RC vinga-se de HB

Rubens Nóbrega

Só pode ser obra do mais sutil e requintado sadismo o que Ricardo Coutinho conseguiu fazer – e continuaria fazendo – com Hervázio Bezerra.

Não bastou ter cooptado e neutralizado o aguerrido oposicionista que Hervázio foi quando vereador da Capital. Sua Majestade foi ‘ao infinito e além’, tal e qual Buzz Lightyear.

Depois de encantar o suplente de deputado estadual com a vaga de titular de mandato na Assembléia, Ricardus I fez do inesperado neo-ricardista o líder do governo.

E aí imagino que desde então Hervázio deve se sentir feito Zico sentiria jogando pelo Vasco ou Roberto Dinamite vestindo a 10 do Flamengo.

Mas Hervázio cumpre com o maior profissionalismo o papel de defensor de um governo e de um governante nos quais, desconfio, não acredita.

Mesmo assim, Hervázio é capaz de tentar tudo e mais um pouco, como tentou, para evitar que um empresário contrariado como o Daniel Gonçalves ‘detonasse’ Ricardo & Cia. da forma que detonou ontem, na Assembléia.

Detalhe: segundo o denunciante do chamado ‘Escândalo dos Livros’, na campanha passada ninguém menos que o então vereador Hervázio Bezerra apresentou-o a José Maranhão, então candidato do PMDB ao governo.

Segundo Daniel, o propósito desse contato foi fazer da sua nebulosa história um carro-chefe da luta para destruir a imagem do à época ‘inimigo’ comum, ou seja, o então candidato do PSB ao governo, Ricardo Coutinho.

Essa articulação, se realmente existiu, só vem reforçar a idéia de que Hervázio não sentiu a menor dificuldade em passar de um extremo a outro. Resultado: a mão que afagou Daniel em 2010 é a mesma que o apedreja em 2011.

Mas isso só mostra que dentro ou fora da Assembléia Hervázio exerce sua função de modo aparentemente tão convicto que acho impossível ter passado pela sua cabeça a possibilidade de estar sendo vítima de refinada vingança.

Vingança pelo que dizia de Ricardo, pelo tanto que denunciava a gestão de Ricardo na Prefeitura da Capital. Vingança que consiste em desfigurar politicamente, completamente, o ex-temido e destemido adversário.

É o preço que Hervázio estaria pagando por ter sido atraído pelo governismo ou traído pela ambição de assumir um mandato emprestado na Assembléia.

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Lembro a vez em que escrevi quase uma coluna inteira elogiando a atuação parlamentar do então vereador tucano Hervázio Bezerra, que se apresentava como o mais consistente opositor ao prefeito Ricardo Coutinho, da Capital.

Lembro também a reação indignada de um colaborador da mais absoluta confiança do alcaide pelo fato de o colunista ter reconhecido o trabalho de Hervázio, sobretudo a qualidade das denúncias que o vereador fazia contra a gestão ricardista.

Certamente incumbido de desqualificar o artigo, o tal assessor tentou dar cabo de sua missão procurando desqualificar por completo aquele a quem os girassolaicos devotavam ódio imenso, inclusive porque tremiam diante da verrina hervaziana.

Pra vocês terem uma idéia, o categorizado auxiliar do Ricardus apelou feio, ao ponto de insinuar que Hervázio seria responsável por ‘bandalheira’ na Secretaria Municipal de Saúde com a PMJP sob Cícero Lucena.

O meu interlocutor não conseguiu fazer com que me arrependesse do escrito, muito menos mudar minha avaliação do mandato de Hervázio nem meu conceito acerca das acusações que o vereador fazia ao governo municipal de Ricardo.

A biliosa interpelação, feita por telefone, não me demoveu nem me convenceu. Até por que em diversos contatos pessoais com Hervázio ele já me convencia e me abria os olhos quanto à verdadeira face e reais facetas de quem lhe desancava a todo instante.
Não mudei em relação a Hervázio, mas ele ajudou a mudar radicalmente o que eu pensava sobre quem hoje o deputado defende. E Hervázio me convenceu com a mesma competência com que criticava e denunciava no tempo em que era vereador.

Acreditei de verdade em muita coisa que Hervázio dizia sobre Ricardo. Como não acreditar, se ele foi capaz de mostrar e provar na Justiça que quando prefeito o hoje governador foi capaz de licitar uma obra depois da obra concluída?

Pois bem, segundo Hervázio, essa formidável inovação – licitação com efeito retroativo – foi empregada pela primeira vez na história da administração pública para dar aparência legal à construção irregular da Integração de Coletivos na Cidade Baixa.

Hervázio Bezerra fez criteriosa investigação sobre o caso e produziu mais um de seus alentados dossiês sobre aquela que pode ser referenciada como a primeira grande ‘realização’ de Ricardo Coutinho enquanto gestor. Outras tantas viriam depois…

De todo modo, vejo hoje – com indisfarçável satisfação, confesso – que devo ter contribuído de alguma forma para o tal assessor e seu majestático assessorado mudarem, também radicalmente, o que achavam de Hervázio Bezerra.

De minha parte, continuo achando Hervázio um tremendo parlamentar, um dos melhores quadros da atual legislatura, inclusive porque dotado de uma agilidade mental extraordinária e de uma capacidade de argumentação fantástica.

É tanto que qualquer dia desses, para acabar de vez com essa besteira da oposição de querer lhe botar carimbo de incoerente, não se admire se Hervázio pegar o microfone e evocar o inigualável Raul Seixas, cantando assim:

– Eu prefiro ser essa metamorfose ambulante/do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo…