Rubens Nóbrega
Publicada ontem no Diário Oficial do Estado a lei que autoriza a mui polêmica e famosa permuta de terrenos entre o Estado e uma imobiliária da Capital. Está legalizado, portanto, um negócio que se a Justiça não impedir consumará na prática, est e oeste na Viúva, verdadeira doação de valioso bem público a um particular.
A Lei, sob o número 9.437, datada de 6 de setembro do ano da graça de 2011, traz a assinatura de seu aparente autor, o governador Ricardo Santiago, digo, Ricardo Coutinho. Pelo que li, saiu do jeito que o principal interessado quer e o diabo gosta: sem nada que amarre a construção do tão propalado shopping no terreno público a ser doado.
Insisto que é doação porque se ela não for barrada judicialmente o imóvel pertencente ao Estado, conhecido como terreno da Acadepol, em Mangabeira, vai sair de graça para o donatário. Isso mesmo: de graça! Eis uma verdade que até uma nulidade em aritmética, feito o colunista, é capaz de provar. Vamos lá, então.
De acordo com a Lei nº 9.437/2011, os valores dos terrenos a serem permutados são aqueles definidos pela Comissão Estadual de Avaliação da Superintendência de Obras do Plano de Desenvolvimento do Estado (Suplan). Sendo assim, o terreno público (Mangabeira) vale R$ 13,9 milhões e o particular (do Geisel), R$ 10,9 milhões.
A lei também diz que “havendo diferença pecuniária em favor do Poder Executivo, esta deverá ser paga acrescida de valor igual a, no mínimo, 100%”. Agora, façamos as contas: a diferença de R$ 13,9 milhões para R$ 10,9 milhões é igual a R$ 3 milhões, que “deverá ser paga acrescida de valor igual a, no mínimo, 100%”.
Com isso, a empresa que vai ficar com o terreno de Mangabeira terá que pagar ao Estado um total de R$ 6 milhões, na forma de “bens, obras, serviços ou dinheiro que deverão ser revertidos em ações de segurança”, conforme reza o próprio texto da lei. Bem, pelos números a que chegamos até aqui, teríamos um negócio bem vantajoso para o Estado. Teríamos, caríssimas e caríssimos, não fosse por um detalhe.
O detalhe é o seguinte: o terreno do Geisel que a Suplan avaliou por R$ 10,9 milhões foi vendido há menos de três anos pelo Estado ao atual dono pela bagatela R$ 2,6 milhões. Com isso, o proprietário daquele imóvel está ganhando nada menos que R$ 8,3 milhões na revenda e o Estado levando um prejuízo de R$ 8,3 milhões na recompra.
Agora, vejamos: se a ‘volta’ da permuta é de R$ 6 milhões e o dono do terreno do Geisel está ganhando R$ 8,3 milhões no negócio, então o seu lucro é de nada menos que R$ 2,3 milhões, que equivaleriam à ‘volta’ ou ao troco que o Estado deve ao particular para poder ficar com o terreno menor e menos valorizado.
Resumindo: o cara vai receber o terreno da Acadepol de graça e ainda embolsar R$ 2,3 milhões porque o terreno a ser dado em troca ele comprou por R$ 2,6 em 2008 e está devolvendo ao Estado em 2011 por R$ 10,9 milhões. Pense um negócio da China! Melhor ainda: vai poder fazer o que quiser com super valorizados 8,5 hectares que receberá gratuitamente do Governo do Estado.
Sim, porque apesar dos insultos à inteligência popular espalhados em outdoors pela cidade, todo mundo sabe que foi a maioria governista na Assembléia que votou contra o Mangabeira Shopping que a oposição quis amarrar, mediante emenda, na lei que agora podemos batizar de Lei Roberto Santiago, em homenagem ao seu maior inspirador e beneficiário.
Não dá pra esquecer nem esconder que por decisão de governo foram patroladas e aterradas em plenário as tentativas da oposição de submeter o terreno de Mangabeira a uma concorrência pública, como seria verdadeiramente republicano e do mais elevado interesse público, além de obrigar a construção de um shopping no local.
Essas propostas, reunidas sob a emenda Gervásio Filho, foram impiedosa e surpreendentemente derrotadas pelo governo. Surpreendente porque foi com essa história de shopping que o governador Ricardo Santiago, digo, Ricardo Coutinho, foi com tudo pra cima de quem questionava o troca-troca, jogando o povo de Mangabeira contra os questionadores.
Nas discussões sobre a matéria na Assembléia foi que deram fé de que no projeto de Sua Majestade não tinha menção alguma a shopping. Aí a oposição tentou corrigir e foi surpreendida com a decisão dos governistas de votarem fechado no texto original encaminhado pelo Palácio da Redenção, ou seja, sem licitação e sem shopping.
Apesar disso, apesar de tudo isso se passar sob acompanhamento direto da imprensa livre e vigilância da população consciente, quem realmente tentou favorecer o povo de Mangabeira e o progresso da cidade foi alvo da mais cínica e deslavada mentira que um grupo político já utilizou na Paraíba para queimar o filme do adversário.
E o que sobrou até aqui desse deprimente episódio para a moralidade pública, além da certeza de que o homem mais rico da Paraíba está em vias de receber de graça do governador do Estado um terreno público que na verdade vale no mínimo R$ 21 milhões, segundo avaliação da Caixa Econômica Federal?
Sobrou a certeza de que graças à lei sancionada pelo mesmo governador o provável futuro dono do terreno da Acadepol poderá fazer o que bem entender do imóvel, inclusive dividi-lo em lotes, colocar esses lotes à venda e apurar no mínimo R$ 70 milhões. Limpos, líquidos e certos.
Poderá também construir uma casa de shows na área, que se presta ainda para abrigar condomínios de luxo e, quem sabe, até mesmo um shopping. Mas nada disso está assegurado porque a Lei Roberto Santiago parece ter sido pensada exatamente para deixar o seu patrono inteiramente à vontade quanto ao destino do imóvel que lhe pode aumentar a fortuna em pelo menos mais R$ 23,3 milhões.
R$ 23,3 milhões que resultam da soma de R$ 21 milhões (valor real mínimo do terreno da Acadepol) mais R$ 2,3 milhões (lucro da operação de revenda do terreno do Geisel ao Estado).