Antonio (Ahmed) Andrade dos Santos Junior, de 34 anos, um dos presos pela Polícia Federal, por suspeita de planejar uma ação terrorista no Brasil, às vésperas da Olimpíada, é um ex-cristão e ex-ateu que se radicalizou pela internet e chegou a ser banido da mussala (sala de oração, para muçulmanos) onde teve o primeiro contato com o Islã, em João Pessoa, na Paraíba, por suas declarações radicais e apologia ao Estado Islâmico.
Pai de um menino de nove meses, de um casamento arranjado com uma brasileira que adotou o Islã como ele, também tinha problemas com a família por seu radicalismo. Ele aparece ao lado de outro preso, o paulista Vitor Magalhães, em uma foto tirada no Egito, ao lado de uma bandeira negra do grupo terrorista. Antonio e Vitor viajaram juntos ao Cairo, entre 2013 e 2014, onde passaram seis meses estudando religião em uma universidade particular.
Ao voltar do Egito, Andrade passou a defender abertamente o EI, segundo pessoas próximas a ele. Mas já teria se radicalizado, pouco antes da viagem, por meio de contatos via internet, após se “reverter” (termo usado por muçulmanos para designar a conversão ao islã) em uma mussala de João Pessoa, da qual foi banido mais tarde, por suas posições extremistas.
A mussala funciona dentro de uma academia de boxe, na periferia de João Pessoa, a Associação Beneficente Esportiva Muçulmana Mesquita’a Brothers, do ex-campeão Muhammad Al Mesquita. Batizado cristão, Andrade treinou boxe no local, do qual era vizinho, durante oito anos, antes de se “reverter” ao Islã.
“Ele ficou aqui como aluno por oito anos e chegou a competir. Eu praticamente o criei. Era um menino muito bom. Eu falava a ele sobre religião, mas ele ria. Era completamente ateu. Um dia, ele me pediu para se reverter. Eu disse a ele que ele precisava estudar mais o Islã, antes disso. Nos tivemos muitas conversas. Uma noite, bem tarde, ele me ligou e disse que estava pronto. Então, ele fez a shahada (declaração de conversão ao Islã)”, conta Muhammad Al Mesquita. “Só que, depois disso, ele começou a mudar muito. Ele passou a seguir pessoas na internet, a ler textos que não eram bons. Eu dizia para ele: ‘Ahmed, cuidado.'”
Mas Ahmed já não ouvia. “Ele começou a ter pensamento próprio. Então, um dia, eu o proibi de voltar à academia e à mussala. Um dia ele me ligou e eu pedi a ele que não me procurasse mais, se ainda tivesse aquelas ideias. Eu descobri que ele não era do bem, não era grato pelo que fiz por ele.”
Muhammad diz que recebeu a visita de agentes da Polícia Federal três vezes em sua academia. “Sofro muito, porque procuro passar a eles a mensagem sagrada, o caminho de Deus e da paz. Mas esses covardes estão acabando com nossa fé. O verdadeiro Islã não é isso. Não tem nada a ver com terrorismo.”
Após ser banido da mussala, Andrade parecia revoltado. Ele foi procurar o Centro Islâmico de João Pessoa, fundado por João (de Deus) Cabral, ex-pastor evangélico que adotou o Islã em 2008. O jovem frequentou a mussala por cerca de três anos, mas Cabral também começou a ficar preocupado com a conduta de Andrade. O líder religioso chegou a dar conselhos a Andrade. Depois de um tempo, ele se afastou. “Nunca mais conversei com ele. Exatamente por conta dessas ideias”, disse Cabral, por telefone. Ele hoje vive em Dubai. “O Islã repudia quaisquer atos de violência.”
Andrade passou a visitar a mussala ocasionalmente, em festas religiosas. A última vez foi no feriado de Eid, quando os muçulmanos celebram o fim do mês sagrado do Ramadan, no dia 7 de julho. Acompanhado da mulher e do filho, ele permaneceu no local por pouco tempo e não conversou muito.
Andrade vive em um bairro da periferia de João Pessoa com os pais, aposentados e a mulher, uma jovem revertida pela Internet há três anos, com quem tem um filho de nove meses. Eles são casados há dois anos. Uma jovem brasileira que adotou o Islã e frequentava a mesma mussala diz que Andrade tinha discussões com a mãe por causa de suas ideias radicais e não permitia que ela cumprimentasse homens nem mesmo dando as mãos.
Andrade fazia bicos em João Pessoa e nunca se fixou em nenhum emprego. Chegou a mudar para São Paulo e trabalhar com refugiados em uma ONG da comunidade islâmica. Ele teve sua página no Facebook bloqueada várias vezes por incitação à violência e manteve o blog “Por que deixei o cristianismo e me converti ao Islã”.
Fonte: Estadão
Créditos: Adriana Carranca