A inclusão de dois trechos que podem proibir o aborto em qualquer circunstância na PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que estende a licença-maternidade a mães de bebês prematuros está atrasando a votação da matéria na Câmara.
Uma comissão especial foi originalmente criada para analisar a PEC 181/2015, de autoria do senador Aécio Neves (PSDB-MG), para estender o tempo da licença-maternidade nos casos de partos prematuros. A proposta defende que a licença seja prorrogada na quantidade de dias em que o recém-nascido passar internado limitados a 240 dias ao todo.
No entanto, ao longo do caminho, o texto foi modificado pelo relator Jorge Tadeu Mudalen (DEM-SP). Ele propôs alterações em dois artigos do início da Constituição, que tratam dos princípios fundamentais da República e, assim, as divergências emergiram.
Como é hoje:
Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: […] a dignidade da pessoa humana.
Como pode ficar:
Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: […] a dignidade da pessoa humana, desde a concepção.
Como é hoje:
Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: […].
Como pode ficar:
Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida desde a concepção, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: […].
Os trechos não estavam previstos no texto original de Aécio Neves e são alheios à temática inicial. Por isso, são chamados de “jabutis”. Na prática, as modificações poderiam inviabilizar a prática do aborto no Brasil, inclusive nos casos em que ele já é previsto por lei: gravidez decorrente de estupro, feto anencéfalo – sem cérebro – e quando colocar a vida da mãe em risco.
Argumentações
A oposição contra o texto atual alega que, como está, criaria uma prerrogativa de criminalizar o aborto em qualquer situação, pois os trechos alterados constariam na Constituição, que rege o Código Penal. Ela é formada pelas deputadas Érika Kokay (PT-DF), Luiza Erundina (PSOL-SP), entre outros.
Já os defensores da manutenção dos “jabutis”, como o próprio Gussi, afirmam querer apenas reforçar a legislação já existente. Embora não haja consenso entre os evangélicos sobre o tema, a maior parte dos parlamentares contra o aborto é integrante da bancada protestante na Câmara.
Vários protestos pelo Brasil pediram que a PEC não fosse aprovada. Em 21 de novembro, houve gritaria entre parlamentares e manifestantes na Câmara.
Atrasos e bate-boca
Nesta terça-feira (5), a comissão foi aberta com mais de três horas de atraso. A comissão tentou votar os destaques ao texto-base, mas, por falta de consenso, acabou não avançando. Esta foi a terceira vez que os deputados acabaram atrasando o início das reuniões, batendo boca sobre o projeto e, com isso, as atividades no plenário da Casa interromperam os trabalhos.
Durante a reunião desta terça, Érika Kokay pediu requerimento de inversão de pauta para que o assunto fosse logo debatido ao invés de se começar pela leitura da ata e outros procedimentos. O pedido foi negado por Gussi. Érika então se irritou com o deputado quando este demonstrou não querer apreciar os demais pedidos.
O pedido foi negado por Gussi e rejeitado em votação nominal.
Nas últimas duas reuniões da comissão, os deputados também tiveram de parar as reuniões devido à abertura da ordem do dia no plenário.
No início de outras reuniões, a oposição também adotou a estratégia de não marcar presença na comissão pela retirada imediata dos “jabutis”. Já nesta terça, quando o quórum de 18 deputados foi atingido, nem o presidente da comissão, deputado Evandro Gussi (PV-SP), estava no local presencialmente.
Mesmo que o projeto seja aprovado na comissão com os trechos polêmicos, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), já sinalizou que não mexerá em direitos adquiridos e não pretende pautar a matéria em plenário. Como presidente da Casa, ele tem a prerrogativa de acelerar ou segurar projetos ao escolher quais serão votados.
Fonte: UOL
Créditos: UOL