Cássio, a omelete e os ovos

 Nonato Guedes

Não tem sido fácil a trajetória de Cássio Cunha Lima, o que não quer dizer que não haja raios de sol no seu horizonte político. Em termos pessoais, ele enfrentou a via crucis para não ser cassado como governador pelo TSE no segundo mandato, mas foi a nocaute na undécima hora. Depois, envolveu-se na queda de braço com Cícero Lucena, dentro do PSDB, e resolveu assumir o ônus do apoio à candidatura de Ricardo Coutinho ao governo. Ganhou, mas não levou. Ou melhor, Ricardo ganhou, mas não deu a Cássio o prestígio que ele esperava e a que tinha direito. Como desgraça pouca é bobagem, adveio a querela jurídica sobre sua candidatura ao Senado. Foi eleito – aliás, o mais votado, o homem de mais de um milhão de votos, mas levou quase um ano para assumir porque foi atropelado pela Ficha Limpa.

Agora, na seara política, o desafio é a sua posição quanto às eleições para prefeito na Paraíba, especialmente em João Pessoa e Campina Grande. Sobre o pleito na capital, onde Cícero lançou-se pré-candidato no ninho tucano, Cássio afirmou que é partidário e reconheceu o direito de Lucena de tentar se viabilizar. “Mas a eleição municipal não deve alterar a aliança estadual com o PSB. Precisamos encontrar um mecanismo para que as disputas locais não interfiram nas questões estaduais”. O raciocínio é impecável. Só na teoria, entretanto. Cássio quer fazer omelete sem quebrar os ovos. Sabe que está num rabo de foguete, caminhando na corda bamba e tentando se equilibrar entre opostos. Para completar a confusão em que está enrodilhado, não reconheceu Estelizabel Bezerra como pré-candidata do PSB. Tudo bem que não houve a convenção formal para homologá-la, mas Estela já foi assumida como candidata “in pectoris” pelo governador, que maneja os cordéis para testar até que ponto vai a pré-candidatura alternativa do jornalista Nonato Bandeira, seu secretário de Comunicação, filiado ao PPS, e numa maratona incansável de articulações políticas para arrebanhar apoios.

A dualidade de posições de Cássio reflete um dilema pessoal que caberá a ele mesmo equacionar, pelo seu tirocínio inegável e pelo cacife que detém como estrela de primeira grandeza na constelação paraibana. Há momentos em que os políticos, que não são Super Homens, tentam vestir esse figurino para desbastar encruzilhadas. O falecido senador Humberto Lucena, como registrei em artigos nos jornais quando ele estava em evidência no comando do PMDB paraibano e projeção no cenário nacional, tinha uma propensão a brigar com os fatos. O partido se consumia em divisões latentes, o senador era abordado e respondia com a placidez de alguém que está entretido em dar milho aos pombos: “Não há crise no partido. A situação está sob controle”. Não estava, mas o bom Humberto achava que não devia pôr lenha na fogueira. A corda rebentou quando ele estava com séria enfermidade e teria sido poupado das notícias, ou pelo menos dos detalhes, da briga que corria solta entre José Maranhão e os Cunha Lima. Na verdade, Humberto achava que, como presidente do partido, devia atuar como algodão entre cristais, aparando arestas, sendo um eterno bombeiro. Infelizmente, bombeiros, como médicos, não fazem milagres. Fazem esforço. Ernani Sátyro, quando presidente estadual do PDS, envolveu-se num qüiproquó violento em Brasília com o casal Wilson-Lúcia Braga, tendo como pano de fundo a provável composição com o PMDB de Humberto Lucena, desejada por Wilson. Houve uma discussão áspera no apartamento do ex-senador Milton Cabral, e, como me encontrava em Brasília, fui ouvir de Ernani a sua versão. “Amigo velho, não vou confirmar nem desmentir nada. Mas não vou contribuir para dividir o partido”, reagiu, com seu estilo sincero.

Cássio não assumiu a presidência do PSDB porque não quis. Ela lhe foi oferecida várias vezes por Cícero, com o aval da Executiva nacional. Preferiu não ir para o confronto. Mas se é realmente partidário, e não “conhece” a candidatura de Estelizabel (não confundir com a pré-candidata), o bom senso indica que deveria apoiar Cícero de forma explícita e…partidária. Insinuar que eleição municipal não deve ter a ver com disputa estadual é truísmo para fugir de definições, ou ganhar tempo. Claro que cada eleição é uma eleição, tem peculiaridades distintas ou específicas. Mas, política não é uma regra estática. O que Cássio não revela é que seu candidato ideal em João Pessoa seria Luciano Agra, campinense com quem se dá muito bem, e que disse ter ficado impressionado com ele numa audiência que tiveram no Paço municipal. Mas Agra jogou a toalha irreversivelmente. O quadro é o que aí está. Ou Cássio se define, ou anuncia que vai cuidar de Campina Grande, seu principal reduto eleitoral. Ficar no “rame-rame” de que se queixava quando governador é que não dá. O homem público tem suas sutilezas, seus segredos de estratégia. Mas na hora da onça beber água, não pode tergiversar. O eleitor gosta de quem decide.