Uma História esquecida

Rubens Nóbrega

Sob esse título, a Professora Rosa Godoy presenteou colunista e leitores deste espaço com o belíssimo artigo que vai adiante. Ela nos mostra algo fantástico: nós temos, sim, Prêmio Nobel. E da Paz, o que é melhor.
São os nossos Boinas Azuis, que participaram de missões de paz no Oriente Médio entre os anos cinquenta e sessenta do século passado. Melhor ainda, no meio dos agraciados, mais de 70 representam a Paraíba.
Mas eles, tanto quanto a sua história, estão realmente esquecidos por brasileiros em geral e paraibanos em particular. Em especial por autoridades que poderiam render-lhes as devidas homenagens, reeditando-lhes justo e merecido reconhecimento.
Confesso que não sabia dessa história. Fiquei surpreso e maravilhado com as informações contidas no texto de Rosa Godoy, ícone da nossa melhor Academia, sobretudo do ensino e da pesquisa em História.
Devo registrar e lamentar, contudo, que ela está nos deixando para voltar às origens, no interior de São Paulo, de onde veio há mais de quarenta anos para ajudar a transformar a UFPB em uma das mais importantes universidades do Brasil.
Deixo vocês com a Rosa, a partir deste ponto.

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Que a história do Brasil e da Paraíba é plena de silêncios e ocultações, não é novidade.
Novidade é um desses silêncios: as missões integrantes da Força de Emergência da Organização das Nações Unidas – UNEF1, enviadas ao Oriente Médio pelo Brasil, juntamente com outros nove países, desde 1956, diante dos conflitos entre Egito e Israel na Faixa de Gaza, para patrulharem as fronteiras entre os dois países e garantirem o cessar-fogo e a paz entre as partes conflitantes, após a guerra ocorrida naquele ano.
As missões tinham, cada uma, a duração de dezoito meses e aconteceram até 1967. Durante o período em que as forças pacificadoras da ONU permaneceram na Faixa de Gaza, os conflitos cessaram.
Com a retirada de tais forças, a pedido do governo egípcio de Nasser, a beligerância na região voltou, com a eclosão da Guerra dos Seis Dias, e não se deteve até hoje. O contingente brasileiro foi o último a sair.
Considerada por decreto do Governo Kubitscheck como Serviço Nacional Relevante, a atuação dos chamados Boinas Azuis jaz no mais completo esquecimento.
Pois bem: em 1988, todos os participantes da UNEF1, entre os quais 6.226 militares brasileiros, receberam o Prêmio Nobel da Paz e outras condecorações, a saber: The International Veteran Millenium Medal 2000, The International Volunteers Foreign Service Medal e The United Nations’s 50th Anniversary Medal. Todos os países participantes da UNEF1 concederam aos membros de suas missões a réplica e o Diploma do Prêmio Nobel de Paz. Exceto qual país? O Brasil.
Das missões, participaram militares de todos os estados. A Paraíba esteve presente em todas elas, com 72 Boinas Azuis, entre soldados e oficiais. Atualmente, estão ainda vivos 64 desses participantes paraibanos, de que não se tem memória.
Em 27 de maio de 2001, foi constituída a Associação dos Integrantes do Batalhão Suez-Paraíba, considerada de utilidade pública municipal em João Pessoa, tendo, desde então, realizado inúmeras atividades, a exemplo de palestras, cursos, debates, junto à juventude das escolas de Educação Básica e na própria UFPB, não apenas sobre a atuação dos Boinas Azuis, mas sobre outros temas relevantes, a exemplo de ações anti-drogas, ajudas humanitárias, apoio em situações de calamidades públicas.
Os membros do Batalhão de Suez-Paraíba foram agraciados com a Honra ao Mérito do Estado da Paraíba e Menção Honrosa da Academia Paraibana de Letras.
Em 2009, foi aprovada pela Prefeitura Municipal de João Pessoa a Lei nº 11.656, de 12 de janeiro daquele ano, dispondo sobre a criação e aposição, em um logradouro da cidade, de um Monumento ao Pazeador, em memória e homenagem aos participantes do Batalhão de Suez.
O monumento continua pendente.
E, mais grave, os sucessivos governos brasileiros vêm se mostrando omissos em relação ao Prêmio Nobel de Paz recebido pelos Boinas Azuis.
Aliás, a sociedade brasileira e paraibana, de modo abrangente, ignora essa láurea e não confere o devido reconhecimento a seus compatriotas que prestaram um relevante serviço aos processos internacionais de paz.
No próximo dia 29 de maio comemora-se o Dia do Pazeador.
Em um tempo como este em que vivemos, de globalização, de intensificação das relações interculturais, e em que tanto se fala de paz e de direitos humanos, mas em que o horizonte internacional continua a apresentar um anuviado mundo beligerante, estas experiências de inserção internacional do Brasil, no tocante a tais questões, constituem um duplo repto: aos governantes, para que concretizem ações já aprovadas ou aprovem ações, de reconhecimento de tais esforços já realizados; aos historiadores, para que reflitam sobre tais questões.
Afinal, a Paraíba se situa no mundo.
Parece óbvio. Mas, com a globalização, cada peça do xadrez internacional do poder nos afeta. E daríamos uma bela resposta se, daqui do nosso lugar, da “pequenina Paraíba”, oferecêssemos ações, reflexões e simbologias sinalizadoras de caminhos de paz.
Rosa Maria Godoy Silveira
Universidade Federal da Paraíba