonar e vale a pena lutar por isso.”
Clinton, falando sobre redes sociais, disse que hoje, nos EUA, “uma grande mentira funciona melhor do que a verdade, e as pessoas não veem a diferença”.
“Mas todas as tecnologias podem ser usadas de forma errada, carros matam pessoas, então não é por isso que vamos sair da internet e preferir conexões lentas.”
Indagado sobre o que esperar das eleições legislativas em seu país, afirmou: “Se meu partido ganhar maioria no Congresso, vai ser bom”.
A respeito da relação entre China e EUA, que azedou ainda mais com a imposição de tarifas sobre mais US$ 200 bilhões em exportações chinesas por Trump, Clinton afirmou esperar que “tudo seja temporário”.
“Não acho errado rever relações comerciais, mas os EUA não podem se dizerem prejudicados por todos os países. Já nos beneficiamos muito do comércio”.
O líder americano encerrou sua fala com conselhos para os brasileiros. “No Brasil, a corrupção é um problema? Sim, claro, mas vocês têm capacidade para lidar com isso”, afirmou. “Há um bura;co no teto, não vamos ficar desesperados com isso, vamos consertar o buraco no teto.”
E completou “O que eu sei é que nenhum lugar do mundo tem uma população tão energética, diversa, e com tantos recursos naturais como o Brasil; não desistam de seu país.”
Fonte: Folha de S. Paulo
Créditos: Folha de S. Paulo