O “dever de casa”

  • Por Nonato Guedes

  Finalmente o senador paraibano Vital do Rêgo e as lideranças petistas no Congresso resolveram exercitar o seu “dever de casa”, ou seja, determinar providências para apuração rigorosa das denúncias de que houve fraude na CPI da Petrobras, presidida por Vital e destinada a apurar irregularidades na estatal. Conforme foi denunciado pela revista “Veja”, com base em gravações a que teve acesso, os investigados receberam perguntas dos senadores com antecedência e foram treinados para responder a tais indagações. Nas últimas horas, a “Folha de São Paulo” narrou uma articulação comandada por Ricardo Berzoini, cumprindo ordens superiores, com vistas a blindar a presidente Dilma na CPI diante do rolo compressor que a oposição já vinha acenando.


Num primeiro momento, no fragor da perplexidade diante do vazamento das denúncias, a reação de parlamentares governistas e das autoridades em Brasília foi a de tentar desqualificar os indícios de irregularidades apontados. Culpou-se, como de hábito, a revista “Veja”, por ser supostamente antipetista de carteirinha e, portanto, interessada em desestabilizar a presidente Dilma na corrida pela reeleição e, ao mesmo tempo, desgastar o partido que foi fundado por Luiz Inácio Lula da Silva no ABC paulista. É o tipo do argumento de quem não tem respostas mais consistentes a fornecer. Uma publicação como “Veja” sabe dos riscos a que se expõe quando veicula matéria de alto teor explosivo. A insinuação de fraude numa CPI é caso de maior gravidade, como admite o próprio Renan Calheiros, presidente do Senado. E o senador Vital decidiu requerer o concurso da PF para apurar “conexão” de servidores da Casa.
Tais medidas se impõem não apenas por uma questão de resguardar a credibilidade da Comissão Parlamentar de Inquérito, mas para elidirem as suspeitas de que a CPI tornou-se um jogo de cartas marcadas, uma espécie de Comissão chapa branca, instituída para esvaziar denúncias feitas pela oposição, não para detectar fatos invocados e pedir a responsabilização dos suspeitos de irregularidades. Alguns dos escândalos remontam ao período de gestão de Luiz Inácio Lula da Silva, mas, naturalmente, respingam na presidente Dilma, que ocupou, então, postos estratégicos.
A tática de avestruz, enfiando a cabeça na areia para ignorar a tempestade, poderia ter desdobramentos negativos para o próprio Palácio do Planalto. Não adianta tentar subestimar a oposição, que tem seu próprio poder de fôlego e que já vinha se preparando, nos bastidores, para uma CPI paralela, desta feita para investigar o compadrismo verificado na CPI original destinada a investigar a Petrobras e seus tentáculos. A CPI paralela poderia emparedar o Planalto, alcançando a presidente Dilma na jugular, no
momento em que ela ainda mantém liderança nas pesquisas de opinião pública mas convive com o fantasma de um segundo turno, que pode vir representado pela figura do senador mineiro Aécio Neves, do PSDB, o postulante que mais se aproxima de Dilma nas intenções de voto. Por outro lado, a cunha do desgaste ficaria cada vez mais colada à imagem do PT depois do escândalo do mensalão, que, como se sabe, teve repercussão profundamente negativa para o governo, aqui e lá fora.
No Congresso Nacional, há um histórico de CPIs que nunca saíram concretamente do papel, ou seja, não apresentaram resultados objetivos que correspondessem aos fatos sugeridos para justificar a instalação das Comissões. O senador Vital mesmo presidiu uma dessas Comissões, que deu em nada, em cujas sessões os depoentes convocados requeriam o direito ao voto de silêncio, nada acrescentando às investigações que se desenrolaram em paralelo por órgãos de investigação como a Polícia Federal e a Controladoria Geral da União. A ideia de que CPIs acabam em pizza no Brasil desagrada profundamente a opinião pública, que se sente lograda pela inexistência de vínculo entre intenções e fatos. A oposição, por sua vez, como é de praxe, está à espreita para aproveitar qualquer deslize que surja por parte da tropa de choque governista. O interesse, no caso, é mesmo o de desqualificar o governo federal e, ao mesmo tempo, tornar vulnerável a posição de Dilma na disputa por sua reeleição.
TÓPICOS
… Um balanço feito pelos jornais locais mostra que pelo menos 101 candidatos tiveram seus registros barrados na Justiça. O Tribunal Regional Eleitoral já julgou cerca de 455 pedidos de um total de 568 e deverá concluir a análise até amanhã. A celeridade demonstrada no processo de julgamento repercute positivamente junto à sociedade, em si mesmo saturada de omissões e descumprimento do papel punitivo contra agentes públicos pilhados em irregularidades flagrantes. A presidência do TRE havia externado a sua convicção de que precisava agir em simetria com a voz rouca das ruas. E esse compromisso tem sido seguido ao pé da letra, justiça seja feita ao TRE.
…. Confirmando a expectativa, a coligação encabeçada pelo governador Ricardo Coutinho deve ingressar amanhã junto ao Tribunal Superior Eleitoral com recurso questionando o registro da candidatura do senador Cássio Cunha Lima (PSDB) ao governo, que foi deferido pelo Tribunal Regional Eleitoral. O advogado Fábio Brito, que integra a banca da coligação liderada pelo governador, afirma: “Estamos estudando o acórdão do TRE para fazermos os argumentos”. O registro de Cássio foi aprovado no Pleno paraibano por cinco votos a um, o que foi considerado uma espécie de goleada. O senador mantém a expectativa de que o seu direito vai ser referendado em Brasília.
…. O grupo petista ligado ao deputado estadual Frei Anastácio Ribeiro,
do PT paraibano, decidiu ignorar as recomendações e decisões jurídicas por coligação com o PSB do governador Ricardo Coutinho. Ontem, foi divulgada nota em que o referido agrupamento anuncia que continuará apoiando o PMDB nessas eleições. Trata-se, conforme Anastácio, de uma questão de coerência. “A aliança entre petistas e peemedebistas existe desde 2002. Sempre estivemos juntos na luta”, argumentou ele.
…. O governador Ricardo Coutinho continua alfinetando seu principal concorrente, o senador tucano Cássio Cunha Lima. “Não adianta meu adversário proferir a mentira cem vezes. Ela nunca vai se tornar verdade porque o povo não é bobo. Vou desmanchar cada mentira com os dados verdadeiros que eles tentam esconder. Eles renegam a sua gestão e tentam se apresentar como novo, mas adotam as práticas antigas, do velho coronelismo político”. O governador e candidato à reeleição insiste em que está inteiramente aberto para qualquer comparativo sobre realizações do atual mandato que empalma e as obras anunciadas por Cunha Lima nas duas gestões. No seu entendimento, há muitos “factoides” gerados pelo adversário com o intuito de sensibilizar ou de impressionar setores da opinião pública. “Mas isso não vai adiantar”.
…. A presidente Dilma tem coragem de “mamar em onça”. Está acenando com um reajuste no preço da gasolina, conforme foi repassado à imprensa pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega. Candidata à reeleição, Dilma tem consciência do desgaste que o reajuste pode provocar. O ministro Mantega lembrou apenas que o governo pretende continuar com os reajustes normais e negou que haverá um tarifaço após as eleições de outubro. “Todos os anos tem correção do preço da gasolina. Uns mais, outros menos, mas todos os anos tem correção. Esta é a regra”, sustentou o titular da Pasta da Fazenda. A diretoria da Petrobras tem pressionado o governo a reajustar preços de combustíveis para reduzir a defasagem dos valores cobrados no Brasil em relação aos do exterior. Isto viria afetando as finanças da companhia, é o que se alega.