Pelo menos em quatro deles o país gastou, desde o primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), R$ 173 bilhões sem que os objetivos fossem alcançados.
O valor acumulado com esses gastos equivale a mais do que o déficit primário do país que, no ano passado, foi de R$ 124 bilhões e está em franca ascensão com a tramitação no Congresso de projetos que podem elevar as despesas em R$ 68 bilhões em 2019 sem receitas para compensá-los.
O Ipea é vinculado ao Ministério do Planejamento. É a primeira vez que um órgão faz um estudo para avaliar a efetividade de uma despesa.
Há quase uma década, o TCU (Tribunal de Contas da União) recomenda que os ministérios avaliem o desempenho dos programas, especialmente dos benefícios concedidos via fundos setoriais —que não entram no Orçamento.
“Diante de um quadro de aperto fiscal, o Brasil não pode mais fazer gastos sem levar em conta o retorno”, diz Alexandre Iwata de Carvalho, diretor de Estudos e Políticas Regionais, Urbanas e Ambientais do Ipea.
“A avaliação do efeito dos subsídios precisa estar bastante clara, com uma análise da sustentabilidade dos benefícios”, afirma o secretário da Receita Federal, Jorge Rachid. “Vai trazer benefício de renda, emprego ou vai virar margem para o empresário?”
O trabalho será publicado em livro em agosto.
No levantamento feito para a Folha foram considerados o PSI (Programa de Sustentação do Investimento), o Profrota Pesqueira, a desoneração da folha de pagamento e o Prouca (Programa um Computador por Aluno) porque os demais, na avaliação do Ipea, surtiram algum resultado.
Dentre esses outros programas estão o seguro e o crédito rural e o Plano Nacional de Banda Larga.
Segundo os pesquisadores, o Profrota Pesqueira, que alocou recursos do Fundo da Marinha Mercante a partir de 2004, consumiu cerca de R$ 1 bilhão por ano para linhas de financiamento sem que houvesse renovação de frota.
Ou seja: os recursos foram usados para outras finalidades. Para chegar a essa conclusão, os pesquisadores checaram dados disponíveis até 2015, principalmente em regiões que, de acordo com a Rais (Relação Anual de Informações Sociais), são fortes em atividade pesqueira.
“A frota não foi renovada e, pior, o programa parece ter influenciado o engajamento em outras atividades [que não a pesca]”, afirma Adolfo Sachsida, técnico de planejamento e pesquisa do Ipea.
Procurado para comentar o estudo, o Ministério dos Transportes, que herdou o programa do extinto Ministério da Pesca, disse que o teto para o Profrota Pesqueira, estabelecido em lei, é de R$ 300 milhões por ano, e o Fundo da Marinha Mercante pode contribuir com R$ 140 milhões desse limite máximo.
Conhecido como bolsa-empresário, o PSI foi um dos principais programas de Lula.
Lançado em 2009, tentava tirar a economia do buraco após a crise de 2008 financiando máquinas, equipamentos, caminhões, ônibus e máquinas agrícolas.
Suas taxas de juros chegaram a ser menores do que as linhas com juros mais baixos do BNDES.
Foi encerrado em 2016, após consumir R$ 54,5 bilhões apenas com equalizações de financiamentos.
Isso porque, para bancar o programa, o Tesouro emitiu títulos pagando juros mais elevados do que as taxas cobradas pelo BNDES dos tomadores do programa.
Segundo os pesquisadores, o PSI não gerou emprego e só serviu para alguns setores, especialmente grandes empresas, que tinham condições de tomar crédito no mercado.
Para chegar a essa conclusão, criaram um modelo econômico batizado de sintético, em que simularam a economia de um país com dados de países parecidos com o Brasil e que não dispuseram de um programa similar.
Na gestão de Dilma Rousseff (PT), o governo ficou sem pagar a equalização dos juros do PSI ao BNDES por praticamente quatro anos —atraso conhecido como pedalada.
O banco implementou uma política de governo com capital próprio, o que é proibido. Isso contribuiu com o processo de impeachment.
Victor Pina, chefe do Departamento de Avaliação do BNDES, lembra que o programa fez parte de uma política anticíclica de governo, ou seja, não nasceu no banco.
Para ele, o PSI cumpriu seu objetivo no começo.
“O programa teve capacidade de alavancar investimentos no início. Mas reconhecemos que essa capacidade foi sendo reduzida ao longo do tempo.”
Pina afirma que o programa não beneficiou somente as grandes empresas. “Mais de 50% dos desempenhos foram para pequenas e médias.”
Outra medida de estímulo à economia, a desoneração da folha de pagamento, consumiu R$ 106,5 bilhões e, segundo o Ipea, não gerou emprego, como pretendia o governo quando lançou a medida.
“Esses programas deveriam ter prazo determinado”, afirma Rachid. “A cada período, isso deve ser reavaliado. Vale a pena? É renovado.”
Para elevar as notas dos alunos da rede pública, foi lançado, em 2010, o Prouca (Programa um Computador por Aluno).
Segundo dados do Ministério da Fazenda, foram gastos R$ 43 milhões na compra de notebooks. Mas muitas escolas nem sequer tinham energia. Em outras, os equipamentos deixaram de funcionar por falta de manutenção.
“O resultado foi que os alunos não tiveram aproveitamento algum”, afirma Carvalho, diretor do Ipea.
Procurado pela reportagem, o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, do Ministério da Educação, afirmou que cuidou apenas da normatização e do suporte às questões financeiras do Prouca.
“A partir da implementação, a infraestrutura e a continuidade do programa nas escolas passaram a ser responsabilidade das secretarias estaduais de Educação.”
Embora também nunca tenha sido estudado pelo governo, o PNBL (Programa Nacional de Banda Larga), criado em 2010 por Lula para massificar a internet e, assim, ajudar na geração de renda das famílias, deu algum resultado, afirma o Ipea.
Dados do instituto mostram que o programa forçou as teles a levar a oferta de internet a mais de 5.300 localidades no país até 2016, quando foi tecnicamente encerrado.
“Nesse programa existiu efeito econômico”, diz Carvalho. “Verificamos que, em cidades que tiveram o acesso de internet dobrado pelo programa, o PIB per capita cresceu, em média, 1%.”
Fonte: Folha de S. Paulo
Créditos: Julio Wiziack e Maeli Prado