A farsa do reajuste

Rubens Nóbrega

Com o ensaiado reajuste de dez centavos concedido ontem às passagens de ônibus da Capital, as seis empresas que por eterna concessão do governo municipal dominam o setor vão aumentar seu faturamento bruto mensal de R$ 18,1 para R$ 18,9 milhões.
A partir da próxima segunda-feira (9), quando entra em vigor a nova tarifa (R$ 2,20) decidida por Doutor Agra, cada concessionária vai faturar pouco mais de R$ 3 milhões por mês. Brutos, lógico, porque nessa parada o líquido é privado, apesar de o serviço ser público.

Não dá pra saber – até por que quem poderia informar não informa nem esclarece – quais as despesas (insumos, impostos, salários e encargos sociais) que pesam sobre esse faturamento. Muito menos dá pra saber a margem de lucro do setor, por ser ainda mais insondável e misteriosa.

Esses valores deveriam ser de domínio público porque estamos lidando com um serviço público, como já disse. Mas não é assim que o poder público trata o assunto. Em vez de transparência, a cada final ou começo de ano o que se tem é um teatro em torno do reajuste de tarifas.

A ‘peça’ abre com a reunião do Conselho Municipal de Transporte e Trânsito, que parece existir exclusivamente para homologar a pedida de aumento feita em cima de uma planilha em tese elaborada pela Superintendência de Transporte e Trânsito (STTrans), da Prefeitura.

Os conselheiros examinam a tal planilha, ouvem da representação do empresariado que o reajuste ideal é xis, mas no final é aprovado ípsilon. Ato contínuo, a nova tarifa é divulgada e a ela reage bastante contrariado o alcaide, dizendo ser excessivo o percentual.

Na mesma cena, o prefeito ainda ameaça segurar o reajuste por mais seis meses, mas nos bastidores encontra alguém que lembra ser o ano eleitoral e é melhor resolver essa parada logo do que aplicar estelionato pós-eleições. Lembrança que muda ligeiro a fala do ator principal.

Encarnando o papel de mocinho, o alcaide retorna à cena aberta no epílogo da farsa. Só para dizer que jamais admitiria um ‘aumento’ abusivo como aquele que queriam os donos do pedaço e o reajuste será, portanto, menor. Aí, rufam os tambores para le grand finale.
Com toda a gravidade do mundo, anuncia o novo preço da passagem de ônibus e garante que fez de tudo para ‘não penalizar’ os passageiros, mas teve que dar algum reajuste para não desmantelar ‘o sistema’, que se ficar desmantelado acaba desmantelando todo mundo.

Por desmantelo entenda-se a suposta incapacidade de investimento, renovação e manutenção da frota que adviria da não atualização das tarifas do ‘sistema’, expressão que técnicos girassolaicos usam para designar o que é, na verdade, uma – e quase única – modalidade de transporte coletivo.

Após cair o pano, sem que o elenco volte para eventuais aplausos, talvez por vergonha do desempenho, o público sai do teatro sem saber se um possível desmantelo incluiria eventual recusa dos empresários do ramo de contribuírem com o caixa da próxima campanha.
Os números do ‘sistema’
A projeção de faturamento das donas do ‘sistema’ é possível com números disponíveis no sítio da STTrans (joaopessoa.pb.gov.br/secretarias/sttrans/onibus/). Sob o título ‘Dados do Sistema de Transporte Coletivo Convencional’, ei-los:


A FRASE PERFEITA

Do filósofo Gutemberg Cardoso, parafraseando Rousseau, ontem, no imperdível Polêmica Paraíba (Paraíba FM): “Quem fecha escola tem que abrir presídio”.