Paira sobre Lula a ameaça de prisão imediata. Até algum tempo atrás julgava-se que o clamor popular seria tão intenso que ninguém ousaria testar. No momento, o que mais a aliança Mídia-Lava Jato-Temer pretende são agitações populares, que aprofundem o regime de exceção e desviem o foco dos fracassos do governo. Neste contexto, haverá dois caminhos para Lula
Luis Nassif, GGN
Peça 1 – a instituição da prisão perpétua
Sinal 1 – a prisão temporária de Guido Mantega eAntônio Palocci, depois convertida em prisão preventiva. Na prática, o juiz Sérgio Moro instituiu a prisão perpétua no país, com penas que começam a ser cumpridas mesmo antes da condenação.
José Dirceu, com mais de 70 anos, Palocci, com mais de 60, passaram pela prisão provisória, entraram na prisão preventiva e emendarão com a condenação final, com penas de 100 anos em um país em que parricídio e matricídio condenam a 15 anos de prisão.
Sinal 2 – O TRF4 (Tribunal Regional Federal da 4a região) legitimando o Estado de Exceção na operação Lava Jato.
Sinal 3 – o desmembramento da Operação Lava Jato, com a aceitação da denúncia de Lula por corrupção e organização criminosa.
Sinal 4 – A aceitação do início do cumprimento da pena após sentença em 2ª instância.
Tudo isso leva à Peça 2 do nosso xadrez.
Peça 2 – a prisão de Lula
Por todos esses indícios, paira sobre Lula a ameaça de prisão imediata.
Até algum tempo atrás julgava-se que o clamor popular seria tão intenso que ninguém ousaria testar.
No momento, o que mais a aliança midia-Lava Jato-Temer pretende são agitações populares, que possam justificar o aprofundamento do regime de exceção, desviando o foco dos fracassos políticos da junta golpista.
Haverá dois caminhos para Lula.
Um deles será buscar o asilo político em alguma embaixada e, fora do país, ter liberdade de ação para denunciar o regime de exceção instaurado.
O segundo caminho seria aceitar a prisão e transformar-se na reedição de Mandela. Pesa contra essa possibilidade a própria idade de Lula. Até que a democracia seja restabelecida, provavelmente não voltaria a ver a luz do dia. Com as reações internas débeis à escalada do estado policial, o único obstáculo às arbitrariedades serão as reações internacionais.
Peça 3 – os trânsfugas do lulismo
Uma das questões mais intrigantes desse jogo politico tem sido a ira que Lula passou a despertar em personagens que são criaturas óbvias do lulismo, mesmo jamais tendo militância partidária.
É o caso do Procurador Geral da República Rodrigo Janot.
Antes da chegada de Lula, pertencia ao grupo dos Tuiuiús, de procuradores escanteados no Ministério Público Federal na era Geraldo Brindeiro. Reuniam-se toda sexta-feira em torno de uma mesa, com bons vinhos, tendo uma estátua de tuiuiú no meio, para lamentar a sorte.
Faziam parte Cláudio Fontelles, Antonio Fernando de Souza e Roberto Gurgel, futuros PGRs, mais Wagner Gonçalves, Eugenio Aragão, Joaquim Barbosa e o próprio Janot. Nenhum deles jamais teria ascendido ao poder se não fosse o lulismo.
O mesmo ocorreu com os Ministros Ayres Brito e Carmen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal. Suas indicações geraram críticas no meio jurídico, de quem não os julgava preparados para o cargo.
Ascendendo na hierarquia do MPF e do STF, pelas mãos do PT, aparentemente essas pessoas julgavam-se como autoridades de segunda classe, posto que da cota de um partido visto pelo establishment como de segunda classe.
Daí a enorme gana de abjurarem essa ligação incômoda, para passar da cozinha para a sala de estar da casa grande.
É sintomático que, quando o grampo sobre Lula captou uma frase dele, lamentando a ingratidão de Janot, ele tenha se apressado em declarar que devia seu cargo a ele próprio, ao concurso, não ao Lula. Conversa! Sem Lula, não teria chegado a PGR.
O mesmo aconteceu com Ayres Brito. De juiz humilde do Sergipe tornou-se uma estrela, após presidir a AP 470 com a gana de um inquisidor. Em um encontro de uma seccional da OAB, sua esposa recusou o carro enviado para transporta-los, alegando não estar a altura de um Ministro do STF.
Peça 4 – o subdesenvolvimento institucional
São mais que episódios reveladores de carácteres individuais. Não é norma prudencial tratar as pessoas como se a maioria fosse dotada de firmeza de caráter. Egoísmos, ambições pessoais, desejo de prosperidade são motores muito mais influenciadores de decisões pessoais do que apelos de ordem moral. E salve Fontelles, Aragão, Wagner Gonçalves e outros que não abjuraram mesmo quando o galo cantou pela terceira vez.
Mas quando ocorre a generalização das pequenas e grandes deslealdades, é porque o ambiente externo não mais atua como agente coordenador de decisões. E, decididamente, há um caráter nacional impregnando a política, através da mídia, no qual valores civilizatórios, como a democracia, o voto, os direitos individuais, não são considerados. Somos decididamente um país atrasado.
Os erros do PT e a despolitização da disputa política ajudaram nessa dissolução das lealdades. Forneceu a muitos beneficiados o álibi para se afastar indignados dessa malta que manchou minha imagem. E toca a pular para o outro barco.
Mas só os erros não justificam. Dia desses conversava com um bravo cientista político que discorda do poder absoluto creditado à mídia. Esse poder decorre dos erros do governo, dizia ele, com toda razão. Mídia, Ministério Público, Judiciário ganham protagonismo quando a política falha. E exercem um papel claramente desestabilizador.
Analise-se o papel do TCU (Tribunal de Contas da União). Ganhou um protagonismo absurdo graças à reação de Dilma Rousseff no caso de Pasadena. O Ministro José Jorge forçava de todas as maneiras os técnicos do TCU a encontrar irregularidades na operação, em vão. De repente, cai no seu colo uma vendeta de Dilma contra o ex-presidente da Petrobras Sérgio Gabrieli, tratando como suspeitos intens convencionais de um acordo de acionistas. Não apenas criminalizou uma operação legítima, como conferiu ao TCU um poder absurdo que acabou se voltando contra ela.
Mesmo assim, há algo de profundamente errado no modelo, quando exige, para seu funcionamento, governantes com dimensão de estadista. Um modelo que não é à prova de governantes frágeis, tem algo de errado. Tão errado que periodicamente corporações, mídia, grupos de influência testam crises políticas agudas, ao menor sinal de fraqueza do Executivo.
Depois da Constituição de 1988 ter sido estuprada, não se conseguirá sair dessas armadilhas institucionais sem uma nova constituição em um ponto qualquer do futuro. E não haverá como fugir de temas como o do enquadramento do MPF e das corporações públicas e formas de controles da mídia.
Créditos: Luis Nassif, GGN