EDITORIAL: Massacres impõem a Obama cogitar controle de armas

Num país cujos índices de criminalidade estão em queda, a proliferação bélica não torna a sociedade mais segura

President Barack Obama delivers remarks at the White House Summit to Counter Violent Extremism at the U.S. Department of State in Washington, D.C., on February 19, 2015. [State Department photo/ Public Domain]

A um ano e meio do fim de seu segundo e último mandato, o presidente Barack Obama implementou recentemente medidas ousadas, que certamente contribuirão para um legado histórico do primeiro presidente negro dos EUA. Após se concentrar na recuperação da economia, o que consumiu boa parte de suas gestões na Casa Branca, Obama investe com ímpeto em temas delicados da política internacional, como a retomada de relações com Cuba e o acordo nuclear com o Irã, passando pelo meio ambiente e a área de comércio externo. E, internamente, avança em áreas de bem-estar social, principalmente seu Obamacare.

O presidente americano poderia aproveitar o ímpeto dessas medidas e abordar um tema espinhoso, porém incontornável: o controle de armas de fogo. Ele tem feito declarações neste sentido. Precisaria ir além. Hoje, o acesso a qualquer tipo de armamento é um direito garantido pela Constituição americana, cujas raízes remontam à luta pela independência, conforme argumentam os lobistas a favor da indústria bélica. Além disso, a comercialização desse tipo de mercadoria encontra eco na cultura defensiva de uma sociedade que, não raro, vê o vizinho como inimigo em potencial: do disfarçado comunista da Guerra Fria ao terrorista da atualidade. O principal argumento para essa situação é a autodefesa.

Num país cujos índices de criminalidade estão em queda, a proliferação bélica não torna a sociedade mais segura, pelo contrário. Não se justifica a livre comercialização de armas de variados calibres e poder de fogo a qualquer um. Os casos de tiroteios provocados por pessoas emocionalmente desequilibradas se sucedem, atingindo vítimas inocentes, inclusive crianças e idosos, civis e militares, e minorias étnicas. Obama tem razões de sobra para enfrentar o problema. Basta lembrar o recente ataque racista a uma igreja metodista em Charleston, na Carolina do Sul, que resultou em seis mulheres e três homens negros assassinados, inclusive o pastor, Clementa Pinckney. Eles foram mortos pelo jovem branco de 21 anos Dylann Roof, que usou uma pistola Glock 41, calibre 45, presente do pai. O massacre resultou numa controvérsia sobre a bandeira confederada e o racismo, mas pouco se falou sobre controlar o comércio de armas.

Há casos emblemáticos, como o massacre no Instituto Columbine, em 1999, perpetrado por dois estudantes de 18 e 17 anos contra colegas e professores. E outros recentes, como o tiroteio ocorrido na semana passada num cinema em Lafayette, em Louisiana, em que três pessoas morreram e sete ficaram feridas. Mas a verdade é que os massacres se tornaram tão tristemente comuns no país que já são vistos como eventos banais. Só este ano, segundo o jornal “Washington Post”, ocorreram 24 massacres em janeiro; 18 em fevereiro; 30 em março; 18 em abril; 39 em maio; 41 em junho e, até agora em julho, 34. Tais números são eloquentes e mostram a urgência de se corrigir o problema do acesso livre a armas.

O Globo