Na contramão da corrida das escolas por usar cada vez mais computadores, tablets e celulares no ensino, a pedagogia Waldorf, que valoriza os trabalhos manuais, o movimento e o contato dos alunos com a natureza, se expande e acaba de inaugurar a sua primeira faculdade no Brasil.
Autorizada pelo Ministério da Educação no final de 2017, a Faculdade Rudolf Steiner iniciou as aulas em fevereiro e terá um evento para marcar a inauguração na próxima quinta-feira (19).
O curso é de pedagogia e soma ao ensino tradicional a metodologia Waldorf. Define-se, portanto, como uma faculdade Waldorf de pedagogia, e não como uma faculdade de pedagogia Waldorf. A grade curricular associa disciplinas como danças brasileiras, experiências poéticas e educação do corpo às regulares, exigidas pelo MEC.
Os graduados poderão dar aulas em qualquer escola. Essa é, aliás, a intenção do grupo que estruturou o curso.
“Será ótimo criar um diálogo com diferentes linhas educacionais. Temos o desejo de que a maioria dos professores aqui formados vá trabalhar em escolas que não são Waldorf, especialmente nas públicas”, afirma Melanie Mangels Guerra, 54, diretora da faculdade.
Para isso, a exigência de cargas horárias em estágios em escolas públicas será maior, seguida pelas particulares ditas convencionais e, por fim, pelas Waldorf.
Segundo ela, a metodologia pode levar a outras instituições ou nelas reforçar “uma visão mais ampla da criança”, em que o seu aprendizado e as suas ações estão diretamente associados às suas emoções.
Nesse contexto, o professor deve ter com o aluno uma relação de confiança, de forma que consiga, por exemplo, perceber suas dificuldades e o auxiliar a superá-las.
Nas escolas Waldorf, o mesmo professor costuma acompanhar a turma por um longo período, em algumas durante até oito anos. É preciso, para tanto, passar por uma formação específica, além da faculdade de pedagogia, com cursos de extensão ou de pós-graduação de duração média de três anos. Mesmo os formados na Rudolf Steiner terão de fazê-lo.
A nova faculdade fica em um terreno de 16.600 m², repleto de árvores, no Alto da Boa Vista, zona sul de SP.
Desde 1959, funciona no local a primeira escola Waldorf do Brasil, inaugurada três anos antes, em 1956, em um casarão de Higienópolis por imigrantes europeus.
Chama-se também Rudolf Steiner, nome do filósofo austríaco criador da antroposofia, que seria, em uma explicação simplificada, um método de conhecimento do ser humano como um todo, em aspectos físicos e emocionais.
A partir dessa ideia, em 1919, diante de uma Europa devastada pela Primeira Guerra, Steiner fundou uma escola para os filhos de trabalhadores de uma fábrica de cigarros, a Waldorf-Astoria, em Stuttgart, na Alemanha.
No Brasil, há atualmente 74 escolas autorizadas a usar a metodologia pela Federação de Escolas Waldorf, com 9.702 estudantes. Em torno de mais 130 estão no processo de certificação. Dentre as oficiais, o estado de São Paulo concentra a maior parte, 40. Há 20 anos, eram apenas nove.
O crescimento ocorreu justamente no período de avanço acelerado da tecnologia, quando os debates sobre as horas passadas por crianças e adolescentes diante da TV foram atropelados por uma realidade em que bebês não desgrudam da tela de celulares.
Contrária à tendência das escolas de trazer esses hábitos para as aulas, a pedagogia Waldorf trabalha com computadores somente no ensino médio e estimula os pais a controlar a exposição dos filhos às mídias digitais.
No fundamental, ao solicitar pesquisas, os professores orientam os alunos a visitar bibliotecas ou a procurar outras fontes, como entrevistas.
CONTEÚDO
Foi em busca dessa visão menos convencional que Olívia Schimidt, 22, se matriculou na graduação da Rudolf Steiner. Nascida no Rio Grande do Sul, ela estudou em escolas públicas a vida toda e cursou três meses de pedagogia na universidade federal do seu estado, a UFRGS.
Não viu sentido no que começava a aprender e buscou a Waldorf, da qual soube pela internet. “A gente sente uma transformação interna, não é só o aprendizado de um conteúdo”, afirma.
Sua colega de turma Alexa Rotermund, 21, sempre estudou em escolas Waldorf e diz ter da sua educação “uma memória gostosa”, especialmente de quando superou dificuldades de aprendizado. Apesar dessa formação, quer trabalhar em colégios de outras linhas a fim de levar a eles algo da metodologia Waldorf.
A mensalidade da graduação na Rudolf Steiner custa R$ 1.498 e há atualmente 32 alunos ocupando as 50 vagas.
O processo seletivo se dá por meio de um vestibular próprio, e são oferecidas dez bolsas de estudo. A faculdade também tem pós-graduação (R$ 906 de mensalidade), hoje com 35 matriculados, e mantém cursos de extensão (preço depende da carga horária), frequentados atualmente por 120 profissionais.
Fonte: Folha de São Paulo
Créditos: Folha de São Paulo