O discurso que não houve

Rubens Nóbrega

Modesto como é, o governador Ricardo Coutinho não deu tanta divulgação ao pronunciamento sobre causas e efeitos da seca que teria feito no recente encontro da presidente Dilma com os governadores nordestinos, em Sergipe. Mas foi uma peça, merecedora de elogio e reprise.

Segundo fonte da melhor qualidade, o homem abriu seu discurso com abalizadas e irrespondíveis críticas ao Governo Federal pelo atraso na transposição das águas do São Francisco e sua integração às bacias do Nordeste Setentrional. Salientou, inclusive, que se a obra estivesse pronta aquela reunião seria desnecessária.

Aproveitou e cobrou da presidente uma derivação do eixo norte da transposição à altura de Conceição, que na pior das hipóteses pode repor os 4 metros por segundo que o complexo Coremas/Mãe D’água (excluído da transposição) há muito libera diariamente para o Rio Grande do Norte.

Disse que o complemento criaria também amplas possibilidades de adução de parte da água do Vale do Piancó para a região de Princesa Isabel, atendendo dessa forma a toda a área da Serra de Teixeira, hoje uma das mais carentes em recursos hídricos do Estado.

Nosso governador frisou que com o reforço proposto um grande volume de águas hoje armazenado nos diversos reservatórios do Vale poderia ser liberado para irrigação, pois o abastecimento humano estaria garantido pelas águas franciscanas.

Apesar do aporte do Velho Chico, Ricardo argumentou que a Paraíba não pode abandonar outras formas de captação de água tão ou mais valiosas para o sertanejo, a exemplo das barragens subterrâneas atreladas a poços amazonas em propriedades privadas, mas de uso coletivo.
ATRAVÉS DO GRUPAMENTO
Com vistas a fortalecer alternativas como a que ele citou, Ricardo sugeriu à presidente que liberasse verbas para o Grupamento de Engenharia realizar um programa permanente de construção e manutenção de barragens subterrâneas, que protegem a água acumulada dos dois principais agentes da evaporação, os ventos e a insolação.

O governador fez a seguir menção às obras de adutoras que partindo do açude de Boqueirão, principal receptor das águas do São Francisco, seguirão em direção ao município de Montadas, que é o de cota mais elevada da região (713m), distando apenas 45 km de Boqueirão, para, daquele ponto, por gravidade, atender em caráter permanente, independente de secas, a todos os municípios do Brejo e Curimataú.

Garantiu que esse projeto de um super sistema adutor, uma vez aprovado e executado, será a maior obra do PAC na Paraíba e no Nordeste. Explicou que essas adutoras atenderão às comunidades rurais dispostas no percurso, promovendo uma verdadeira vascularização no abastecimento, tudo dentro do principal objetivo da obra como um todo que é o consumo humano.

Falando como verdadeiro mestre no assunto, o governador esclareceu que as reivindicações da Paraíba, se atendidas e materializadas, sepultarão para sempre o uso dos famigerados carros pipa. Nesse momento, foi aplaudido demorada e calorosamente por todos os presentes, inclusive a presidente.


VERTENTES LITORÂNEAS

Ricardo também reconheceu a necessidade de profundo reestudo do canal das vertentes litorâneas, sobretudo de sua validade ou não e, se necessário, a transformação do canal em um duto fechado, pois bem reconhece o elevado custo da manutenção de um canal com mais de 100 km de extensão e sua repercussão no preço final da água.

Dois argumentos foram usados pelo nosso governador no sentido de reestudar a validade do canal: primeiro, porque as águas do São Francisco no eixo em que a região está inserida têm prioridade para o consumo humano e não para a irrigação; segundo, que essas águas em breve serão necessárias para o abastecimento da própria capital do Estado. E não esqueceu de lembrar que o canal foi concebido no governo Maranhão.

Já quando se referiu aos Cariris, o governador fez rápida e eficiente explanação sobre outro grande problema do século que é a ameaça de vermos dizimada a lavoura da palma pela cochonilha do carmim, que já atingiu de forma irreversível 90% dos municípios da região. Observou ele que a palma é a principal base alimentar dos rebanhos da região (bovinos, caprinos ou ovinos), sustentáculo econômico de mais de 100 municípios, sobretudo na produção de leite.

Sobre o mesmo tema, o governador reivindicou do Governo Federal o apoio financeiro para execução de um projeto de recuperação da lavoura da palma através de um plano de financiamento de longo prazo, com seguro e assistência técnica exclusiva. Tudo isso em nome da importância dessa cultura para a economia paraibana. Ressaltou, fechando a sua fala, que a operação deverá ser realizada também em Pernambuco, igualmente afetado pela mesma praga.

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O discurso que Ricardo Coutinho não proferiu em Aracaju é obra de experiente técnico do nosso Estado. Apesar dos apelos do colunista para que explicitasse a autoria das idéias aqui expostas, ele prefere ter sua identidade preservada e doar anonimamente essa contribuição que o Governo do Estado bem poderia estudar e aproveitar.