Paraíba tem 10 mil leis que nunca foram divulgadas

Deputados querem publicidade para a legislação estadual que beneficia a população

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Ao longo de 179 anos de existência, a Assembleia Legislativa da Paraíba criou mais de 10 mil leis, um conjunto gigantesco de normas que não consegue servir à população, porque ela própria desconhece. A falta de divulgação eficiente dessas leis é o maior empecilho para que elas sejam efetivamente aplicadas, já que à população desinformada não cobra.

“A estatística da produção é grande, mas do ponto de vista da qualidade da aplicabilidade de certas leis, do grau de importância que elas têm, são bastante questionáveis”, afirma o professor de sociologia jurídica Marcus Alves. Ele acha que a falta de visibilidade dessas leis acaba acarretando prejuízos à imagem dos políticos: “Vemos que os parlamentares perdem força e importância na sociedade em função disso”, arremata.

Os deputados reconhecem que há falhas na divulgação das leis e que isso os atinge diretamente. Raniery Paulino (PMDB) afirmou que como a produção legislativa não chega às pessoas que seriam as principais beneficiadas é natural que o trabalho do deputado seja questionado. “Tem várias leis interessantes que não são divulgadas e, por conta disso, as pessoas não sabem que podem exigir seu cumprimento”, afirmou.

De acordo com o deputado Lindolfo Pires (Democratas), o maior prejudicado com a falta de divulgação das leis estaduais é a população, mas que o deputado também é atingido. “O legislador acha que produzindo as leis já está prestando contas à sociedade, mas por falta de conhecimento, a sociedade acha que o legislador não está fazendo nada”, disse.

O deputado Janduhy Carneiro (PTN) disse que essa realidade precisa ser modificada o mais rápido possível. “Não podemos permitir que a população fique a quem das leis que são elaboradas em beneficio dela mesma. Temos leis importantíssimas e as pessoas precisam ter acesso a elas”, destacou.

Já o deputado Ivaldo Moraes (PMDB) concorda com Janduhy Carneiro, mas pondera que a falha não é apenas da Assembleia e dos deputados. “É uma questão cultural, não podemos atribuir essa problema só às autoridades”, comentou.

De acordo com o presidente da Assembleia, Ricardo Marcelo (PEN), o órgão tem se esforçado para mudar essa realidade. Segundo ele, já foram realizadas várias ações com o objetivo de informar a população às leis existentes. “Fizemos uma coletânea de leis que disponibilizamos para todas as prefeituras, Câmaras Municipais, Ministério Público, Tribunal de Justiça e todos os órgãos que convivem diariamente com as leis e com as ações da Assembleia”, destacou.

Além disso, ressaltou que as leis aprovadas pela Casa Epitácio Pessoa também são divulgadas através da TV e do Portal da Assembleia, entre outros mecanismos. “O nosso papel também é o de divulgar as ações dos deputados e fazer com que as pessoas conheçam a nossa atividade, em termo da geração das leis”, afirmou.

Projetos não são discutidos

O deputado Raniery Paulino acredita que uma das formas de aproximar as pessoas do Poder Legislativo é fazendo com que os projetos de leis passassem pelas comissões temáticas para que sejam debatidos e divulgados para a população antes de se transformar em lei. “Isso garantiria a maior discussão e divulgação do projeto de lei, antes mesmo virar lei”, acredita.

Para o deputado Ivaldo Moraes, a sociedade deve fazer a sua parte se informar e cobrar os direitos a que tem direito. “O povo não ficar esperando que o governo se debruce sobre a aplicação das leis. Na hora que a sociedade cobrar, tenho certeza que o governo e as autoridades de um modo geral aplicarão as leis”, comentou.

Lindolfo Pires sugeriu parcerias para aumentar eficácias das leis. “Temos várias leis que protegem para evitar que os consumidores sejam lesados. Então, seria interessante que o Procon ficasse mais próximo da Assembleia para que essas leis pudessem ser postas em prática imediatamente, já que isso atinge diretamente o dia a dia das pessoas”, disse.

Aldemir quer obrigar publicidade

“Esse diálogo me fez pensar na possibilidade de elaborar um projeto de lei obrigando o Estado e os poderes Legislativo e Judiciário a dar amplitude na divulgação leis estaduais para que população tenha conhecimento do que esta sendo produzido na Assembleia”. A ideia partiu do deputado reeleito José Aldemir (PEN), ao ser questionado sobre a falta de divulgação das leis produzidas pela Assembleia.

José Aldemir é o deputado estadual mais antigo e já chegou a assumir o mandato na Câmara Federal. Ele já exerceu cinco mandatos e meio e esta indo para o sexto. Com 22 anos de Casa, acredita que esse problema não afeta apenas a Paraíba, mas o País inteiro. “Apenas um percentual bem reduzido da população brasileira conhece as leis que estão em vigor”.

Ele destacou que é autor da lei 10.058/13 que dispõe sobre a obrigatoriedade de fornecimento, por parte das empresas operadoras de serviço de telefonia móvel, de informações sobre a área de cobertura do sinal. Além da lei que estabelece que o Sistema de Saúde do Estado disponibilize de forma gratuita a vacina contra o papilovírus HPV para todas as meninas a partir dos nove anos de idade e mulheres que não iniciaram atividade sexual.

Segundo ele, o câncer de útero é cada vez mais presente na vida da mulher e o HPV é transmitido a ela na relação sexual cada vez mais cedo. “O que aumenta a exposição às doenças sexualmente transmissíveis, daí a importância dessa lei”.

Professora lamenta falta de exame

Diagnosticada com Esteatose hepática grau três (gordura no fígado), a professora Keyla Teixeira de 41 anos perdeu as contas de quantas vezes foi ao Centro Especializado de Dispensação de Medicamentos Excepcional (Cedmex) para tentar receber o medicamento Lipitor de 10 mg para iniciar o tratamento.

A professora que também sofre de obesidade atualmente pesa 134 quilos e que agrava ainda mais a situação. “Todas as vezes que eu vou refazer o cadastro eles dizem que está faltando exame. Quando refaço dizem que o exame está desatualizado e até hoje não conseguiu receber a medicação”, reclama Keyla Teixeira.

Questionada se tinha conhecimento da existência de uma lei que assegura o fornecimento de declaração por escrito, ao usuário do Sistema Único de Saúde, quando não tiver medicamento à disposição nas unidades de saúde do Estado disse que não.

“A gora que eu sei que existe essa lei vou chegar e dizer: minha filha você tem como me dar uma declaração dizendo que o remédio está faltando, porque não posso ficar sem”, comentou Keyla Teixeira. Segundo ela, essa será uma arma forte para não deixar de fazer o tratamento. “Antes era a minha palavra contra a contra a do órgão que fornece o medicamento e agora vou ter como provar o que digo”, comemorou a professora.

A lei 1.618 de autoria da deputada Daniella Ribeiro (PP) prevê que as unidades de saúde ou farmácia da rede pública, devem fornecer gratuitamente declaração por escrito e devidamente assinada por servidor público a falta de medicamentos prescritos por médico credenciado no Sistema Único de Saúde (Sus).

A deputada Daniella Ribeiro explicou que o objetivo da lei é munir o cidadão de uma prova de que aquele medicamento que ele precisa está em falta nos órgãos públicos. “Antes, o cidadão não tinha como provar que estava em falta, mesmo denunciando na imprensa, os responsáveis da Saúde negavam. Era a palavra do órgão público contra do cidadão”, afirmou.

Correio da Paraíba