INTERVENÇÃO E GOLPISMO NA FEDERAÇÃO DE FUTEBOL

Gilvan Freire

rosilene

Foi o Portal WSCOM de Walter Santos que detonou, sexta-feira, a bomba camuflada que estava por traz de toda a trama que culminou em intervenção abusiva na Federação Paraibana de Futebol. Disse o portal:

Nelson Lira trabalha para emplacar a candidatura de Coriolano Coutinho na FPF – Indicação do presidente do Botafogo seria um pedido pessoal do governador Ricardo Coutinho (PSB). O presidente do Botafogo da Paraíba, Nelson Lira, vem trabalhando pesado para consolidar a candidatura do ex-superintendente da Autarquia Especial Municipal de Limpeza Urbana (Emlur), Coriolano Coutinho, para presidente da Federação Paraibana de Futebol (FPF). O WSCOM Online teve acesso à informação, com exclusividade, junto a uma fonte ligada a atual Junta Administrativa responsável por comandar a FPF. O apoio do Botafogo a candidatura de Coriolano Coutinho seria um pedido especial do seu irmão, o governador Ricardo Coutinho (PSB). De acordo com informações da Fonte, Nelson Lira e Coriolano Coutinho já teriam, inclusive, agendado algumas reuniões privadas com dirigentes de vários clubes paraibanos. A informação também foi confirmada por outra pessoa ligada à ex-presidente Rosilene Gomes – afastada por força de liminar concedida pela juíza da 8ª Vara Cível da comarca da Capital, Renata da Câmara Pires Belmont -, que pediu para ficar no anonimato. A ex-presidente Rosilene Gomes foi afastada da FPF no dia 3 de abril, após a juíza Renata da Câmara Belmont vê indícios de irregularidade na sua última eleição. A magistrada decidiu pelo afastamento da presidente e a indicação de uma Junta Administrativa. As novas eleições para o comando da entidade deverão ocorrer em 90 dias”. Ângelo Medeiros com Marcos Wéric.

A intervenção em si, decretada com exorbitância por uma ilustrada juíza da 8ª Vara Cível da Capital há pouco mais de 30 dias, estarreceu os clubes e entidades filiadas à Federação, que até hoje ainda não entendem as razões do ato judicial de força que violentou a democracia interna do setor e cassou mandatos constituídos pela soberania do voto dos assembleianos, por aclamação, sem que tivesse à época aparecido pelo menos uma chapa concorrente, ou um protesto.

 

Até um ano e sete meses depois da última eleição, nenhum clube ou autoridade suscitou ao menos dúvida sobre a lisura do pleito, menos ainda o Auto Esporte, que nesse período sofreu vários conflitos de gestão, resultando em disputas judiciais sérias, especialmente por causa da invasão da política partidária na vida do bravo clube.

 

Diante das crises devastadoras que perturbavam as atividades administrativas do Auto Esporte, a Federação contribuiu, como é de seu dever, para restabelecer a normalidade, deixando, contudo, desafetos irresignados. Alguns, sem responsabilidade com a história e o passado da agremiação, estavam vendendo às escondidas o seu único patrimônio, um terreno avaliado em duas dezenas de milhões de reais, um valor colossal.

 

Quase dois anos depois da renovação dos mandatos da Federação, o Auto Esporte ajuizou uma ação de anulação de eleição. E, sem que a ação fosse julgada procedente, a douta juíza decretou a intervenção, faltando agora dois meses apenas para a realização das novas eleições, eleitos que foram os dirigentes em 23/07/2010. Pior de tudo: essa medida estapafúrdia e atentatória à segurança jurídica das eleições, nem era o objetivo da ação impetrada. Trata-se de um erro judicial grave, que não consulta nenhum interesse jurídico, não contempla qualquer crise de gestão e nem espelha o pensamento de mais de 95% das organizações associadas à Federação. Ou seja: a decisão é um ato de vontade da autoridade que não se julga no dever de interpretar os interesses legítimos de uma coletividade organizada com base nas leis vigentes do país, e não se sente obrigada a decidir nos precisos termos da postulação que lhe chegou às mãos. É, claramente, uma decisão abusiva que, ao contrário do que pressupõe seus fundamentos, atenta contra os princípios da cautelaridade, que hão de levar em consideração a imperiosa necessidade, urgência e a menor gravosidade de suas consequências.

 

A justiça Eleitoral, que detém o poder estatal de intervir nos mandatos eletivos, em casos de graves ofensas à Lei, práticas atentatórias à moralidade, desvios de conduta e corrupção, ainda assim, mesmo ante demonstrações cabais de desmandos, age de forma ponderada, optando de regra pela manutenção do eleito no cargo até julgamento final da lide, somente para preservar os valores da democracia, a soberania do voto popular, o devido processo legal e o direito do contraditório, sem os quais também não haverá justiça nem ordem jurídica.

 

No caso da Federação, não há nenhum desses desvios:  não há corrupção, não há imoralidades, não há atos de desonra, não tem desvios de função e de recursos, nem práticas atentatórios à lei, nem desequilíbrio na gestão e nem crise interna de qualquer ordem. Pelo contrário: há harmonia, há cumprimento rigoroso das obrigações perante os filiados e instituições superiores, há absoluta exação naquilo que as leis brasileiras exigem das entidades dirigentes ao futebol. É por isso que o ato solitário e surpreendente do poder judiciário terminou por não receber o aval dos clubes e entidades filiadas à FPF e nem o apoio da imprensa especializada.

 

O inusitado da intervenção judicial ainda peca pela instabilidade que produz no setor futebolístico estadual, porque a eminente magistrada escolhe, a seu critério somente, dois representantes de clubes para representar os demais clubes e entes filiados, inclusive o representante do clube autor da ação, impondo estes aos outros sem consultá-los. E ainda indica um terceiro, que tem a ver com o judiciário e nada tem a ver com o futebol, um corpo estranho ao setor que tem seu próprio sistema de representatividade. É uma atitude ditatorial que desorganiza e desequilibra a vida associativa e submete a maioria à minoria, de forma forçada e à margem da legalidade.

 

Mas, se a douta juíza não se apercebeu da gravidade de sua decisão extrapolada, o noticiário trazido pelo Wscom bem demonstra a que serve o ato de intervenção. Serve tão-somente para instrumentalizar a ação política-partidária, que deseja tomar a Federação de assalto para satisfazer aos interesses que vinham sendo até agora inconfessáveis na surdina, mesmo que a justiça não tenha decretado a intervenção com este fim e nem, certamente, tenha desconfiado de que isso pudesse acontecer. E agora?

 

Durante esta semana, a Confederação Brasileira de Futebol, as organizações federativas e os filiados da Federação vão se levantar em defesa da normalidade dos processos de eleição e gestão das entidades dirigentes do futebol brasileiro, porque a intervenção judicial decretada na Paraíba constitui um golpe nas instituições desportivas e no regime de liberdade de organização sob o qual está assentado o sistema dirigente federal. Respeitar a ordem democrática não é apenas preciso, é devido. E nem os magistrados escapam desse basilar dever.