O e-mail iolanda@ e os caminhos que podem ligá-lo a Dilma
João Paulo Charleaux 12 Mai 2017 (atualizado 12/Mai 21h51) Em delação, empresária Mônica Moura diz que ex-presidente mantinha conta secreta de e-mail pela qual avisava sobre o avanço da Lava Jato FOTO: RAFAEL MARCHANTE/REUTERS EX-PRESIDENTE DILMA ROUSSEFF
O Supremo Tribunal Federal tornou público nesta quinta-feira (11) o conteúdo das delações premiadas do marqueteiro João Santana e de sua esposa, a empresária Mônica Moura. Eles afirmam que a ex-presidente Dilma Rousseff sabia dos desvios da Petrobras, do caixa dois de campanha do PT e de pagamentos no exterior feitos por empreiteiras do esquema da estatal. O casal afirmou ainda que a ex-presidente chegou a alertá-los sobre o andamento das investigações da Lava Jato usando uma conta secreta de e-mail.
Qual a importância do casal Santana respondeu pelas campanhas presidenciais do PT de 2006, quando Luiz Inácio Lula da Silva era o candidato, e de 2010 e 2014, quando Dilma concorreu ao Palácio do Planalto. As três campanhas foram vencedoras. A influência do marqueteiro no gabinete de Dilma lhe rendeu o apelido de “40º ministro” do governo, numa época em que o primeiro escalão tinha 39 integrantes. O casal foi preso preventivamente em fevereiro de 2016, mas acabou libertado em agosto daquele mesmo ano, depois de ter emplacado um acordo de delação premiada com o Ministério Público. Qual o valor jurídico das delações A delação é apenas o primeiro momento da investigação. Ela contém informações fornecidas por pessoas suspeitas, acusadas ou condenadas que querem reduzir sua pena em troca de colaboração.
Caberá aos investigadores confrontar essas declarações com outras fontes e outros testemunhos e tentar provar se o que foi dito é verdadeiro. 700 Páginas compõem a delação de João Santana e de Mônica Moura, prestada nos dias 6 e 9 de março, em Curitiba 19 videos Contêm horas de depoimento do casal aos procuradores “[Mônica Moura e João Santana] prestaram falso testemunho e faltaram com a verdade em seus depoimentos, provavelmente pressionados pelas ameaças dos investigadores” Dilma Rousseff Ex-presidente do Brasil, em nota do dia 12 de maio de 2017 Ocaso do e-mail [email protected] Na delação, Mônica Moura diz aos investigadores que Dilma criou em novembro de 2014, um mês após a sua reeleição, uma conta anônima de e-mail por meio da qual avisava o casal sobre os movimentos da Lava Jato, para que eles se precavessem das investigações. Mônica Moura diz que criou uma conta de e-mail a pedido de Dilma para que ambas pudessem manter um canal sigiloso de comunicação.
Apenas as duas – além do assessor de Dilma, Giles Azevedo – tinham a senha da conta. Na versão da delatora, esse era o canal por meio do qual a então presidente avisava sobre o andamento das investigações da Lava Jato, partilhando informações secretas com o casal. As mensagens eram redigidas e guardadas na forma de rascunho. Nunca eram enviadas.
Assim, ambas podiam acessar a conta e ler as informações no rascunho, de maneira que as mensagens não podiam ser interceptadas. A conta foi aberta por Mônica numa das visitas feitas ao Palácio da Alvorada, em novembro de 2014. Na versão da delatora, ela mesma abriu a conta, usando para isso um notebook da própria presidente, na biblioteca da residência oficial, em Brasília, tendo Dilma a seu lado.
O e-mail era [email protected] e a senha “iolanda47”. A senha, de acordo com Mônica Moura, foi escolhida pela própria Dilma. Ela seria a junção do nome de Iolanda Barbosa, esposa do general Costa e Silva, que governou o Brasil num dos períodos mais duros da ditadura, de 1967 a 1969, e o número 47, que corresponde à data de nascimento da presidente (14 de dezembro de 1947). Mônica registrou uma dessas trocas de mensagem numa Ata Notarial lavrada em 13 de julho de 2016, no 1º Tabelionato Giovannetti em Curitiba. “Às 15 horas e 14 minutos, acessei o sítio “http://www.gmail.com”, e, após o solicitante efetuar login com usuário e senha, acessei referido e-mail, registrando a rotina sugerida na forma a seguir, do que dou fé” Felipe Pedrotti Cadori 1º Tabelionato Giovannetti em Curitiba, em 13 de julho de 2016 “Vamos visitar nosso amigo querido amanhã. Espero não ter nenhum espetáculo nos esperando.
Acho que pode nos ajudar nisso, né?” Texto cifrado de 22 de fevereiro, atribuído por Mônica Moura a Dilma Rousseff Além do e-mail, Dilma teria, segundo Mônica Moura, telefonado para o casal para avisar da existência de uma ordem de prisão contra ambos, em fevereiro de 2016. No dia 23 de fevereiro de 2016, o casal foi preso preventivamente pela Polícia Federal. Como rastrear a informação sobre o e-mail As informações de Mônica terão de ser corroboradas por provas materiais para que tenham peso jurídico no processo, a fim de que não fique apenas a palavra dela contra a de Dilma. Para saber como essas provas podem ser obtidas, o Nexo conversou com o advogado Luiz Ricardo de Almeida, especialista em direito digital. É possível saber com precisão a partir de qual aparelho de computador essa conta de e-mail foi aberta? Como? LUIZ RICARDO DE ALMEIDA Via de regra, sim. Todo terminal – seja computador ou qualquer dispositivo que se conecta à internet – possui uma espécie de RG, um número de registro, um IP. Para acessar a internet, qualquer terminal necessita de um provedor de acesso, como Vivo, GVT, Embratel etc. Ocorre que todo acesso à internet deve seguir um roteiro protocolar, através do qual são registrados os dados de conexão e de acesso por determinado terminal.
É preciso ressalvar o seguinte: quando tal acesso se dá através da chamada Deep Web, a identificação torna-se muito difícil, já que tal roteiro protocolar de acesso à internet é embaralhado no acesso, ocasião em que nem sempre se identifica o passo a passo seguido pelo agente que permitiria sua identificação. É possível saber onde este computador estava no momento em que a conta foi aberta? Como? LUIZ RICARDO DE ALMEIDA Sim. O provedor de conteúdo – seja o Google, o UOL etc – deve prestar informações quanto aos dados relacionados à criação da referida conta de e-mail. De posse dessas informações, deve-se acionar o provedor de acesso para que ele informe os registros dos logs de conexão do usuário – o dia, a hora, o IP, dados cadastrais do usuário, seja de um wi-fi, de sua residência, etc., bem como do terminal que acessou a rede naquele período. É importante frisar que todo e qualquer acesso a tais dados é condicionado à respectiva autorização judicial, conforme arts. 10, 15, 22 e 23 do Marco Civil da Internet. É possível saber com precisão o dia e a hora em que esta conta de e-mail foi aberta? Como? LUIZ RICARDO DE ALMEIDA Sim, já que todo acesso a internet registra os chamados logs de acesso, dentre os quais se identifica a data e a hora, conforme a localização do usuário quando do acesso. O acesso a essas informações é público? Ou são informações sigilosas? LUIZ RICARDO DE ALMEIDA Não. São sigilosas, conforme proteção constitucional e infraconstitucional à proteção de dados, à privacidade e ao sigilo telefônico e telemático. Se são sigilosas, a quem os investigadores devem recorrer? LUIZ RICARDO DE ALMEIDA Por se tratar de dados sigilosos, toda e qualquer investigação deve respeitar fielmente uma cadeia de custódia de provas, a fim de assegurar a licitude da investigação e preservar a idoneidade das provas que serão produzidas. Se houver acionamento da empresa Google, isso se dá com leis brasileiras ou americanas? Qual o foro? LUIZ RICARDO DE ALMEIDA É necessário acionar o Google por se tratar do provedor de conteúdo responsável por contas de e-mail do Gmail. Todo procedimento segue a legislação brasileira, conforme estabelecido pelo Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014) Da Suíça para Cingapura Além da informação sobre o e-mail o casal também falou sobre aconselhamento que Dilma teria dado sobre a melhor forma de esconder o dinheiro recebido pelo marqueteiro no exterior. Uma conta mantida na suíça seria, segundo Mônica Moura, o “elo de ligação” com a Odebrecht, que segundo a Lava Jato superfaturava contratos na Petrobras e, em troca, fazia pagamentos a políticos e campanhas. Para que a investigação não encontrasse esses valores, Dilma teria sugerido, na versão da delatora, que o dinheiro fosse transferido para Cingapura. Ela diz que a presidente temia que ocorresse o mesmo que havia ocorrido com o então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), cujas contas na Suíça foram descobertas pela Lava Jato.
“Ela (Dilma) sempre falava dessa preocupação, porque a Lava Jato avançava, avançava. Ela queria que a gente mudasse, mexesse na conta, chegou a sugerir ‘Por que vocês não transferem essa conta de lá pra outro lugar?’” “Ela [Dilma] sugeriu que a gente mandasse pra Cingapura ou algo assim, que ela ouviu falar que era um lugar muito seguro” Mônica Moura Esposa do marqueteiro João Santana, em delação premiada O que acontece agora As delações premiadas de João Santana e Mônica Moura servirão de base para a abertura de inquéritos contra os citados, incluindo Dilma. O inquérito é a investigação policial que pode ou não redundar numa denúncia formal à Justiça. Dilma já é formalmente investigada na Lava Jato desde agosto de 2016 na mesma ação penal na qual Lula já é réu.
O Ministério Público os acusa de terem agido para atrapalhar a Lava Jato. Na versão dos procuradores, Dilma indicou Marcelo Navarro para o cargo de ministro do Superior Tribunal de Justiça com o compromisso de que ele votasse pela soltura de presos pela operação. Já Lula é acusado de ter agido em conluio com o então senador Delcídio do Amaral para comprar o silêncio do ex-diretor da Petrobras, Nestor Cerveró, que se encontrava preso e em vias de aderir a um acordo de delação premiada.
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Fonte: https://www.nexojornal.com.br/expresso/2017/05/12/O-e-mail-iolanda-e-os-caminhos-que-podem-lig%C3%A1-lo-a-Dilma
Créditos: João Paulo Charleaux