Rubens Nóbrega

O governador Ricardo Coutinho ganhou um fã entre os meus amigos mais chegados. Refiro-me a Bicho Bom, que passa muita sinceridade quando diz compreender e de uns tempos pra cá, como diria o poeta Chico César, passou a defender com muita firmeza alguns atos e decisões governamentais.

O aumento concedido ao funcionalismo estadual, por exemplo. Segundo Bicho Bom, o percentual só não foi maior do que os 3% porque Ricardo teria atendido a um apelo urgente e veemente da presidenta Dilma Vana. Ela teria chegado mesmo a suplicar ao governante paraibano para não exagerar na bondade.

“Ela pediu ao governador moderação por dois bons motivos. O primeiro, porque os servidores federais não tiveram aumento e ela ficou muito mal na fita após o anúncio do reajuste aqui no Estado. Em segundo lugar, por ter sido alertada pelo Banco Central para as conseqüências de aumento tão generoso aos servidores estaduais da Paraíba”, disse.

Diante da minha cara de incredulidade, e antes que eu dissesse alguma coisa, Bicho Bom tratou de explicar. “Ora, Rubão, todo mundo sabe os efeitos do excesso de dinheiro na mão do povo. É vendaval, Rubão. Pobre não pode pegar um tantinho assim de dinheiro a mais que passa a gastar adoidado, comprando tudo. Aí, os produtos escasseiam, os preços sobem e a inflação volta com toda a molesta”, disse.

Fiz menção de pedir um aparte, mas ele retomou ligeirinho o fôlego e continuou, dessa vez para citar algumas categorias que teriam sido ainda mais generosamente contempladas: “O caso dos policiais… Já pensou o que é um soldado com 50 reais a mais no contracheque? E um professor, que recebeu 85 reais de aumento e ainda tem coragem de reclamar. Pode?”.

Gosto Ruim, presente, até então ouvindo calado a conversa, mas parecendo também não acreditar no que ouvia, inventou de rebater e afirmar que além de ter achado pouco o aumento a maioria dos funcionários estava revoltada com a imposição do expediente dobrado sem vale-refeição nem um vale-transporte a mais para cobrir o gasto extra com passagem.
“Revolta coisa nenhuma, Gosto! Vá ver lá na casa dos funcionários! Converse com as esposas deles, pra ver uma coisa. Elas estão adorando. Só assim os maridos não ficam metade do dia enchendo ou coçando dentro de casa, atrapalhando o serviço delas ou arengando com menino por causa de tevê, de demora no banheiro… Vá lá!”, desafiou Bicho Bom.

E não teria sido apenas essa a contribuição da medida governamental à harmonia familiar dos barnabés. “Os dois expedientes vieram também para proteger a saúde de muita gente que passava a manhã na repartição e à tarde e noite tinha que se esfalfar por aí, fazendo bico pra complementar a renda e o sustento. Com isso, alguns estavam deixando, inclusive, de cumprir com certas obrigações domésticas”, revelou.

“Como assim?”, quis saber Gosto. Bicho esclareceu, com a maior seriedade: “Ora, Gosto, o sujeito chega muito cansado em casa e não dá no couro. Aí, a comadre fica insatisfeita, começa a reclamar, depois de um tempo vai querer suprir a falta e tá feita a desgraça. De modo que a medida do governo, além de tudo, está salvando muito casamento, pode apostar”, assegurou, arrematando:
– O homem é um gênio, rapaz. O homem pensa em tudo!

Nesse ponto, percebi em Gosto aquela expressão do sujeito que não sabe se dá um murro ou uma gargalhada na cara do outro. Afinal, Bicho Bom defendia o governo e o governador de um jeito tão compenetrado e solene que nos deixava uma tremenda dúvida se falava sério, se estava apenas tirando sarro da gente ou achando que somos rematados idiotas.

“Home, deixe de brincadeira. Tu só pode estar brincando, né?”, tentei aliviar, para conter alguma reação impensada de Gosto, que já não disfarçava sua irritação diante do aparente cinismo do nosso amigo. Mas Bicho Bom não entendeu a deixa e cometeu a penúltima do dia, antes de eu lhe sugerir que fosse embora para não levar umas porradas. Vejam só o que achou de dizer:

– Rubão, tu visse que Ricardo declarou que candidatura à Prefeitura da Capital ele só tem uma, que é a de Estelizabel, não foi? Então, sabe por que ele fez isso? Foi pra acalmar o mercado, visse? Ele soube que a Bolsa de Valores entrou em polvorosa com o anúncio da candidatura de Nonato Bandeira. A possibilidade de um racha no Coletivo derrubou a Nasdaq e a Bovespa. E poderia ter sido muito pior com a insistência de Nonato. Só não foi porque Mantega agiu rápido, ligou pro governador e Ricardo deu aquela declaração, que tranqüilizou meio mundo.

– Bicho, Bicho, tu tá exagerando. Acho bom tu ir embora logo… – advertiu Gosto Ruim.

– Por que? Só por que estou dando minha opinião? Que democrata é você, cara, que não respeita a opinião dos outros? Desse jeito, vou nem mais falar que o governador até já descobriu a causa da violência em nosso Estado e sabendo a causa fica mais fácil resolver o problema, não acha? – provocou Bicho Bom.

– Que história é essa? – quis saber. E ele, com a cara mais lisa do mundo, não se fez de rogado e mandou ver. Olha só! Só mais essa:
– O governador falou hoje no Polêmica. Ouviu não, foi? O culpado de tudo isso é esse povo que anda por aí, descuidado, dando mole pra bandido. O povo não tem cautela, anda em rua escura, não presta atenção e depois vem botar culpa no governo pela onda de violência. Ainda bem que Ricardo sacou o que tá causando todos esses crimes. Não digo a vocês? O homem pensa em tudo…