A moralidade ganhou uma!

Rubens Nóbrega

A Constituição da República diz que saúde é direito de todos e dever do Estado. Diz também que assistência à saúde é livre à iniciativa privada, que poderá participar de forma complementar ao sistema único de saúde. Complementar, não em substituição a, como o Ricardus I e a ‘Cruz Vermelha’ vêm fazendo no Hospital de Trauma de João Pessoa, submetido a uma terceirização que custa R$ 7,3 milhões por mês à Viúva.

A contratação da ‘Cruz’, que em ricardês recebeu o pomposo título de ‘gestão pactuada’, ameaçava avançar sobre outros hospitais públicos sob responsabilidade do Estado, mas ontem a Justiça usou freios ABS e parou o negócio. Por seis a zero, o Tribunal Regional do Trabalho da Paraíba (TRT da 13ª Região) reafirmou que o governo não pode terceirizar mão de obra em atividade fim, essencial e prioritária de Estado, como é o caso da saúde pública.

Com isso, o Ricardus I não pode mais pagar milhões de reais a um privado para fazer o que o Estado deveria. A decisão vale para serviços, equipamentos, hospitais, postos e quaisquer unidades de saúde de todo o Estado. E aí não interessa por qual instrumento, se contrato, convênio, acordo ou termo de cooperação técnica. Nem importa se é ‘gestão pactuada’ com OS, ong ou cooperativa. Enfim, o TRT proibiu toda modalidade de terceirização, por qualquer meio de contratualização.


Princípios constitucionais feridos

Ficou muito claro que a decisão do TRT constituiu vitória inequívoca e indesmentível da moralidade, moralidade entendida como princípio basilar da administração pública. É o que dá pra inferir clarividentemente do texto do voto do relator, desembargador Carlos Coelho, que assim se expressou:

– O Poder Público não pode gerir a máquina estatal com olhar de iniciativa privada como regra, fazendo terceirização de uma das principais atividades fim do Estado por longo período, ferindo não apenas o princípio constitucional da obrigatoriedade de concurso público previsto no art. 37, II, da Constituição Federal, como também o princípio constitucional da moralidade administrativa (art. 37, caput, da CF).

Com toda a categoria e ciência que Deus lhe deu, Doutor Carlos também disse que “o Estado Democrático de Direito não pode retroceder aos tempos da renascença, nas épocas das monarquias absolutas, em que a vontade do Soberano era a própria lei”. Acrescentando: “Graças a muito sangue e suor, hodiernamente, brocardos do tipo ‘o rei não erra’ (the king can do no wrong, ou le roi ne peut mal faire) não são mais admitidos em um estado democrático, no qual existem as normas, constitucionais e infraconstitucionais, como diretrizes de todo o ordenamento jurídico”.
Decisão vale para todos da saúde

Segundo ainda notas distribuídas ontem pelas competentes Assessorias de Comunicação do TRT e do Ministério Público do Trabalho na Paraíba, o Estado não poderá mais terceirizar e, consequentemente, precarizar os serviços prestados por qualquer profissional da área de saúde, como médico, odontólogo, psicólogo, fisioterapeuta, enfermeiro, técnico de enfermagem ou nutricionista, entre outros. E em caso de descumprimento, “a multa diária estabelecida pela Justiça é de R$ 10 mil por cada trabalhador encontrado em situação irregular”.

Tecnicamente, digamos, a decisão do TRT resultou do julgamento de mérito de um pedido da Procuradoria Geral do Estado para derrubar liminar mantida pelo desembargador Carlos Coelho em ação civil pública ajuizada pelo Doutor Eduardo Varandas, procurador-chefe do Ministério Público do Trabalho. A liminar havia sido concedida em 16 de março passado pelo juiz Alexandre Roque Pinto, substituto da 5ª Vara do Trabalho de João Pessoa.
Prefeitos dão calote em médicos

Recebi ontem denúncia sobre calote que prefeitos do interior estariam passando em profissionais de saúde, sobretudo médicos. Ainda estou apurando, mas adianto a seguir resumo de bom texto que me mandaram sobre o assunto.

***

Um dia não passa sem reportagem ou denúncia sobre a situação calamitosa da saúde publica na Paraíba, principalmente no que se refere à falta de médicos nos PSFs e centros de especialidade do interior. O que não se discute é porque médicos não estão sendo atraídos por propostas de trabalho das prefeituras municipais.

Além dos problemas logísticos e riscos inerentes às estradas, muitas vezes em péssimas condições, a segurança pessoal constitui desincentivo importante. Mas o fator principal é a falta de responsabilidade e de probidade por parte de secretários de saúde.

É comum prefeituras não pagarem aos médicos por serviços prestados bem como exames complementares realizados com o equipamento do profissional, sem nenhuma justificativa ou promessa de ressarcimento da dívida.

Município da Zona da Mata, por exemplo, deve seis meses a médicos especialistas que prestaram serviços à Prefeitura por mais de dois anos. Outro, no Sertão, recusa-se a pagar honorários atrasados porque – pasmem! – considera a dívida responsabilidade de ex-gestores.