Dois dias após nove governadores terem ido a Brasília pressionar o Palácio do Planalto por saídas para a crise, o governo federal publicou nesta quarta-feira (30) decreto que regulamenta a lei permitindo que os Estados e municípios endividados façam o refinanciamento sob novas regras, aprovadas no meio do ano pelo Congresso Nacional.
A reforma dos contratos pretende reduzir a dívida e, com isso, o pagamento que esses entes têm que fazer à União, dando um alívio ao caixa de cidades e Estados. O governo estima que 200 contratos poderão ser revistos.
Ao menos três Estados admitem que poderão aproveitar a mudança do indexador da dívida para contrair mais empréstimos. “Nós precisamos. É um espaço fiscal para tentarmos movimentar a economia, implementar programas sociais”, diz o secretário da Fazenda do Rio Grande do Sul, Giovani Feltes.
Hoje, o Estado ultrapassou o limite máximo de endividamento previsto em lei, que é de 200% da receita líquida: a dívida gaúcha soma 216%. São R$ 64 bilhões –e os débitos com a União representam quase 90% do montante.
Ao aderir ao programa do governo federal, segundo o superintendente do órgão responsável por gerir a dívida pública de Minas Gerais, Osmar Teixeira de Abreu, o Estado reduzirá imediatamente em R$ 5 bilhões o débito de R$ 77 bilhões com a União. O prazo de quitação desse valor cairá em cinco anos, de 2038 para 2033.
“A redução do estoque cria uma pequena margem na trajetória do endividamento, o que permite a ele, apurados esses números, a contrair novas operações de crédito”, diz. “A possibilidade está aberta”, diz nota da Secretaria da Fazenda de Minas.
O governador do Rio, Luiz Fernando Pezão (PMDB), reforçou o coro dos que veem na mudança uma brecha para a possibilidade de novos empréstimos.
“Os novos indexadores vão melhorar a receita corrente líquida dos estados, e também dar mais capacidade de endividamento para os estados. As regras eram absurdas. As dívidas foram renegociadas em 1997, tempo de inflação muito alta, e, mesmo depois da queda da inflação, continuamos pagando com essas correções absurdas”, afirmou, em nota.
No caso de São Paulo, a redução do índice que corrige a dívida dos Estados não trará alívio de caixa imediato, mas permitirá que o saldo devedor seja quitado quatro anos antes do previsto.
Isso acontece porque os termos do acordo pactuado entre o governo Mário Covas e Ministério da Fazenda, em 1997, estabelecem que o Estado comprometa 13% da receita líquida real para o pagamento da dívida até 2026.
“Só vai ter efeito sobre o estoque da dívida, que será quitada em 2033, não em 2037”, disse o secretário estadual de Fazenda, Renato Villela.
INDEXADOR
O novo indexador das dívidas passa a ser o IPCA, o índice oficial de inflação, mais juros de 4% ao ano ou a taxa básica de juros do Banco Central (Selic), o que for menor. Atualmente, os débitos são corrigidos pelo IGP-DI mais juros de 6% a 9%. Os Estados pagam um percentual fixo de 11% a 15% da receita por mês.
Os governantes reclamavam que os indexadores antigos estavam fazendo a dívida aumentar.
A estimativa é que o total das dívidas hoje esteja na casa dos R$ 400 bilhões. A mudança do indexador trará custos ao governo federal, não estimados pelo Ministério da Fazenda.
A demora em regulamentar a lei foi atribuída ao ex-ministro da pasta, Joaquim Levy. A estimativa da equipe dele era que a redução do pagamento das dívidas estaduais faria o governo federal perder R$ 1 bilhão em 2015.
Apesar da lei ter sido aprovada no meio de 2015, os Estados e municípios que quiserem aderir terão um tempo curto para realizar os procedimentos necessários.
Em nota, o Ministério da Fazenda informou que os devedores deverão obter, antes da celebração dos novos contratos “autorização legislativa, conferência e concordância prévia com os cálculos, observação das exigências contidas na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) para essas operações e desistência de ações judiciais”.
Segundo a nota, quem não reunir todas essas condições até dia 31 de janeiro não terá o contrato refinanciado.
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MUDANÇA NAS DÍVIDAS DOS ESTADOS
Como era
Dívidas corrigidas pelo IGP-DI + entre 6% e 9% ao ano
Como ficou
Taxa Selic ou IPCA (o que for menor) + 4% ao ano
A situação
A Lei de Responsabilidade Fiscal, de 2000, impôs limites ao endividamento dos governos estaduais e prefeituras
O problema
Nos últimos anos, variações de câmbio e outros fatores fizeram as dívidas crescerem mais rápido do que a capacidade de quitá-las
A solução
Dilma sancionou lei que muda o índice de correção dessas dívidas, mas adiou para 2016 a sua aplicação por temer perda de receita para a União
Crise financeira
Outro fator que pesa nas finanças dos Estados é o gasto com pessoal, cujos limites também foram fixados pela Lei de Responsabilidade Fiscal