A digital de Millôr

Rubens Nóbrega

A coluna de hoje estava reservada aos desdobramentos e novidades do escândalo da vez, mas dependia de material que ficaram de me enviar por i-meio, que não pude abrir ontem porque não encontrei sinal disponível na já mundialmente famosa Internet sem fio da Prefeitura de João Pessoa.

De qualquer sorte e modo, motivado talvez pelo singularíssimo momento que estamos vivendo na Paraíba, tive uma ideia digital e resolvi superfaturar a paciência ou condescendência dos leitores preenchendo este espaço com frases impagáveis do insuperável Millôr Fernandes.

Coincidência ou não com o propósito da coluna de hoje e dessa singela homenagem a um indiscutível gênio da raça, foi justamente com o seu humor cáustico e corrosivo, mirando em corrompidos e corruptores, que Millôr deixou sua mais nítida impressão digital na cena brasileira.

Eis por que pincei da produção do nosso genial iconoclasta as frases em que se refere mais contundentemente ao nosso país, aos nossos políticos e, sobretudo, às práticas dos nossos ‘líderes’, que sabem como ninguém usar cargos e dinheiro público para construir fortunas privadas. Vamos lá.

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• O Brasil não é o único país corrupto do mundo. Mas a nossa corrupção é a mais gratificante.

A probidade não tem cúmplices.

• Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados.

Em política nada se perde e nada se transforma – tudo se corrompe.

• Acabar com a corrupção é o objetivo supremo de quem ainda não chegou ao poder.

Como diz o cara absolutamente íntegro apanhado roubando: “Bem, eu também sou humano”.

• O dedo do destino não deixa impressão digital.

Canalhas melhoram com o passar do tempo (ficam mais canalhas.)

• Generalizando-se a corrupção, restabelece-se a Justiça.

Brasil; um filme pornô com trilha de Bossa Nova.

• Todo governante se compõe de 3% de Lincoln e 97% de Pinochet (ou Bush).  Mordomia é ter tudo que o dinheiro – do contribuinte – pode comprar.

• Essa gente que fala o tempo todo contra a corrupção está apenas cuspindo no prato em que não comeu.

Tantos homens públicos brasileiros querendo deixar suas pegadas nas areias do tempo. Mas não conseguem apagar as impressões digitais.
• Além de transformarem o Brasil num cassino, viciaram a roleta.

Uma roubalheira sem precedentes é apenas mais uma roubalheira antes de uma roubalheira maior também sem precedentes.

• Além de corrupto sou cleptomaníaco.

Eu não subi até aqui pra ser incorruptível.

• Político profissional jamais tem medo de escuro. Tem medo é de claridade.

Olha aí, ô meu, dignidade é feito virgindade: perdeu, tá perdida.

A maldade dessa gente…

Passada a fase inicial de perplexidade e indignação diante da matéria do Fantástico sobre o Jampa Digital, exibida domingo, chegamos ligeirinho à criatividade popular que entra em campo para nos ajudar a rir da nossa própria desgraça.

Anteontem, no twitter e nas melhores rodas de papo da Capital, o Jampa Digital começava a ficar conhecido como Jampa Sonrisal. Ontem, a onda era chamar de Rapa Digital e alguns até davam a senha para acessar a Internet via Jampa: ‘O-t-a-r-i-o’.

AGORA VAI

A Controladoria-Geral da União (CGU) vai investigar o Jampa Digital. Com isso, só fica faltando a Justiça Eleitoral entrar nessa para identificar de quem são as digitais impressas na grana farta que rolou e enrolou essa Internet sem fio Viúva Porcina. Afinal, parte desse dinheiro foi parar em famosa conta de campanha eleitoral.

Boa, senador Cássio

O senador Cássio Cunha Lima defendeu ontem a indicação do escritor paraibano Ariano Suassuna ao Prêmio Nobel de Literatura 2012. Para tanto, apresentou requerimento “solicitando que o Congresso Nacional e o Ministério das Relações Exteriores promovam a instrução do pleito”.

Muito bem, Senador. Mais do que merecido. Agora, permita-me aproveitar o embalo e seu apreço por nossa cultura e seus intelectos mais brilhantes para pedir que o senhor convença o governador e fazer uma homenagem decente ao centenário do ‘Eu’, que transcorre este ano. Ronaldo e a torcida ficariam bastante agradecidos.

A propósito, Senador, Augusto dos Anjos não teve a sorte de lhe ser contemporâneo. Aposto como o senhor, uma vez senador também no tempo do nosso poeta maior, faria a indicação dele para o Nobel de Literatura. Aí, Doutor Cássio, seria mais do que merecido. Seria justo, muito justo, justíssimo.