Impressiona como determinadas pessoas mudam depois que assumem algum poder.
Poder público, bem entendido, do qual deriva o poder político e termina por favorecer o poder econômico.
A mudança é extraordinária. Afeta geralmente o comportamento, especialmente o caráter, estendendo-se na maioria dos casos ao patrimônio.
“E a mudança fica mais cruel à medida que a pessoa deseja se manter no poder”, ensina O Nobel Felipense, blog de um filósofo que vive em Felipe Guerra (RN).
O cara – ou a cara – é uma figura. Garante viver da agricultura, diz ser plantador de arroz, mas no seu perfil define-se como ‘Liberdade de Expressão’.
Com ele deve concordar a jornalista Marcela Sitônio, presidente da API, que tem como único poder o direito e o dever de defender toda e qualquer forma de expressão.
Marcela, líder de uma categoria que longe do poder pode muito pouco ou quase nada, luta ultimamente para que não lhe cassem a livre manifestação do pensamento.
E pensando no caso de Marcela fico a me perguntar:
– Que Paraíba é essa, meu Deus, onde a presidente da Associação Paraibana de Imprensa é atacada por defender liberdade de imprensa?
Ataques que partem e continuam de pessoas detentoras de poder público, de poder político a serviço do poder econômico ou com ele fazendo sociedade.
É o que está acontecendo, porque aqui o poder está sendo mal exercido ou exercido para o mal e transformando horrivelmente as pessoas que o detêm.
Conheço algumas dessas de perto. Com elas convivi por tempo razoável. Ao lado delas lutei boas lutas. Hoje, poderosas, estão irreconhecíveis.
E essas pessoas, validando a tese d’O Nobel Felipense, vêm piorando acentuadamente “à medida que desejam se manter no poder”.
Fraquezas humanas
Vamos combinar, contudo, que é da natureza humana a fragilidade de caráter que impulsiona tão deplorável transformação.
Convenhamos, ainda, que o nosso processo civilizatório, digamos assim, dá uma boa mão a esse tipo de mudança.
Não justifica, claro, mas sociologicamente deve servir de atenuante. Afinal, seríamos todos bolhas do mesmo caldo cultural, da mesma ocidentalidade capitalista.
Graças ao nosso modo de vida e aos valores que a maioria cultiva, quem tem, acumula e quer mais. Quem não tem, mas consegue, quer muito mais. Se tem poder, usa-o com muito mais voracidade para acumular.
O problema é que o poder é temporal e, segundo a legislação brasileira, tem dia certo para acabar.
Daí por que, presumo, enquanto não acaba muita gente age e decide como se o próprio mundo fosse acabar amanhã. E tome!
Tenho pra mim, de outro lado, que os poderosos não aparentam, mas no fundo devem sentir um desespero enorme a cada dia que passa, a cada dia que os aproxima do final do mandato que lhes deu o poder.
Talvez seja por conta disso, em razão disso, que procuram se locupletar com tanta velocidade e tamanha sofreguidão.
Impossível retroceder
Mas também tem o poderoso que já cansou, desistiu, de tentar esconder. Atingiu aquele estágio em que sequer lhe incomoda quem lhe aponta a rapinagem.
Eis outro efeito poderoso do poder: revestir-se na couraça do cinismo e sob ela proteger-se dos inconvenientes que lhe cobram probidade e retidão.
Mas o mau poder, além de cínico, também é criativo. Cria, sobretudo, meios para no pós-poder ter meios de sustento e ganhos inimagináveis. Faz isso de vários modos e fórmulas.
Uns usam o poder, por exemplo, em benefício dos negócios e interesses daqueles que podem, mais tarde, retribuir-lhes de alguma maneira.
Outros, findo o mandato, através de prepostos ou laranjas confiáveis, montam negócios lucrativos ou passam a viver de rendas, fruindo os dividendos do acúmulo dos ‘bons tempos’ de poderio.
Sob tal condição, impossível para quem se enquadra no perfil ou veste a carapuça admitir voltar à condição de antes do poder, ou seja, retornar ao comum dos mortais.
Voltar pr’aquele apartamentozinho de subúrbio? Voltar a pegar ônibus enquanto o carro velho está na oficina? Voltar a pagar gasolina e telefone? Não ter mais a secretária para dizer que “está em reunião” àquele chato que insiste em lhe falar?
E como abrir mão daquelas viagens fantásticas, dos hotéis ou motéis cinco estrelas pra cima, dos almoços e jantares de gala, tudo ‘por conta do cão’?
Nem pensar! Nem a pau, Bigobal! Eis a razão de pessoas do gênero fazerem tudo e mais alguma coisa para manter o padrão. Essas não se importam nem mesmo de vender a mãe. E não entregam, que é pra vender de novo.
Felipe não era assim
Tenho certeza como Felipe Guerra, mesmo poderoso, não foi do jeito que alguns poderosos de hoje são. Refiro-me ao Felipe que deu nome ao município potiguar da Chapada do Apodi onde pontifica o plantador de arroz e blogueiro O Nobel Felipense.
Pois bem, segundo peguei na Wikipédia, a Enciclopédia Livre da Internet, o nome daquela cidade vem de Felipe Neri de Brito Guerra, “Deputado às Constituintes de 1891, 1892 e 1895, Juiz de Direito, Desembargador e Secretário de Educação”.
Doutor Felipe teve muito poder em sua terra, no seu tempo. Tanto que criaram um novo município no Rio Grande do Norte em 1963 e batizaram-no como Felipe Guerra, lugar onde vivem pouco mais de 5 mil pessoas, segundo o último censo do IBGE.
Aposto como Felipe Guerra não levou para o túmulo nem deixou mais do que amealhou honestamente em vida, apesar do poder que teve.
Mas ele viveu uma era em que não se admitia moral relativa nem hombridade parcial, referências humanas que parecem em extinção entre poderosos do Estado que fica colado e ao sul daquele onde Felipe Guerra nasceu.