Opressão e injustiça

Rubens Nóbrega

“E eu que fui abrir sua coluna de hoje, certa que seria em homenagem à mulher. Jumentos (e jumentas), Rubão?”, reclamou ontem por i-meio – com toneladas de razão – a minha querida amiga Neiliane Maia, merecedora de todas as homenagens, referências e reverências nos 365 dias do ano e por todos os anos da nossa aventura na Terra.

Mesmo assim, respondi a Neili: “É no que dá não fazer colunismo nem jornalismo datado. Mas vou tentar me redimir”. De fato, raramente me dedico a escrever sobre datas comemorativas, mesmo as mais significativas como o 8 de Março. Mas não posso decepcionar alguém como minha amiga, através de quem peço perdão a todas.

Dito isso, à guisa de remição aproveito este dia imediatamente posterior à data consagrada internacionalmente à mulher para prestar homenagem a todas as mulheres dedicando esta coluna a duas tão especiais quanto Neiliane Maia: Dona Severina Alves da Silva, de 86 anos, sobrevivente em Alagoa Grande, e sua advogada, a Doutora Laura Berquó.

Homenageio as duas porque desde o ano passado elas travam uma luta extremamente desigual na mesma terra em que num triste agosto dos oitenta do século passado uma certa Margarida (Maria Alves) travou luta tão ou mais desigual contra ervas daninhas e poderosas do lugar, ervas daninhas que lhe sugaram a seiva por toda a vida e, por último, a própria vida.

A história tem tudo para se repetir em Alagoa Grande, se as autoridades – juíza, promotora, delegado de Polícia de Alagoa Grande, desembargador corregedor da Justiça Estadual etc. – não tomarem as providências que lhes competem. Se não oferecerem atenção e proteção devidas, aquela anciã de vida já tão Severina terá tudo para ser a Margarida da vez.


Ameaças e agressões contínuas

É uma enormidade o que vem sofrendo aquela mulher, pobre e analfabeta, vítima de contínuas ameaças e agressões à sua integridade física, ao seu patrimônio e aos seus direitos. E tudo porque achou de tentar na Justiça o direito de permanecer na granjinha em que mora e na qual tenta se sustentar, porque dela tira o sustento há mais de 30 anos.
Dona Severina e sua advogada tentam consumar judicialmente o usucapião do imóvel, ou seja, formalizar o direito de usar e morar em definitivo na propriedade em razão da posse prolongada e sem interrupção. Mas contra esse direito insurgem-se pretensos herdeiros do bem, secundados e ajudados por um servidor do Judiciário e por uma tabeliã, segundo me denuncia a Doutora Laura.
Só que os herdeiros não mostrariam escrituras e outros documentos exigíveis como meio de prova. Em vez de, mostram as garras contra Dona Severina e seus familiares, a exemplo de uma neta que, contou-me a advogada, levou tapa na cara por resistir ou reagir a xingamentos de seus agressores que, invariavelmente armados, também já botaram pra correr um genro ou filho da idosa.
Como se fosse pouco, plantações de Dona Severina seriam frequentemente destruídas e até baia pra cavalo teria sido construída no seu terreno. E a baia, complementa a advogada, foi ocupada – pasmem! – pelo cavalo de um técnico judiciário que funcionaria como uma espécie de assessor dos autodeclarados herdeiros.


Denunciados à Corregedoria

Não dou os nomes dos supostos agressores porque não tive como manter contato com eles, mas ambos estão denunciados formalmente à Corregedoria do Tribunal de Justiça do Estado que, pelo visto, até hoje não tomou qualquer providência e não sabe sequer se algum procedimento foi aberto para apurar o pretenso favorecimento dos acusados a uma das partes nessa questão.
Manifesto tal impressão porque há duas semanas tento informações e esclarecimentos junto à Corregedoria sobre o caso a partir da representação lá protocolizada pela Doutora Laura Berquó. Semana passada, após recorrer ao Doutor Itapuan Botto, Diretor de Informação do Tribunal, recebi um gentil telefonema do desembargador Nilo Ramalho, o corregedor geral.
Ele ficou de se inteirar do andamento da representação da advogada e me repassar as informações necessárias sobre providências e procedimentos que todos os interessados e envolvidos devem esperar daquela instância. Mas, até ontem, nada.
Trago o assunto a público, então, na expectativa de que algo seja feito para que amanhã não estejamos lamentando a morte de uma inocente e indefesa mulher, na esperança de que as pedras se movam e ajudem a livrar Alagoa Grande do estigma de cenário recorrente de tragédias humanas que poderiam ser evitadas.
Se nada for feito, temo que em pouco tempo essa história tenha como desfecho mais um crime da opressão e da injustiça praticadas impunemente na Paraíba pelo rico acobertado contra o pobre desvalido.
Uma ação a cada seis horas
Fiquei espantado e feliz ao mesmo tempo ao saber que o Ministério Público Estadual move uma ação penal a cada seis horas contra agressores de mulheres.
Segundo nota divulgada ontem pela Assessoria de Imprensa do órgão, “mais de 1,3 mil denúncias de violência doméstica contra mulheres enquadradas na Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06) foram oferecidas pelo Ministério Público da Paraíba (MPPB), entre janeiro e dezembro de 2011”. Tirando a média, dá isso mesmo: a cada seis horas, uma ação em favor das vítimas.
Que bom! Torço para que o Ministério Público em Alagoa Grande faça parte dessas estatísticas ou comece a fazer, começando por uma ação em desfavor dos agressores de Dona Severina Alves da Silva.