A Escola de Equitação da Hípica de Brasília divulgou novas imagens da atividade em que um cavalo foi pintado e rabiscado por crianças, na última semana. O vídeo (veja acima), segundo a instituição, mostra a tranquilidade do animal e a “aproximação lúdica” das crianças.
O caso se espalhou pelas redes sociais durante o fim de semana, com uma foto que mostrava o cavalo Thor tingido de múltiplas cores. Na imagem, é possível ver que as tintas se espalharam pelo dorso, pelas patas e pelo focinho do animal.
No texto enviado ao G1, a Hípica classifica a repercussão do caso como uma “injusta polêmica” e diz que a atividade foi idealizada com uma pedagoga parceira e um veterinário, usando tinta atóxica a base d’água.
“Essa atividade […] produz efeitos positivos, pois as crianças se aproximam de forma mais natural do cavalo, e as que estão receosas perdem o medo”, diz o comunicado.
“Repudiamos qualquer tipo de maus-tratos ou exploração de nossos cavalos e éguas.”
Ainda de acordo com a Hípica, a colônia de férias da escola acontece há quatro anos, aberta a crianças e adolescentes de 3 a 14 anos. Os cavalos que participam das atividades são “do nível infantil, ou seja, de comportamento absolutamente dócil e previsível”.
A instituição também repete, no comunicado, que além da pintura, as crianças são estimuladas a passear com os animais, alimentá-los com ração e feno, escovar o pelo, dar banho e acariciá-los.
“Informamos também que a Escola já recebeu, após a injusta polêmica instalada, visita dos órgãos competentes – que atestaram in loco os bons-tratos de todos os nossos animais – e está prestando todas as informações necessárias para esclarecer o caso.”
Pedagogia questionada
Nas redes sociais, usuários questionaram o “caráter pedagógico” da atividade, e levantaram a possibilidade de que a atividade desse um mau exemplo às crianças. Nos posicionamentos emitidos em resposta, a escola de equitação refutou a ideia.
Para dirimir a dúvida, o G1 conversou com a psicopedagoga e especialista em autismo Jeana Oliveira. Segundo ela, a interação entre crianças e animais é positiva, mas o uso das tintas, possivelmente, não seria necessário ou recomendado.
“A interação com o animal é algo importante, prazeroso. Você começa a estabelecer vínculo, respeito aos seres vivos. O problema é usar o animal como um ‘recurso’ de pintura. Essa associação pode, sim, trazer prejuízo”, pontua.
Segundo Jeana, é possível, sim, que as crianças encarem a atividade como algo rotineiro, passível de ser reproduzido com outros bichos no dia a dia. Até os 4 ou 5 anos, a criança tende a “generalizar os estímulos” – ou seja, usar cada aprendizado como uma regra geral.
“A criança ainda não consegue compreender. Com o cavalo branquinho eu posso, mas por que não posso passar um dedo de tinta no meu gato marrom?”
Esse entendimento é construído no fim da primeira infância. Por isso, segundo a psicopedagoga, uma orientação incompleta poderia expor os participantes da colônia de férias a risco – mesmo que isso aconteça fora dos limites da escola.
Jeana explicou ao G1 que, nessa idade, tanto o estímulo da pintura quanto o estímulo de convívio com o animal são importantes, mas a associação entre os dois não é comum.
“É até meio contraditório. Eu ensino a escrever no animal, e depois ensino a lavar o animal? Como se a primeira ação fosse algo errado? A gente limpa coisas que outra pessoa vai usar, o animal não é esse tipo de acessório. A gente não ensina a bater pra ensinar a pedir desculpas”, diz a psicopedagoga.
Os riscos, segundo Jeana, não se aplicam apenas às crianças mais novinhas. Até os 11 anos, por exemplo, um outro conceito em formação é o de “reversibilidade”. O termo se refere à habilidade de discriminar os objetos similares e diferentes.
“Antes disso, a criança não sabe diferenciar dentro de uma categoria. Não sabe que um dedo de tinta é suave, mas um lápis de cor é mais pontiagudo. Que uma tinta sai, mas a outra não, por exemplo. Isso só vem lá pros 10, 11 anos.”
Maus tratos?
Na tarde de segunda, a Hípica de Brasília também enviou à imprensa um laudo assinado pelo veterinário Elisaldenir Carrara. O documento, com data do último domingo (22), afirma que o cavalo Thor não tem “sinais de doenças infectocontagiosas”, e está em “bom estado de higidez [saúde]”.
No mesmo fim de semana, fiscais do Instituto Brasília Ambiental (Ibram) e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) foram à escola. Segundo o Ibram, a análise também não identificou maus tratos.
A Hípica foi notificada pelo Ibama, mas não autuada. O plano pedagógico que justificou a iniciativa será avaliado antes de o órgão tomar uma decisão. A escola também terá de apresentar um laudo veterinário para atestar as condições de saúde dos animais usados. A resposta deve sair em até cinco dias.
Fonte: UOL
Créditos: UOL